segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Política social e repasses puxam gasto federal

Autor(es): Mônica Izaguirre
Valor Econômico - 17/08/2009



Alvo de preocupação e críticas de agentes econômicos e da oposição, o aumento de gastos correntes da União sob o comando do presidente Luiz Inácio Lula da Silva decorre, principalmente, de políticas de redistribuição de renda e da elevação de repasses a governos subnacionais. As despesas de consumo do próprio governo também tiveram elevação real a partir de 2003, mas em percentual bem inferior. Enquanto as transferências de renda às famílias registraram expansão real perto de 60%, quando considerada a inflação do IPCA, as despesas com o funcionamento da máquina administrativa, incluídas as de pessoal, subiram 22% até 2008.
Parcela também expressiva dos gastos correntes, as transferências a Estados e municípios cresceram cerca de 70% acima da inflação, evolução ainda mais acentuada que a do consumo do governo. Nominalmente, os repasses correntes a prefeituras e governos estaduais subiram 139,6%, as transferências de renda às famílias, 126,6%, ao passo que os recursos aplicados no funcionamento da máquina estatal federal aumentaram 72,9%.
Os números foram extraídos pelo Valor de informações disponibilizadas pelo Ministério do Planejamento e consideram apenas gastos primários, conceito que exclui juros sobre a dívida pública. Foram comparadas as despesas liquidadas em 2008 e 2002, último ano do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
A maior parte do que o ministério classifica como transferência de renda às famílias refere-se a aposentadorias, pensões e outros benefícios da Previdência Social. Também estão nesse grupo o pagamento a servidores federais aposentados; benefícios da Lei Orgânica de Assistência Social (Loas), que garante renda mínima a idosos e deficientes pobres; gastos com seguro desemprego e com o abono anual do PIS/Pasep (a trabalhadores de baixa renda) e também o programa Bolsa Família.
Exceto o Bolsa Família, os demais são gastos obrigatórios, o que significa que o governo não tem liberdade de cortá-los. O Executivo tampouco pode evitar que tenham algum crescimento vegetativo, já que se tratam de direitos legalmente garantidos a pessoas que preenchem as condições exigidas.
O caráter compulsório desses gastos não explica, porém, o seu expressivo crescimento. Na origem, o aumento das transferências de recursos às famílias decorre de decisões do presidente da República, que propôs e obteve do Poder Legislativo consecutivos aumentos reais para o salário mínimo, ao qual se vinculam mais de dois terços dos benefícios previdenciários, o seguro-desemprego e o abono PIS/Pasep.
Parte maior dos gastos correntes, as transferência de renda às famílias, portanto, subiram expressivamente nos últimos seis anos em função de uma política deliberada de redistribuição de renda. O fato de essas despesas serem permanentes e engessarem mais o Orçamento são consequências dessa opção política, que deve ser uma das marcas da campanha eleitoral de 2010.
O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, tem assinalado em inúmeros eventos públicos que, em boa medida, foi graças a essa política, que gerou um mercado interno mais vigoroso, que o Brasil sofreu menos do que outros países com a crise financeira mundial de 2008. Para o ministro, o aumento dos gastos correntes do governo, nesse campo, foi fundamental para proteger a renda, o consumo, a produção e o emprego. Foi essa escolha, ressalta o ministro, que fez acelerar a taxa de crescimento econômico do país até 2008.
Entre os gastos com o funcionamento da máquina estatal, o que mais cresceu foi a folha de pessoal, que também não se sujeita a cortes. Considerando Executivo, Legislativo e Judiciário, a variação sobre 2002 alcançou, em 2008, 82,5% em valores nominais e 28,6% em termos reais (considerado o IPCA). A recomposição dos salários do funcionalismo foi uma ação deliberada do governo. Mais suscetível do que o anterior à pressão das corporações sindicais, o governo Lula concedeu aumentos reais a praticamente todas as categorias profissionais do serviço público federal. Criticada por muitos, essa política de pessoal partiu do diagnóstico de que a máquina do Estado não só não estava inchada como precisava oferecer melhor remuneração. Só assim se tornaria atrativa para uma mão de obra qualificada, necessária à elaboração e gestão de programas e projetos de investimentos públicos demandados pelo crescimento da economia.
Fora as despesas de pessoal, o restante dos gastos com custeio do Poder Executivo (excetuado Ministério Público) aumentou, até 2008, cerca de 9% acima da inflação na comparação com 2002. Nominalmente, a variação foi de 54,7%, também bem inferior à verificada nas transferências de renda a famílias e a governos subnacionais. Em boa medida por causa da expansão da estrutura do Judiciário, somados, os gastos de custeio dos demais poderes e do Ministério Público, excluindo salários, registraram aumento bem maior do que os do Executivo. Foram 118,6% em termos nominais ou 54% em termos reais. O Ministério do Planejamento destaca ainda que entre aqueles classificados como consumo de governo estão muitos gastos que chama de " finalísticos", como pagamento de livros escolares e manutenção de hospitais e escolas.
Entre os repasses a Estados e municípios, os decorrentes de repartição obrigatória de receita foram os que mais subiram, com variação nominal de 147,5% e real de 74,5%. Tamanha evolução foi consequência do aumento da arrecadação federal, que nesse período até 2008 cresceu acima da variação do PIB, parte pelo bom desempenho das empresas e parte pelo ganho de eficiência na fiscalização, proporcionado pela unificação das antigas Receita Federal e Receita Previdenciária. Também cresceram substancialmente os repasses discricionários, como os destinados à merenda escolar e à manutenção do Sistema Único de Saúde (SUS). O aumento dessas despesas, no entanto, cuja execução é descentralizada, não foi de todo discricionário. Ocorreu principalmente por causa de obrigações legais pré-existentes, como a indexação de gastos com saúde à variação do PIB e a vinculação de receitas a gastos
com educação.
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