sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Falta de pessoal pode afetar pesquisas de clima e aeroespaciais

Autor(es): Virgínia Silveira
Valor Econômico - 04/12/2009

Nos últimos anos, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA) perderam muitos funcionários. Com a aposentadoria de antigosservidores e a extinção de carreiras, muitas vagas ficaram abertas, criando um déficit de pessoal que pode comprometer o futuro de pesquisas em áreas definidas como estratégicas pelo governo federal. Segundo o diretor do DCTA, brigadeiro Cleonilson Nicácio, nos últimos dez anos o órgão perdeu cerca de 700 servidores (18% do quadro atual), mas o Ministério do Planejamento,Orçamento e Gestão só reconhece a existência de 300 vagas em função da extinção de algumas carreiras ao longo da década de 90.

O problema do déficit de pessoal no Inpe é agravado com as aposentadorias - até o fim do ano, 20% dos atuais funcionários estarão em condições de se aposentar. "Em algumas áreas, como a de engenharia espacial, onde estão sendo desenvolvidos os satélites do programa espacial brasileiro, mais de 50% dos servidores já estarão em condições de se aposentar num prazo de dois a cinco anos", explica a chefe de gabinete da direção do Inpe, Maria Virgínia Alves. O Inpe possui um total de 1.097 servidores ativos, sendo 200 pesquisadores, 559 tecnologistas e 335 da carreira de gestão (analistas de C&T e funções administrativas). Até dezembro deste ano, 227servidores já podem pedir aposentadoria e entre 2010 e 2014 esse número é de 246, uma média de 50 por ano.

No Inpe, o déficit total é de 400 servidores, mas a situação foi um pouco amenizada com a autorização recente que o governo deu para a contratação de 126 servidores em caráter emergencial. A maior parte das vagas vai para o Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos, que corria o risco de interromper serviços essenciais na área de previsão, onde algumas atividades funcionam 24 horas por dia e atendem a setores estratégicos como defesa civil, aeroportos e agricultura.

As novas contratações autorizadas em caráter temporário, segundo Maria Virgínia, foram uma saída encontrada para resolver o problema dos funcionários terceirizados, que trabalham na instituição, uma vez que o governo determinou que esse tipo de mão de obra não poderia mais exercer trabalhos em atividades fim. Do total que foi autorizado, segundo a chefe de gabinete, 15 vão trabalhar no Centro de Rastreio e Controle de Satélites, dez no Laboratório de Combustão e Propulsão e 75 no CPTEC. Segundo a funcionária, o Inpe emprega hoje 139 funcionários terceirizados em atividades fim.

O DCTA vai apresentar um trabalho ao Ministério do Planejamento, que mostra a necessidade de repor o efetivo perdido nos últimos dez anos, com uma proposta de recomposição automática dos quadros, à medida que forem acontecendo as perdas. "O nosso objetivo é garantir que as equipes de pesquisa tenham continuidade, tendo em vista que o tempo para se formar um pesquisador de alto nível pode levar até dez anos." Um novo concurso foi autorizado para este ano, mas para 93 vagas, das quais apenas 35 para nível superior. A ideia é fazer novos concursos até que se chegue ao número de 700. O Centro possui hoje 3.960 servidores, sendo 1.644 militares e 2.316 civis, mas chegou a ter quase 5 mil funcionários.

Os salários dos pesquisadores do Inpe e do CTA são iguais, porque ambos são civis, da carreira de ciência e tecnologia. O salário inicial de um pesquisador com doutorado é de R$ 8.760,07 e em fim de carreira esse valor sobe para R$ 14.175,82. Um pesquisador sem titulação ganha um salário inicial de R$ 5.111,07 e de R$ 8.337,82 em final de carreira.

Para o presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Federais em Ciência e Tecnologia do Vale do Paraíba (SindCT), Fernando Moraes, as medidas planejadas pelo Inpe são soluções paliativas e não resolvem o problema da instituição, uma vez que o contrato é temporário e válido apenas por um ano. "O conhecimento científico não se transmite no curto prazo. O que o Inpe precisa é de uma reposição de vagas de forma efetiva, através de concurso", disse.

Moraes lembra que o governo autorizou a contratação de 70 mil servidores públicos e o Inpe tem o direito e a necessidade de reivindicar pelo menos 300 vagas para cobrir o atual déficit. Além da perda de pessoal, especialmente na década de 90, quando os salários estavam bastante defasados, o Inpe também tem registrado a perda de lideranças importantes por conta da aposentadoria.

No DCTA, segundo Moraes, a área que enfrenta mais problemas com a falta de pessoal qualificado é a dos lançadores de satélites que, além de perder lideranças importantes por aposentadoria, sofreu um grande impacto em 2003, com a morte de 21 técnicos e engenheiros, durante o acidente com o foguete em Alcântara, no Maranhão.

"Eram especialistas com muitos anos de experiência e conhecimento. Houve contratação logo após esse episódio, mas a necessidade do setor ainda não foi suprida." Segundo o presidente do SindCT, no Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), órgão responsável por projetos definidos como prioritários pelo governo, entre eles o do foguete VLS, veículos aéreos não tripulados, combustível líquido, para foguetes e mísseis, existe hoje uma carência de 150 a 200 pessoas.

Criada em 2003, a área de mudanças climáticas do Inpe, segundo o chefe do Centro de Ciência do Sistema Terrestre, Carlos Nobre, precisa de uma massa crítica de pelo menos 50 pesquisadores, mas nos últimos dois anos só conseguiu contratar cinco. "O governo tem dado muita ênfase às pesquisas nessa área, mas não conseguiremos avançar se não tivermos a possibilidade de contratar mais pesquisadores de maneira estável e com perspectiva de carreira", afirma.

Atualmente, de acordo com Nobre, o CST vem conseguindo desenvolver seus projetos e pesquisas com a ajuda de bolsistas de pós-graduação, que trabalham por tempo determinado. "No CPTEC eu supervisionei a contratação de 65 pesquisadores que hoje estão se tornando líderes relevantes em suas áreas de atuação, mas se quisermos consolidar as pesquisas em áreas estratégicas como a de mudanças globais, temos que criar vagas estáveis e com planos de carreiras que possam atrair bons profissionais", completou.

Aeronáutica separa atividade estratégica e área operacional

A estrutura de comando do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA) será alterada a partir do próximo ano, com o desmembramento das atividades estratégicas e operacionais. O departamento voltará a se dedicar ao gerenciamento das grandes linhas de ação nas áreas de ciência e tecnologia da Força Aérea Brasileira (FAB), e a parte operacional ficará com o CTA, com sede em São José dos Campos.

O DCTA será, provavelmente, transferido novamente para Brasília, mas de acordo com o diretor atual do departamento, brigadeiro Cleonilson Nicácio, a questão ainda não foi definida.

Em 2006, houve uma fusão entre o antigo Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento da Aeronáutica (Deped), sediado em Brasília, e o CTA, que passou a se chamar Comando Geral de Tecnologia Aeroespacial. Com as mudanças previstas para o ano que vem, a denominação antiga do CTA, Centro Técnico Aeroespacial , será retomada e o órgão voltará a ser comandado por um general três estrelas.

Há quatro meses no cargo, o brigadeiro Nicácio deverá assumir a chefia do Estado Maior da Aeronáutica (Emaer) em abril do próximo ano. Atualmente, Nicácio é o oficial general mais antigo da Aeronáutica na ativa e um dos nomes mais cotados para ser o novo comandante da Aeronáutica em 2011, possibilidade que ele prefere não comentar

"A única certeza que tenho hoje é que no dia 31 de março de 2011 estarei indo para a reserva. A escolha do novo comandante é política e nem sempre se baseia no critério da antiguidade", afirmou o brigadeiro.

De acordo com as diretrizes definidas pela Estratégia Nacional de Defesa (END) para o setor espacial, o DCTA elegeu três grandes prioridades em termos de projetos: o desenvolvimento de mísseis, veículos aéreos não tripulados (Vants) e foguetes lançadores de satélites (VLS).

"São projetos que apresentam uma sinergia com as outras Forças Armadas, que, juntas, poderão somar esforços e recursos, tanto humanos quanto de equipamentos e de laboratórios, para acelerar o desenvolvimento das suas pesquisas", avalia o diretor-geral do DCTA.

Nicácio cita como exemplo o fato de as três forças precisarem do programa de mísseis. "A Marinha precisa dos mísseis para autodefesa de navios e para os aviões de ataque. e o Exército, para seus mísseis antitanque." (VS)


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