terça-feira, 21 de setembro de 2010

Disparidade salarial provoca êxodo de servidores na UnB

UnB Agência - 21/09/2010


A cada quatro dias, um técnico pede demissão em busca de oportunidades melhores. Novo edital oferece 146 vagas e os piores salários do governo federal

Os anúncios estão na praça. Universidade de Brasília procura estatísticos de nível superior que aceitem trabalhar oito horas por dia e ganhar R$ 2.989,33 por mês. Agência Brasileira de Inteligência contrata estatísticos com a mesma formação para trabalhar o mesmo número de horas e ganhar quase quatro vezes mais: R$ 10.216,12.

Publicado nesta segunda-feira, 20 de setembro, depois de esperado ansiosamente pela comunidade acadêmica, o edital da UnB para contratação de 82 técnicos de nível superior e 64 de nível médio revela as contradições e assimetrias da administração pública. Os servidores que tornam possível as atividades que envolvem o ensino de graduação, a produção de pesquisas científicas e a administração das universidades federais estão entre os mais mal remunerados do serviço público. O piso salarial das carreiras é definido pelo Ministério do Planejamento, que, procurado pela UnB Agência não informou como as definições acontecem.

Não é a toa que, a cada quatro dias, um servidor troca a UnB por outra instituição. Dados da Secretaria de Recursos Humanos mostram que de 1º de janeiro a 20 de setembro deste ano, 125 funcionários técnico-administrativos deixaram o campus, 34 deles para assumir cargos em outros órgãos da administração pública e 36 simplesmente por concluírem que o trabalho não valia mais a pena.

Com a ameaça de corte da URP, o situação se agravou. A parcela foi garantida por decisão da ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, no último dia 16 e colocou fim à mais longa greve de técnicos da história da UnB, com 187 dias. "Não conseguimos reter o conhecimento na universidade. Tão logo o servidor começa a acumular os saberes do dia a dia acadêmico, decide ir embora porque passou em um concurso melhor ou simplesmente porque não encontrou mais motivação. E aí temos de começar tudo de novo", afirma a secretária de Recursos Humanos da UnB, Gilca Starling. "O prejuízo é enorme para a formação de quadros na universidade".

QUEM DÁ MAIS – Ofertas atrativas não faltam. Basta comparar os salários oferecidos pelo edital da UnB com os de outros anunciados nos últimos meses para algumas das 55 carreiras que levam em conta a progressão por desempenho, como ocorre com a dos técnicos das universidades. Cada uma das carreiras prevê variados cargos. Um dos editais mais recentes, o da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), oferece R$ 4.211,04 para os candidatos de nível médio aprovados. No edital da UnB, a proposta para profissionais com essa formação é de R$ 1.821,94.

A Advocacia-Geral da União, em concurso aberto em abril deste ano, ofereceu remunerações de R$ 3.730,31 para os cargos de contador e administrador. Já os salários de agentes administrativos, função que exige nível médio, prevê salários de R$ 2.851,44 – quase o mesmo valor oferecido para cargos de ensino superior na UnB, a diferença é de R$ 137,89.

Outro exemplo é da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Edital publicado no dia 15 de março para preenchimento de 186 vagas prevê salários iniciais de R$ 4.548,47 para os aprovados de nível médio e de R$ 8.955,20 a R$ 9.378,40 para os de nível superior. Isso significa, por exemplo, que um biblioteconomista que passar no concurso da Aneel vai ganhar mais que o dobro da remuneração oferecida a um mesmo biblioteconomista aprovado na prova da UnB.

Já para o concurso do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) anunciado no início do ano passado, os salários variam de R$ 3.800 a R$ 8.300 para candidatos com formação universitária. "O governo claramente prioriza algumas carreiras. E a educação não está entre elas. A diferença entre os salários pagos nas universidades e em outros setores do Poder Executivo é gritante", comenta o professor do Departamento de Administração da UnB, Eduardo Raupp de Vargas. "É preciso um debate sério sobre como tratar os servidores públicos com mais igualdade", acredita.

NEGOCIAÇÃO – Os salários dos servidores técnicos das instituições de ensino superior são iguais em todo o país e foram definidos pela lei 11.091, de 2005. Por estar na capital do país, no entanto, a UnB sofre ainda mais que as outras universidades com a evasão de técnicos, na opinião de outra professora do Departamento de Administração, Catarina Odelius, especialista em gestão de pessoas. "As grandes atividades de Brasília estão ligadas à vida pública. Então, essa troca de um cargo público por outro é mais evidente aqui do que em cidades como São Paulo, por exemplo, onde há inúmeras ofertas de ótimos empregos ligados à produção econômica e industrial", analisa.

Catarina destaca que um dos fatores determinantes para as diferenças salariais é o poder de negociação dos representantes de cada carreira. "As melhorias salariais dependem muito da prioridade que é dada pelo Estado àquela carreira, mas um fator que também influencia é a atuação das entidades representativas de cada categoria", afirma. Ela enumera ainda um outro componente que definiria o valor das remunerações: o tamanho de cada carreira. "Quanto maior o contingente de profissionais necessários naquele setor, maior a possibilidade de encolhimento de salários pelo Estado", compara.

PRIORIDADES – A coordenadora-geral Léia de Souza Oliveira, da Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores das Universidades Públicas Brasileiras (Fasubra), que tem sede na UnB, lembra que o cenário de baixos salários já foi pior. Em 2007, professores e técnicos desencadearam uma das mais duras paralisações nacionais da história das universidades brasileiras. O resultado foi um acordo coletivo que garantiu reajuste que variou de 32,89% a 100,59%. O percentual depende do nível e da classe que cada servidor ocupa na estrutura do plano de carreira.

O montante foi pago em três parcelas, a última delas incorporada aos salários em julho deste ano. "Conseguimos uma vitória importante, mas é que os salários da categoria eram tão baixos que mesmo com o reajuste ainda estamos entre as piores remunerações da administração pública", admite Léia. Ela defende que a luta por isonomia é o mais urgente do movimento sindical. "Precisamos colocar na mesa todos os salários, de todos os cargos e carreiras, e discutir politicamente. É um grande desafio", diz.

O Brasil investe em educação 5,1% do Produto Interno Bruto. A recomendação da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e a Cultura (Unesco) é de que seja no mínimo 6%. No primeiro semestre deste ano, a Conferência Nacional de Educação (Conae) aprovou a ampliação de 1% do PIB, de forma que se atinja o patamar de 7% em 2011 e 10% em 2014. A proposta foi incluída no novo Plano Nacional de Educação, que definirá as macropolíticas para a educação brasileira para o período de 2011 a 2020 e deve ser encaminhado ao Congresso Nacional depois das eleições.

CONCURSO – As inscrições para o concurso para servidores técnicos da UnB estão abertas até o dia 25 de outubro pela internet. São 146 vagas para 12 cargos, dez deles para profissionais de nível superior e duas para nível médio. As vagas que exigem formação universitária são de analista de tecnologia da informação, biblioteconomista, contador, engenheiro, estatístico, médico, químico e secretário executivo. Para os candidatos de nível médio, os cargos são de assistente de administração e técnico de laboratório. Veja aqui o edital.



Share This

Pellentesque vitae lectus in mauris sollicitudin ornare sit amet eget ligula. Donec pharetra, arcu eu consectetur semper, est nulla sodales risus, vel efficitur orci justo quis tellus. Phasellus sit amet est pharetra