Blog do Noblat
- 23/09/2011
A recente divulgação pelo Ipea(Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada) do estudo “Ocupação no setor público brasileiro: tendências
recentes e questões em aberto” colocou em pratos limpos o que é fato e o que é
discurso quando o assunto é nomeação política para cargos federais: o Governo
Lula contratou três vezes mais servidores concursados do que seu antecessor, a
gestão Fernando Henrique Cardoso.
Um dos motes repetidos à exaustão na campanha presidencial
de 2010 pelo candidato do PSDB, José Serra, era justamente que o Governo Lula
aparelhava o Estado com práticas de loteamento da máquina pública. Esse
discurso, aliás, tem sido utilizado com frequência pela oposição para aludir a
uma suposta ausência de critérios técnicos na nomeação de cargos públicos.
No entanto, o estudo do Ipea derrubou essa falácia e revelou
que o nível de contratações na década de 2000 foi crescente, mas apenas repôs o
nível de funcionários públicos concursados existente no começo dos anos 1990.
Há, portanto, conclusões duplamente incômodas aos tucanos:
de um lado, desmascaram o discurso de campanha e de oposição do
“aparelhamento”, que não tem amparo na realidade; e, de outro lado, apontam
para um processo de sucateamento da máquina pública sob a gestão FHC. E sabemos
que esse processo decorre de uma opção política.
De fato, o segundo mandato de FHC foi marcado pela
prioridade conferida à contenção fiscal das despesas estatais e à privatização
do patrimônio público nacional. Duas diretrizes do modelo neoliberal, adotado
com entusiasmo pelos tucanos.
Como resultado, o tamanho do Estado foi reduzido, com graves
perdas à capacidade de planejamento, formulação, gestão e execução de políticas
públicas. Essa foi a face perversa da “herança maldita” deixada pelo PSDB na
área da Administração Pública.
Tal tendência só foi revertida com o Governo Lula, que fez
claras opções políticas opostas ao modelo tucano, dando início a um novo papel
do Estado. Nosso caminho foi o de priorizar o crescimento econômico, o
desenvolvimento sustentável, a distribuição de renda e a capacidade do Estado
de estimular e induzir os vetores produtivos nacionais.
Trata-se de um modelo que se mantém e vem sendo aprofundado
no Governo Dilma Rousseff, mas que precisou inicialmente superar a questão de
como avançar com uma máquina estatal sem condições de planejar e realizar as
políticas públicas.
Era fundamental, portanto, reanimar o Estado, contratar
novos funcionários públicos e mirar no aumento da eficiência —metas que se
mantêm, especialmente em áreas como a Educação, na qual precisamos avançar sem
demora.
Esse novo caminho é claramente identificado no estudo do
Ipea, que destaca “a preocupação em conferir maior capacidade burocrática ao
Estado brasileiro, mediante o reforço de carreiras em áreas estratégicas”. Em
outras palavras, não seria possível crescer sem fortalecer o Estado e as
carreiras estatais, por meio de uma política clara e consistente de aumento do
salário mínimo e do incremento de benefícios sociais.
Como destaca o Ipea, “o novo cenário de crescimento da
economia que teve início em 2004 favoreceu o início de uma fase de expansão do
quadro de pessoal da administração federal, bem como a política de ajustes
graduais da remuneração dos servidores”.
Paralelamente, o Governo Lula promoveu a reabertura dos
concursos públicos dirigidos em áreas prioritárias e estratégicas. Assim,
conseguiu atender a três objetivos simultâneos: ampliar a capacidade estatal,
recompor os funcionários que se aposentaram e substituir as contratações
“terceirizadas” —esta, uma prática frequente dos governos tucanos.
Notem também que, em 2009,Estados e municípios gastaram o
dobro com pessoal do que o governo federal, mais um dado que contradiz o
“aparelhamento”. Para ser exato: 21,8%das despesas federais foram com pessoal,
ou 4,3% do PIB, enquanto que, nos Estados, esses percentuais foram de 51,2% e
6,2%, respectivamente, e nos municípios de 48,9% e 3,5%.
É lamentável que as conclusões do Ipea tenham recebido
destaque reduzido e provocado pouca repercussão, porque somente a divulgação
ampla é capaz de derrubar o falso mito do aparelhamento.
Ademais, estudos como esses lançam luz sobre a evolução do
Estado brasileiro e contribui decisivamente para identificarmos entraves e
melhorias no desempenho estatal, permitindo que possamos intensificar esse
processo de profissionalização do serviço público e combate à corrupção no
interior da máquina estatal.
José Dirceu, 65, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e
membro do Diretório Nacional do PT