O Estado de S.Paulo
- 19/09/2011
Entre as matérias que quer aprovar rapidamente no Congresso,
o governo deu prioridade à criação do Funpresf, o fundo de pensão que vai
complementar a aposentadoria de servidores públicos que desejarem receber acima
do teto de R$ 3.689,66, fixado pelo INSS para trabalhadores do setor privado.
Válido só para quem ingressar no funcionalismo federal após sua promulgação, o
fundo será capitalizado com contribuições do governo (até o limite de 7,5% do
salário) e do funcionário ao longo de sua vida ativa. O projeto já passou por
duas comissões na Câmara, será submetido a mais duas e só depois irá ao
plenário para votação. Até concluir a tramitação no Senado, sua aprovação final
deve ocorrer em meados de 2012. A proposta de criação do fundo chegou ao
Congresso em 2003 e por lá dormitou por sete anos, pois o ex-presidente Lula
dela desistiu, pressionado pelas centrais sindicais. Dilma Rousseff decidiu
retomá-la. Não é a reforma que a Previdência precisa, mas ao menos busca
estancar o enorme déficit bancado pelo Tesouro, que em 2011 somará R$ 57
bilhões.
Quando a ideia nasceu - e lá se vão sete anos -, o governo
Lula acreditava que ela vingaria também nos Estados e municípios: governadores
e prefeitos fariam germinar centenas de fundos de pensão para seus servidores
Brasil afora. Seria a solução não só para estancar os infindáveis e gigantes
déficits previdenciários de Estados e municípios. Criaria um sistema
sustentável e seguro para o servidor e ainda contribuiria para elevar a taxa de
poupança da economia brasileira, que precisa chegar a 25% do PIB para alavancar
investimentos, mas é a mais baixa entre todos os países emergentes e patina em
17%.
Na época, governadores e prefeitos se entusiasmaram com a
ideia, mas logo desistiram ao perceber que dela não tirariam vantagem
financeira durante seus mandatos. É que nos primeiros 15 anos de vigência do
novo sistema os governos vão mais gastar do que economizar com a previdência,
já que vão arcar com duas despesas: o pagamento dos benefícios pelo sistema
atual e a contribuição mensal da capitalização do novo fundo. O futuro servidor
pode escolher ficar fora do fundo, mas terá a aposentadoria limitada a R$
3.689,66. Ou pagará para receber acima disso.
Mas, se o governo gasta mais no curto prazo, quem ganha com
a proposta?
Só este ano o Tesouro vai bancar R$ 57 bilhões para cobrir o
déficit previdenciário da União, concentrado em apenas 950 mil pessoas. Duas
comparações para medir essa injusta concentração da renda pública: o déficit do
INSS, de R$ 39 bilhões, é 32% menor e abrange 24 milhões de aposentados e
pensionistas; o Bolsa-Família custa ao País 72% menos (R$ 16 bilhões) e
beneficia 12 milhões de famílias, ou cerca de 50 milhões de pessoas. Se o
déficit é equacionado e o dinheiro, economizado a médio prazo, ganham 190
milhões de brasileiros, principalmente os mais pobres que podem aspirar à
educação e à saúde de melhor qualidade e redes de esgoto e água tratada, se os
futuros governantes aplicarem o dinheiro poupado com justiça e honestidade. E,
se os governadores também aderirem à ideia, aliviando o déficit de R$ 31
bilhões dos Estados, ganha a economia do País, com fundos de poupança que
ajudam a fomentar o investimento público e multiplicar empregos. Ganha o
próprio servidor público, que passa a ter um sistema previdenciário estável e
seguro. E, sobretudo, ganham as futuras gerações, porque sairá de suas costas o
peso de pagar cada vez mais caro por um sistema inviável.
Mesmo que gastem mais nos primeiros 15 anos, governadores e
prefeitos serão vistos como responsáveis por, finalmente, equilibrar as contas
da previdência, dar uma solução definitiva à questão, estancar a sangria de
despesas que ano a ano devora cada vez mais verbas públicas de Estados e
municípios e que pode ser revertida em investimentos usufruídos por toda a
população. No curto prazo podem gastar um pouco, mas a médio e a longo prazos a
população é beneficiada e saberá retribuir ao seu governante. Mas como o
político brasileiro pensa pequeno, até agora a ideia só seduziu o governo de
São Paulo.
Suely Caldas
JORNALISTA E PROFESSORA DA PUC-RIO E-MAIL:
SUCALDAS@TERRA.COM.BR