Laura Knapp
Valor Econômico - 25/11/2011
São Paulo - Que a administração pública brasileira precisa
ser modernizada, ninguém duvida - os próprios governos já se deram conta disso.
Mudanças na economia e na própria sociedade transformaram o sistema que rege o
funcionalismo no país, refinado burocraticamente nos últimos 60 ou 70 anos,
obsoleto em alguns aspectos. O próprio modo como a carreira de funcionário
público funciona mostra isso. Se há exames cada vez mais concorridos para uma
vaga vitalícia, o incentivo para se aperfeiçoar na carreira desaparece com o
tempo, resultado da própria estabilidade.
Esse é um dos grandes gargalos que as administrações
públicas precisam enfrentar: como incentivar seus funcionários e treiná-los
para assumir novas funções. E como preparar pessoas treinadas como técnicos a
agir como gerentes ou diretores. "Técnicos viraram gestores na prática.
Não estavam preparados, não tinham obrigação para isso", diz Paulo
Vicente, professor de estratégia da Fundação Dom Cabral (FDC).
"Existem pessoas muito preparadas na área pública
quanto ao conhecimento técnico, mas ainda temos um gargalo com relação ao
conhecimento gerencial", afirma a consultora Mirza Quintão Utsch, do INDG
(Instituto Nacional de Desenvolvimento da Gestão). "Mas esse cenário tem
avançado. Percebemos que servidores têm buscado aprimorar a gestão".
Como nem todo técnico domina questões administrativas ou
gerenciais, esses cargos são comumente preenchidos por cargos comissionados,
trazidos de fora da máquina pública.
Se de um lado isso traz velocidade para resolver questões
imediatas de gestão, por outro traz problemas de continuidade, pois os
funcionários comissionados são substituídos quando seus chefes saem dos cargos.
Mas já existem iniciativas em alguns lugares, principalmente nos Estados de
Minas Gerais, São Paulo e Bahia, onde servidores públicos vêm sendo treinados
para assumir posições gerenciais. "Solução existe", afirma Nelson
Marconi, professor de economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo. O
Rio, afirma, está em um grande processo de planejamento da força de trabalho,
fazendo um levantamento de todos os órgãos públicos, o que fazem, quem são os
funcionários, de que precisam. Minas Gerais deve seguir o mesmo caminho.
Outra questão que os governos precisam enfrentar é como
montar um sistema de incentivos para os funcionários. Novamente um dos
obstáculos é o volume de recursos necessários para isso, além da legislação.
"A formação é custosa, demorada, e às vezes só há resultado efetivo um
governo depois", aponta Vicente, da FDC.
São Paulo está entre os Estados citados por consultores como
um dos mais avançados nos esforços de modernização de sua máquina pública.
Nesse sentido, há vários projetos em andamento para avançar na
profissionalização, segundo a secretária estadual de gestão pública, Cibele
Franzese. Um deles é a cerificação ocupacional, quando vários profissionais que
querem disputar cargos de diretoria passam por uma certificação. A ideia é
reduzir a nomeação de pessoas comissionadas. O programa está sendo ampliado e
foi implantado em áreas como educação, saúde, diretoria de hospitais, centros
médicos e ambulatoriais.
O governo paulista também trabalha na melhoria do desenho
das carreiras. O projeto visa esclarecer as oportunidades de promoção e
progressão, ligando-as ao mérito e desempenho do funcionário. Para isso, são
oferecidos cursos e investimentos em atualização. Na educação, o interesse não
é apenas premiar quem estuda para passar nas provas, mas também aqueles
professores que aplicam os conhecimentos no dia a dia do ensino.
O governo federal também tem avaliado ações para melhorar o
serviço público, diz a secretária de gestão do Ministério do Planejamento, Ana
Lúcia Amorim de Brito. Um dos pontos é o bom desempenho dos profissionais, com
capacitação das equipes. Como em outras administrações, adota-se a gestão por
competência, a avaliação de desempenho, assim como a remuneração, capacitação e
o bom ambiente de trabalho.
A reestruturação de áreas críticas no governo federal serão
analisadas pela câmara de gestão da Casa Civil. O escritório vai identificar e
priorizar questões a serem tratadas, simplificar processos e rotinas. Os
estudos de melhoria da organização federal também analisam o arcabouço
jurídico. É preciso mais flexibilização para garantir uma maior agilidade, afirma
Brito, mas os modelos para tornar isso possível ainda não estão definidos.
"A necessidade de melhora, como em todas as áreas, públicas e privadas, é
grande e constante", diz. "A melhoria sustentável não muda com ações
de impacto, mas com ações bem estruturadas e contínuas".