Por Fábio Santos
Reuters -
18/11/2011
SÃO PAULO - O governo de Dilma Rousseff corre contra o tempo
para cumprir uma das prioridades estabelecidas pela presidente para seu
primeiro ano de mandato: a aprovação do projeto que cria o Fundo de Previdência
Complementar do Servidor Público Federal.
A questão é um bom indicativo de como, para governar
seguindo a sua agenda na área fiscal, a presidente depende da fidelidade do
PMDB e não conta com o apoio integral de seu próprio partido e dos aliados de
esquerda.
As principais resistências ao projeto de lei 1992/07, que
tramita na Câmara há quatro anos, estão justamente no PT, PDT, PCdoB e PSB. A
partir desta sexta, a proposta passa a travar a pauta da Câmara. A paralisação
das demais votações, porém, não vai comprometer outra das prioridades do
governo, a renovação da Desvinculação de Receitas da União (DRU), pois esta é
uma proposta de emenda constitucional, que pode ser votada em sessões
extraordinárias.
Dificilmente Dilma conseguirá aprovar o Funpresp no seu
primeiro ano de mandato como queria. É improvável que o texto passe pelo Senado
antes de 15 de dezembro, quando o Congresso entra em recesso. Na semana
passada, o líder do governo na Casa, Romero Jucá (PMDB-RR), praticamente
descartou essa possibilidade.
Antes de chegar ao Senado, a proposta ainda precisa passar
por três comissões da Câmara e ser aprovado em plenário. Mesmo assim o Planalto
diz estar confiante e se dispõe a votar o projeto, ainda que seja para derrotar
parte de sua própria bancada.
'Vamos votar ainda neste mês', afirmou o líder do governo na
Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), a esta coluna.
O governo já não considera em sua conta os votos do PDT (27)
e PCdoB (13) e de uma parcela do PT -pelo menos 30 por cento dos 86 deputados
do partido são terminantemente contra e outros 30 por cento exigem mudanças
para apoiá-lo. Por conta disso, o Planalto se apóia no PMDB para garantir no
plenário pelo menos 50 votos dos 79 que o partido tem.
Como se trata de uma lei ordinária, basta maioria simples
dos presentes para aprová-lo. Entram nos cálculos do Planalto alguns votos do
PSDB e do DEM, pois a criação do Funpresp atende o discurso da oposição em
defesa de maior rigor fiscal.
De fato, a medida é essencial para indicar compromisso da
administração federal com o equilíbrio das contas públicas. Com o fundo, o
governo espera conter o crescimento do déficit da previdência do setor público,
estimado em 57 bilhões de reais para este ano -no ano passado, o rombo ficou em
51,2 bilhões de reais.
Para se ter idéia da dimensão do buraco, é útil compará-lo
ao déficit do INSS, que paga as aposentadorias dos trabalhadores do setor
privado. O desempenho negativo do regime geral de previdência tem ficado
estável em torno de 42 bilhões de reais, principalmente em função do aumento do
emprego formal nos últimos anos.
Apesar de ter um déficit maior, o regime de previdência do
funcionalismo atende menos de um milhão de servidores aposentados, enquanto o
INSS paga benefícios para mais de 24 milhões de brasileiros.
A razão para essa distorção é que, hoje, os funcionários dos
três Poderes têm direito a aposentaria integral, ou seja, igual ao último
salário recebido. Os aposentados do setor privado, porém, têm um teto para seu
benefício, hoje em 3.691,74 reais.
De acordo com o projeto, após a criação do Funpresp, o valor
máximo do benefício dos servidores aposentados passará a ser igual ao do INSS.
Para ganhar acima desse teto, o funcionário terá de contribuir para o fundo com
percentual do salário estipulado por ele mesmo. A regra valerá apenas para quem
ingressar no serviço público após a aprovação da lei.
O empregador governamental -Executivo, Legislativo ou
Judiciário- será obrigado a contribuir com 7,5 por cento. Esse é justamente o
ponto de maior discordância entre os partidos de esquerda. Alguns parlamentares
querem que o percentual seja elevado para 8,5 por cento, algo que o governo não
está disposto a ceder. Afinal, reduziria o ganho fiscal da medida.
Para tentar conquistar alguns votos no PT, o governo já
aceitou rever outros itens. Um deles é a gestão do fundo, que, pelo projeto,
seria feito por uma entidade privada. É provável que a redação final deixe a
administração com o próprio Funpresp.
Alguns críticos do projeto apontam o risco de fundo ficar
sujeito a controle político do governante de plantão, já que não é previsto
mandato para seus dirigentes, nem a presença de representantes dos funcionários
no seu comando. Esse é outro ponto que pode mudar, o que, de fato, daria mais
legitimidade ao Funpresp.
Por fim, o governo pode aceitar que os funcionários de cada
Poder tenham o seu fundo. A alteração, porém, retira eficiência na gestão e
aplicação dos recursos. Em vez de apenas uma, seriam três as entidades de
previdência complementar.
Mesmo que passe no Congresso, a proposta enfrenta ainda
fortes resistências corporativistas. Uma das principais fontes de oposição,
além do movimento sindical dos servidores, são os juízes federais, que já
ameaçaram recorrer ao Supremo Tribunal Federal, por considerar que o tema
deveria ser objeto de lei complementar.
Essa é uma batalha que a presidente Dilma não pode perder,
sob pena de ter questionados o seu controle sobre a base aliada governista e
seu compromisso com o rigor fiscal.
É fato que, de imediato, a criação do Funpresp deve
representar um aumento do custo fiscal da previdência dos servidores. Isso se
dará porque hoje os funcionários contribuem com 11 por cento sobre o salário
integral. No novo regime, esse percentual será aplicado, no máximo, sobre o
teto (3.691,74 reais). Mas, no médio e no longo prazos, o país sairá ganhando
com a mudança, ainda que algumas corporações percam.