ANA D'ANGELO
Correio Braziliense - 14/03/2012
28 mil servidores sob suspeita
Investigação identifica os servidores do Executivo que
acumulam irregularmente remunerações e ganham acima do teto de R$ 26,7 mil
Sistema nacional do governo vai cruzar fichas de 11 milhões
de funcionários da União, de estados e de prefeituras para checar quem acumula
cargos indevidamente
O governo federal está atrás dos servidores que acumulam
mais de um cargo público indevidamente e daqueles que já recebem aposentadoria
ou pensão que, somada à remuneração do trabalho, ultrapasse o teto do
funcionalismo, de R$ 26,7 mil. Para isso, está concluindo a implantação de um
sistema nacional de cruzamento da base de dados dos 11 milhões de funcionários
ativos e inativos da União, estados e municípios dos três poderes — Executivo,
Judiciário e Legislativo. O projeto-piloto começará pelo Distrito Federal, a
partir de julho.
Um primeiro levantamento feito como teste pelo Ministério do
Planejamento, em 2009, com dados da União e de 14 estados, detectou 198 mil
servidores ativos das três esferas acumulando cargo ou benefício
previdenciário. Desses, o governo concluiu que 28 mil recebiam duas ou mais
remunerações da administração pública irregularmente.
Quando o sistema estiver implantado em todo o país, o
governo espera economizar pelo menos R$ 7 bilhões por ano com a folha de
pagamento do pessoal ativo e inativo das três esferas. A previsão é de que
estará funcionando até o fim do ano em todos os estados e nos 50 maiores
municípios.
O secretário de Políticas Previdenciárias do Ministério da
Previdência Social, Leonardo Rolim, explica que a quantidade de irregularidades
é bem maior, pois, além de se limitar à União e a 14 estados, esse levantamento
levou em conta bases de dados precárias, pois cada órgão registra a ficha
funcional dos servidores de uma forma diferente. Milhares de registros
funcionais ainda estão em papel. Tudo isso dificulta o cruzamento de
informações com cadastros dos diversos órgãos.
Mesmo assim, foram descobertos médicos e professores com
diversos vínculos empregatícios com governos estaduais e a União. Um deles
tinha sete. "Quem tem os sete cargos está trabalhando nos sete? Ele não é
três para dar conta", espanta-se Rolim. Segundo ele, esses dados nem
incluem os dos municípios.
Os 28 mil casos irregulares identificados pelo Ministério do
Planejamento foram repassados para a Controladoria-Geral da União (CGU), para
cobrar dos órgãos correspondentes as providências devidas, que incluem,
conforme o caso, a exoneração de um dos cargos, a limitação dos valores
recebidos ao teto do funcionalismo e até a devolução do que foi embolsado
indevidamente.
Compatibilidade
A Constituição permite a acumulação de, no máximo, dois
cargos públicos, desde que haja compatibilidade de horário, e para apenas dois
tipos de profissionais: o professor (que também pode ter um segundo emprego no
serviço público na área técnica ou científica) ou o profissional da área de
saúde, com profissão regulamentada. As duas outras exceções são o magistrado e
o membro do Ministério Público que podem ser professores da rede pública. Como
esses últimos já recebem próximo ao teto do serviço público, muitos estão
embolsando valor acima, sem a aplicação do chamado abate-teto.
Segundo Rolim, o levantamento apontou também servidores de
outras áreas acumulando cargos que a lei não permite, como de auditor-fiscal e
professor. "Quando o sistema estiver funcionando em todos os estados e
municípios, a quantidade de irregularidades detectadas vai aumentar
substancialmente", destacou o secretário, lembrando que muitos são
funcionários fantasmas, trabalhando efetivamente mesmo só em um ou dois dos
empregos.
Rolim afirmou ainda que a maior parte da economia prevista
de R$ 7 bilhões vai beneficiar os municípios, pois estados e União pagam
salários maiores. Assim, o servidor que tem mais de um cargo tende a optar pelo
da esfera federal ou estadual. "Assim que o sistema estiver a todo vapor
em todo o país, a identificação das irregularidades será automática tão logo o
servidor assuma um novo cargo ou passe a receber um benefício
previdenciário", observou.
Conclusão de acordos
O governo federal fechará o termo de cooperação com o
Governo do Distrito Federal nos próximos dias, para implantação do
projeto-piloto de cruzamento de dados, que fará parte do Sistema Previdenciário
de Gestão de Regimes Próprios de Previdência Social (Siprev). As bases de dados
já estão sendo preparadas. O Ministério da Previdência informou que 300 entes
públicos, entre estados e municípios, já aderiram ao projeto no país, dos quais
12 são capitais. O governo federal está para concluir o acordo nos próximos
dias com Espírito Santo, Rio de Janeiro, Paraná, Mato Grosso, Pernambuco,
Alagoas e Santa Catarina.