Jânio de Freitas
Folha de S. Paulo
- 09/08/2012
As greves de serviço público que se voltam contra a
população voltam-se também contra a democracia
AS GREVES da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária
Federal, com os danos da primeira à prestação de serviços ao público e, a
segunda, com a interrupção de vias como a ponte Rio-Niterói, fazem aquilo mesmo
que as duas polícias invocam para reprimir com a força de cassetetes e armas
qualquer grupo, de grevistas ou de manifestantes, que perturbe a normalidade de
um serviço, um prédio ou uma estrada do sistema federal.
As greves de serviço público que se voltam contra a
população voltam-se também contra a democracia. Na euforia do momento tão
esperado, a Constituinte estendeu o direito de greve ao serviço público como
uma conquista democrática sem precedente no Brasil.
A precaução de preservar o direito da população, porém,
ficou longe do equilíbrio necessário entre a nova concessão a uns e as velhas e
permanentes necessidades de todos os outros.
A permanência dos serviços, por plantões de servidores nos
seus locais de trabalho, é uma farsa dos respectivos sindicatos.
Os plantões fazem figuração, sempre com número exíguo de
funcionários para que os serviços não sejam mesmo prestados.
Atestam-no as filas imensas, o atendimento com os modos da
tal operação tartaruga, as falsas informações que iludem os necessitados de
documentos ou de providências pendentes da Polícia Federal, e por aí vai. Ou
melhor, não vai.
Não deixar ir se torna mesmo o propósito exibido ao vivo
pela Polícia Rodoviária Federal, que saiu de sua mínima valia para solucionar o
que não resolve de outro modo: parou milhares e milhares de carros, caminhões,
ônibus, gente com compromissos, gente a caminho do trabalho, gente cansada do
trabalho, cargas perecíveis, cargas para embarque aéreo -serviço completo,
enfim.
Se as polícias que reprimem anormalidades passam a fazer
anormalidades, não haverá quem recomponha a normalidade. Mais: estará
assegurado, por antecipação, que todos ficarão impunes.
E, pronto, estão estabelecidas as diferenças antidemocráticas:
há os que se estrepam com a polícia se perturbarem área federal e, de outra
parte, os que tanto reprimem aqueles como fazem livremente as mesmas
perturbações.
Não, não as mesmas: as dos policiais são remuneradas e os
seus dias de perturbadores contam para promoções por tempo de serviço e para a
aposentadoria.
Funcionário da Polícia Federal ganha mais do que professor
nas universidades federais e do que médicos do serviço público federal. E nem
se destaque a faixa dos delegados, para não humilhar professores e médicos.