quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

A administração pública necessita de reforma?


José Matias-Pereira
Correio Braziliense      -      17/01/2013




Professor e pesquisador do programa de pós-graduação em administração da Universidade de Brasília, pós-doutor em administração pela Universidade de São Paulo (USP), doutor em ciência política " área de governo e administração pública " pela Universidade Complutense de Madri (Espanha)
Os dados sobre as perspectivas de crescimento sustentável da economia brasileira não são nada animadores. Os indicadores internos (IBGE, Banco Central, Ipea) e externos (OCDE, Banco Mundial, FMI) revelam que o país apresenta sinais de estabilização no processo de crescimento. Os estudos mostram que a debilidade é maior do que a da maioria das economias que estão no centro da crise financeira. Frente a esse cenário sombrio da economia nacional, torna-se recomendável debater a necessidade de incluir-se na agenda política do país a realização de profunda reforma da administração pública.

Pressupomos neste artigo que a modernização da administração pública pode contribuir para apoiar o processo de retomada do crescimento da economia brasileira. Assim, formulamos algumas questões-chave: o Brasil está retrocedendo no seu modelo de gestão pública? Os valores patrimonialistas, rejeitados universalmente, no qual se confundem os patrimônios públicos e privados, estão sendo retomados na gestão pública brasileira?


Na história recente da “modernização” da administração pública brasileira (1930 a 2010), podemos identificar cinco momentos significativos: a reforma administrativa do governo Getúlio Vargas (década de 1930); as medidas institucionais adotadas para a implementação do Plano de Metas (1955) do presidente Juscelino Kubitschek, que permitiram a realização de reforma administrativa silenciosa, efetivada por meio da denominada “administração paralela”; a expedição do Decreto-lei nº 200, de 1967, no período do autoritarismo (cujo teor se apresenta como evolução da “administração paralela”, na medida em que promoveu a flexibilização das normas e controles da administração indireta); o Plano da Reforma do Estado, de 1995, no governo Fernando Henrique Cardoso; e a recomposição da administração pública, por meio do fortalecimento das carreiras típicas de Estado, no governo Lula (2003-2010). Verifica-se que, ao longo desse período, conforme evidencia a literatura, o país conviveu de forma simultânea com os modelos patrimonialista, burocrático e gerencial.


Ao mesmo tempo em que se reconhece o sucesso relativo da experiência pioneira no decorrer das transformações econômicas e sociais da sociedade brasileira, é preciso ressaltar que essas reformas também contribuíram para a geração de inúmeras distorções, dificuldades de coordenação e conflitos entre a administração direta e a indireta. O modelo patrimonialista, nesse cenário, merece receber especial atenção, pois representa o principal obstáculo ao processo de modernização da administração pública, nos três níveis de governo: União, estados e municípios. Registre-se que, sob uma perspectiva histórica, a sobrevivência do patrimonialismo tem suas raízes nas relações de poder, na estrutura social e nos valores políticos e ideológicos prevalecentes na sociedade brasileira.


Observa-se, em que pesem os esforços para superar o modelo burocrático e implementar o gerencial, que a forma patrimonialista de gestão vem sendo intensamente retroalimentada na última década, com o crescente aumento da máquina governamental, sem critérios técnicos, e dos gastos públicos (criação de ministérios, secretarias, empresas estatais, aumentos salariais etc.); negociação de apoio político e entrega de ministérios e órgãos estratégicos para partidos, sem critérios técnicos; distribuição de cargos de elevado nível hierárquico para afiliados políticos, sem levar em conta a competência técnica; utilização de recursos públicos para financiar interesses políticos escusos, entre outros. Esse processo de retroalimentação do patrimonialismo, além de afetar o desempenho da administração pública, na medida em que facilita desvios e a corrupção, se apresenta uma ameaça real à governança e à democracia do país.

É importante destacar, por fim, que a reforma da administração pública não vai resolver a causa básica da crise econômica atual, visto que se encontra fora da possibilidade de ação do Estado. A função da reforma da administração é buscar rearticular o Estado e suas relações com a sociedade de forma a adaptar-se a esse novo cenário econômico e político internacional. Nesse sentido, a principal justificativa da reforma da administração pública é a imperiosa necessidade de atender às crescentes demandas da sociedade com serviços públicos de qualidade, reduzir gastos, implementar e avaliar políticas públicas, elevar a transparência, além de promover investimentos em setores estratégicos, para permitir que o país possa reencontrar a trilha do desenvolvimento sustentável.


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