Correio Braziliense - 22/02/2013
Pensando Direito, pesquisa da Fundação Getulio Vargas em
parceria com a Universidade Federal Fluminense, faz uma radiografia dos
concursos públicos no país. A imagem apresentada não surpreende, mas preocupa.
É crescente o número de brasileiros que, obcecados por uma vaga na
administração estatal, se desinteressam pelas ofertas da iniciativa privada.
Vai longe o tempo em que tornar-se funcionário público não
exigia nenhum preparo ou compromisso. A porta se escancarava para apadrinhados,
que recebiam prêmio por favores prestados. Os QIs, como eram jocosamente
chamados, não cumpriam horário nem prestavam serviços. Sentavam-se em gabinetes
carpetados, com ar-condicionado e cafezinho, com um único objetivo: embolsar o
salário no fim do mês.
A Constituição de 1988 mudou o cenário ao exigir concurso
público para acesso aos empregos que garantem estabilidade e remuneração não
raro superior à oferecida pelo setor privado. Concretizar o sonho passou a
depender do esforço de cada um. Nada mais previsível do que a corrida que,
desde então, se observa em direção aos empregos oferecidos pela União, por
estados e municípios.
Profissionais não mais procuram vagas na iniciativa privada.
Aliás, muitos abandonam o emprego a fim de se preparar para as provas. A
demanda, porém, não se traduz em melhora do serviço prestado ao público. Por
duas razões. Uma delas: o processo nem sempre recruta os candidatos com o
perfil exigido pelo cargo. A outra: muitos aprovados preenchem a vaga a título
de trampolim. Ficam à espera de posto que consideram mais vantajoso.
O concurseiro profissional gerou problemas para a
administração governamental. Muitos órgãos não conseguem formar quadros, uma
vez que o servidor é movido pela transitoriedade. Tal qual nas relações
pessoais modernas, ele é ficante. Fica enquanto aguarda a chamada de outro
emprego. Quando se concretiza a troca, a busca se desloca. E assim
sucessivamente. Como a grande maioria se move por essa lógica, a conta bate à
porta do cidadão, que, embora pague o valor do contracheque, não recebe a
contrapartida.
Não é só o empregador público que sofre as consequências da
febre concurseira. O mercado se ressente da baixa oferta de profissionais
especializados. Hoje, ao contrário do cenário anterior à Carta Cidadã, é mais
fácil encontrar oportunidade concreta na iniciativa privada que no setor
estatal. Impõem-se, para fazer frente à realidade, dois movimentos capazes de
equilibrar os pratos da balança. De um lado, aumentar a oferta sobretudo em
áreas marcadas pela escassez. De outro, encontrar forma de oferecer serviço
público de excelência, capaz de responder às expectativas da população e fazer
jus ao alto custo desembolsado pela sociedade.