Vinicius Sassine
O Globo - 06/03/2013
Entre os que ganham acima do teto, há adidos da PF e da
Receita
Nas alturas. Patriota: Itamaraty recorreu da decisão do TCU
que mandou cortar supersalários
BRASÍLIA - Dois entre dez servidores públicos federais em
exercício fora do país recebem salários acima do teto fixado na Constituição.
Um novo levantamento do GLOBO revela que a cúpula da diplomacia brasileira,
formada por 132 servidores, não é a única a receber remunerações acima de R$
26.723,13, vencimento pago a um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e
estipulado como teto salarial. De um universo de 2.129 servidores federais no
exterior, 445 recebem mais do que o teto. A grande maioria integra carreiras do
Itamaraty: são administradores, analistas de sistema, oficiais de chancelaria,
diplomatas da primeira à terceira secretaria, conselheiros e a cúpula do órgão
(ministros de primeira e segunda classe, incluindo os embaixadores).
O levantamento inclui os adidos da Polícia Federal, da
Receita Federal e do Ministério da Agricultura no exterior Da PF e do
Ministério da Agricultura, são 23 adidos, dos quais 16 recebem acima do teto,
como O GLOBO já havia mostrado na edição do último dia 25. No último domingo, o
jornal revelou que os supersalários da cúpula do Itamaraty no exterior chegam a
R$ 58,9 mil, valor pago em janeiro deste ano ao embaixador do Brasil na República
do Congo, Paulo Americo Veiga Wolowski.
MILITARES NÃO DIVULGARAM SALÁRIOS
No novo levantamento, com base em todos os servidores
públicos federais em ação fora do país, o embaixador continua com o salário
mais alto.
A remuneração bruta de R$ 26.723,13 é o valor pago à
presidente da República, Dilma Rousseff, que recebe o mesmo salário de um
ministro do STF. O Itamaraty sustenta que seus diplomatas recebem mais do que
ela em razão do pagamento de verbas indenizatórias. O complemento mais comum, e
que eleva os salários dos servidores fora do país, é o fator de correção
cambial, que praticamente dobra as remunerações, conforme o posto onde o
servidor está lotado. Mesmo se considerados só os vencimentos básicos, sem a
correção cambial, 55 servidores públicos federais no exterior recebem mais do
que a presidente da República.
Na PF, há agentes de classe especial recebendo remunerações
que extrapolam o teto. Na Receita Federal, o ex-secretário Jorge Rachid tem
vencimentos básicos acima do teto, conforme a folha de pagamentos de janeiro
deste ano. Rachid é adido tributário e aduaneiro em Washington, nos Estados
Unidos, e teve vencimentos básicos de R$ 27,7 mil. Somada a verba
indenizatória, o salário bruto chegou a R$ 29,9 mil. Já a predominância de servidores
do Itamaraty, no grupo de 445 que recebem acima do teto, é de primeiro, segundo
e terceiro secretários, conselheiros e oficiais de chancelaria.
A constatação sobre os supersalários no Itamaraty só foi
possível a partir da noite da última sexta-feira, quando o órgão divulgou as
remunerações dos servidores no exterior. Esses contracheques foram abertos com
um atraso de oito meses: o governo federal abriu os salários do funcionalismo
federal no fim de junho, em cumprimento à Lei de Acesso à Informação.
Em novembro, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou
que o Itamaraty divulgasse as remunerações pagas aos servidores lotados fora do
país em um mês. A mesma decisão do TCU obrigou o órgão a cortar os salários
acima do teto. O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, apresentou
um recurso contra a decisão do TCU, aceito pelo tribunal, que suspendeu a
decisão anterior. Os únicos salários de servidores no exterior ainda não
divulgados são os de 64 adidos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. O
GLOBO pediu a tabela com suas remunerações. O prazo venceu ontem. A Marinha
pediu mais dez dias de prazo, em razão da "complexidade para obter a
informação".
O Itamaraty alega que verbas indenizatórias não podem ser
contabilizadas como salário. Segundo o órgão, os pagamentos são feitos em dólar
e, por isso, a flutuação da taxa de câmbio deve ser levada em conta. Os
vencimentos pagos no exterior, quando transformados em reais, variam
diariamente, diz o Itamaraty. "Os salários de funcionários públicos no
exterior são adequados ao custo de vida de cada país", diz o Itamaraty