Correio Braziliense - 29/04/2013
Falta de legislação nacional faz com que muitos aprovados
nunca sejam chamados
Concursos para cadastro reserva podem ser meros caça-níqueis
dos realizadores dos processos seletivos, na opinião de especialistas. Desde
2011, foram lançados 45 certames para órgãos federais sem número específico de
vagas disponíveis ou qualquer compromisso de contratação. “Esses são os mais
suspeitos”, avalia Alexandre Crispi, vice-presidente da Associação Nacional de
Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac). “Essa prática é inadmissível. É preciso
estipular o número real de candidatos a serem chamados”, defende.
Algumas instituições costumam convocar mais candidatos do
que o total de vagas efetivas, caso do Ministério Público da União (MPU). Mas
mesmo lá, no último concurso, houve reclamações generalizadas de pessoas que
estavam no cadastro reserva e reivindicavam o direito de serem contratadas para
os postos ocupados por profissionais terceirizados.
A maioria dos concursos para formação de listas tem servido
mais para engordar os bolsos das empresas organizadoras do certame, que avançam
cada vez mais nesse mercado. De acordo com dados da Anpac, o total de bancas
examinadoras saltou de 20, em 2004, para mais de 200, em apenas uma década.
“Essa prática é uma das maiores injustiças que este país comete. O concursando
paga uma taxa de inscrição, estuda, e depois não é chamado”, critica a diretora
executiva da entidade, Maria Thereza Sombra.
O presidente da Vestcon, Ernani Pimentel, também condena
essa prática sem compromisso de contratação. “Não faz sentido fazer o concurso
se não há vaga a oferecer. É um desrespeito ao direito do cidadão”, enfatiza.
A gerente executiva da área de gestão de pessoas do Banco do
Brasil, Ana Cristina Rosa Garcia, entretanto, assegura que a prática é
vantajosa para a instituição. “O cadastro ajuda uma empresa de alta rotatividade.
Nossa movimentação interna, de transferência e de saída de servidores, é muito
grande e diária”, explica ela, que tem de administrar cerca de 117 mil pessoas.
A assessoria de imprensa do BB informa que, na última seleção, feita no ano
passado, 2.558 candidatos foram classificados, dos quais 274 já foram
convocados. “Se eu estipulo o número de vagas, teria de chamar poucos
candidatos e abrir concursos de seis em seis meses”, diz Ana Cristina. Para
ela, esse processo é mais democrático. “Uma pessoa que não ficou tão bem
classificada pode ter esperanças de ser chamada”, diz.
Judiciário
O tema gera polêmica entre os concursandos, que muitas vezes
recorrem ao judiciário para tentar garantir a contratação nas vagas ocupadas
por terceirizados. Na falta de uma regulamentação nacional para os concursos
públicos, os conflitos são decididos pela jurisprudência do Superior Tribunal
de Justiça (STJ). O consultor jurídico Max Kolbe, professor de direito
constitucional da Vestconcursos, orienta que os primeiros colocados nos
certames têm o direito de serem nomeados e devem substituir os não concursados
que exerçam a mesma função prevista em edital.
Hoje, apenas o estado da Paraíba, o município do Rio de
Janeiro e o Distrito Federal possuem legislação voltada para os interesses dos
concursandos no país. A última a entrar em vigor, a Lei Geral dos Concursos
Públicos do DF, proíbe processo seletivo só para o cadastro reserva. O deputado
distrital Israel Batista (PEN) acredita que essa nova lei é um exemplo para o
resto do país. Na avaliação do parlamentar, ainda falta transparência por parte
do setor público. “Não é possível que um órgão não tenha uma estatística de
quantos servidores saem, falecem, ou migram para outros locais”, afirma o
parlamentar. Ele acredita que o meio para acabar com as seleções para formação
de cadastro reserva é obrigar o setor público a se planejar melhor e nomear
todos os aprovados. “Isso impediria os órgãos de abrir mais vagas do que
necessita”, completa.
Novas regras
Duas propostas de regulamentação nacional dos concursos
públicos tramitam no Congresso Nacional: o Projeto de Lei (PLS) 74/2010 e o PLS
369/2008. O primeiro, busca estabelecer regras claras para dar transparência,
isonomia, justiça e segurança jurídica aos concursandos. O segundo, proíbe a realização de processos seletivos exclusivamente para a
preenchimento de cadastro reserva.