Hélio Schwartsman
Folha de S. Paulo
- 27/04/2013
SÃO PAULO - Deu na Folha que 16% dos desembargadores do TJ
do Rio são parentes de alguém no Judiciário. Essa taxa aumenta ainda mais se
considerarmos só os magistrados indicados pelo Ministério Público e pela OAB,
para os quais o jogo de influências tende a ser mais decisivo.
O nepotismo no serviço público é provavelmente um problema
insolúvel, já que tem origem num descompasso entre a nossa programação
biológica original (que nos faz proteger filhos e outros parentes) e o ambiente
moderno em que vivemos (que exige que o poder público contrate servidores com
base apenas no mérito). Ele entra, assim, na mesma categoria de outras
armadilhas evolutivas, como a obesidade (nossos corpos armazenam muito mais
energia na forma de tecido adiposo do que o necessário hoje em dia). E, sempre
que as instituições se opõem à biologia, as primeiras tendem a levar a pior.
Não foi por outro motivo que o comunismo fracassou.
Se quisermos manter o problema ao menos sob controle,
precisamos fazer com que a decisão de quem contratar passe tão longe quanto
possível dos gabinetes dos poderosos. O caminho é profissionalizar a
administração ao máximo e dar preferência a concursos nos quais os examinadores
não conheçam a identidade dos candidatos. Processos muito políticos, como as
indicações por entidades de classe, são difíceis de conciliar com esses
princípios.
De toda maneira, o conceito de armadilha evolutiva ajuda a
desmitificar algumas ilusões recorrentes. Embora as ideologias políticas mais
em voga afirmem o contrário, é impossível uma sociedade ser justa e livre ao
mesmo tempo. Se ela é justa, as pessoas que se esforçarem mais acumularão mais
bens. Se é livre, elas os transmitirão a seus parentes. Mas, neste caso, a sociedade
deixa de ser justa, pois alguns herdarão riquezas pelas quais não trabalharam.
O problema de fundo é que o amor é discriminatório.
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