Ana D’Angelo
Correio Braziliense - 12/05/2013
Advogados da AGU Disputam Bolada
Advogados e procuradores da Advocacia-Geral da União cobram
honorários pelas causas ganhas por eles. Valores chegam a R$ 180 milhões por
ano
Funcionários da carreira querem receber honorários, prática
hoje restrita à iniciativa privada e a alguns órgãos estaduais. Quase 9 mil
servidores dividiriam uma cifra que pode chegar a R$ 180 milhões anuais.
Planalto é contra o benefício
Após tentarem, sem êxito, igualar a remuneração da categoria
aos vencimentos do Ministério Público da União — R$ 24 mil no começo da
carreira —, os servidores da Advocacia-Geral da União (AGU) resolveram agir em
outra frente para aumentar os salários, que variam entre R$ 15 mil e R$ 19 mil.
Advogados, procuradores federais e procuradores da Fazenda Nacional querem
implementar a cobrança de honorários, como na iniciativa privada. A ideia é
receber de 10% a 20% de todas as causas ganhas pela União, uma bolada que varia
entre R$ 150 milhões e R$ 180 milhões por ano.
Essa é a quantia que entra nos cofres públicos a título de
honorários advocatícios pagos pela parte perdedora somente das ações chamadas
de conhecimento, aquelas que tratam de pedido de indenizações e de vantagens
salariais. A soma não inclui as ações de cobrança de tributos. Distribuída a
bolada entre os 8.868 integrantes ativos e inativos da AGU, daria algo em torno
de R$ 1,7 mil a mais por mês para cada um. Isso num primeiro momento, pois a
perspectiva é que esse valor a mais no contracheque aumente com o tempo, devido
ao maior empenho dos advogados e procuradores nas causas.
Por enquanto, o governo federal não pretende abrir mão desse
dinheiro, que engorda as receitas do Executivo e, na semana passada,
desarticulou todo o trabalho de meses da categoria com os parlamentares da
Comissão Especial que analisa o projeto de lei do novo Código de Processo Civil
(CPC). Estava tudo arranjado com o relator, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP),
que incluiria no documento o dispositivo que permite aos membros da AGU
receberem os honorários advocatícios — a parcela de 10% a 20%, já prevista no
CPC atual, devida por quem perde a ação judicial ao patrono da parte contrária.
Porém, o Palácio do Planalto mandou o deputado alterar o
relatório, que foi apresentado à comissão na última quarta-feira sem o
dispositivo. “Na entrega do relatório, não incluí. Mas esse debate não está
concluído”, afirmou Teixeira, sem querer dar mais explicações sobre o recuo.
Ele espera que o novo CPC seja aprovado até junho. O parlamentar disse apenas
que há muita resistência dentro da comissão em atender o pleito dos advogados
públicos federais.
O deputado Alfredo Kaefer (PSDB-PR), também integrante da
comissão, não quer nem ouvir falar disso. Para ele, os honorários não são
devidos aos advogados públicos, como ocorre com os privados, porque a natureza
do trabalho é diferente. “Não concordo de jeito algum. Eles fazem carreira
pública, ganham salário inicial mais alto, estabilidade e uma série de
benefícios que o advogado privado não tem”, disse. Kaefer mencionou a situação
dos defensores públicos, para os quais a Constituição veda expressamente o
recebimento de honorários. “A carreira ficaria sem o mesmo direito e
desmotivada”, afirmou.
Divergências
O presidente da Associação Nacional dos Advogados da União,
Romell de Macedo Carneiro, sustenta que a categoria tem direito aos honorários
como os profissionais privados, conforme prevê a Lei n° 8.906, que é o Estatuto
da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Já a cúpula da AGU não concorda.
Questionada pelo Correio, informou que um parecer emitido pela direção do órgão
em março deste ano “é conclusivo no sentido de que a remuneração prevista na
Lei n° 8.906 é específica do advogado privado”, e que é necessária lei própria
estabelecendo o recebimento dessas verbas. Apesar de um novo grupo de trabalho
interno ter proposto a revisão da interpretação do parecer, a AGU afirmou que a
conclusão foi de que é possível o recebimento dos honorários, desde que
previsto em lei.
Argumento
Um dos argumentos dos advogados públicos federais é de que
os integrantes de boa parte das procuradorias estaduais e de alguns municípios
recebem parte dos honorários das causas vencidas pelo poder público. Isso faz
com que eles tenham salários maiores do que os recebidos na AGU.
A categoria alega ainda que ficarão fora do rateio de
honorários advocatícios que eles reivindicam os decorrentes das ações de
cobrança de impostos, a cereja do bolo, que é uma quantia muito maior do que os
R$ 180 milhões decorrentes dos demais processos. A Procuradoria-Geral da
Fazenda Nacional informou não ter dados precisos sobre número de ações ganhas,
perdidas e respectivos honorários.
A busca pelo recebimento dos honorários pelos integrantes da
AGU é mais recente, porque a categoria sempre brigou por vencimentos idênticos
ao do Ministério Público Federal. O conselheiro da OAB do Distrito Federal
Aldemário Araújo Castro, procurador da Fazenda Nacional, explica que os
advogados públicos e os procuradores da República integravam a mesma carreira
antes da Constituição de 1988. Na criação da AGU na ocasião, para separar as
atribuições do MPF, o acertado era que as remunerações seriam iguais, o que
acabou não acontecendo. Para ele, o direito aos honorários das causas tornaria
a advocacia pública mais eficiente. “Haveria uma motivação a mais para realizar
o trabalho”, afirmou.
“Não concordo de jeito algum. Eles fazem carreira pública,
ganham salário inicial mais alto, estabilidade e uma série de benefícios que o
advogado privado não tem”