João Valadares
Correio Braziliense
- 11/08/2013
Nomeação de funcionário no consulado de Nova York é feita à
margem da legislação e sem a publicação oficial
A caixa-preta do Itamaraty no exterior esconde, além do
número de contratados locais e seus respectivos salários, casos graves de
transgressões de leis e normas internas da pasta para nomeações irregulares de
apadrinhados políticos. O pior: as ilegalidades levam o carimbo oficial do
Ministério das Relações Exteriores (MRE). Documentos internos obtidos pelo
Correio apontam que, no consulado do Brasil em Nova York, por exemplo, o maior
e mais importante posto da rede consular brasileira, o auxiliar administrativo
Dario Vasconcellos Campos, um trabalhador recrutado localmente, virou
vice-cônsul, com direito até a passaporte diplomático para ele e a mulher. O
cargo, de acordo com decretos presidenciais e o regimento interno do Itamaraty,
só pode ser exercido por servidores públicos do quadro do próprio ministério.
Os atos de nomeação, contrariando o princípio da publicidade
na administração pública, são sigilosos. Ao contrário do que manda a lei, não
foram publicados nem no Diário Oficial da União nem no boletim interno da
instituição. A mulher de Dario Campos, a auxiliar administrativa do consulado
Marion Ash Campos, também recebeu o passaporte diplomático. Por lei, entre as
três carreiras que compõem o Serviço Exterior Brasileiro, somente diplomatas e
oficiais de chancelaria fazem jus a esse tipo de passaporte. Nem mesmo os
assistentes de chancelaria têm direito. O casal, que foi agraciado com o
privilégio ilegal, recebe ainda os maiores salários entre os 60 contratados do
consulado.
Conforme a relação de auxiliares locais, expedida em 29 de
julho deste ano, a qual o Correio teve acesso, Dario ganha US$ 6.652 , o que
equivale a R$ 14.768. A remuneração, desrespeitando o que diz artigo o 19, do
Decreto nº 1.570/94, é maior do que recebe um oficial de chancelaria de menor
nível do posto, que poderia ocupar o cargo legalmente. A mulher dele ganha o
segundo maior salário: US$ 5.578.
Normas internas
Para acomodá-lo como vice-cônsul, o Itamaraty rasgou toda a
legislação que trata do assunto e passou por cima de um conjunto de normas
internas. O próprio ministério, em seu Guia de Administração dos Postos, a
bíblia que rege o controle dos postos no exterior, é taxativo: “não será
autorizada a concessão de passaporte diplomático ou oficial para auxiliar
local, nem sua inclusão em lista diplomática ou seu credenciamento como
vice-cônsul”.
Mas, em Nova York, Dario é quem dá as cartas. Recebe
governadores, senadores e outras autoridades brasileiras. Em 11 de janeiro de
2010, o então cônsul-geral, Osmar Chohfi, que já foi secretário-geral do
Itamaraty, o equivalente a vice-ministro, encaminhou comunicado para o MRE
pedindo a prorrogação do título de vice-cônsul para o auxiliar administrativo.
“Tendo em vista que, de acordo com os registros consultados, o título de
vice-cônsul concedido ao senhor Dario Vasconcellos Campos expirará em 22 de
fevereiro próximo, muito agradeceria a Vossa Excelência autorizar a renovação
do referido título pelo prazo de três anos”. Além de autorizar um ato ilegal, o
Ministério das Relações Exteriores prorrogou por três anos, em 12 de janeiro de
2010, a validade dos passaportes diplomáticos do casal.
Chama a atenção que, nos comunicados internos, para não
classificar Dario como contratado local e, dessa forma, escancarar a negociação
ilegal, ele é sempre tratado pelo título de vice-cônsul. Geralmente, os
servidores são chamados pelo cargo de carreira que ocupam na pasta, e os
auxiliares locais pelas funções para que foram contratados.
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