Livia Scocuglia
Consultor Jurídico
- 06/03/2014
A Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados elaborou
nota técnica com parecer contrário a propostas de emendas constitucionais que
tentam instituir o modelo de cargo único na Polícia Federal. Atualmente, a
carreira conta com cinco carreiras: delegados, peritos, agentes, escrivães e
papiloscopistas.
De acordo com o documento, “a simples promoção para outro
cargo, mesmo se criado a partir de outros cargos extintos, esbarra em vedação
constitucional expressa, que não pode ser olvidada, a menos que a regra
constitucional também fosse alterada”.
Ou seja, para mudar de carreira sem prestar concurso é
necessário alterar o próprio artigo 37 da Constituição Federal de 1988. O
dispositivo veda a transposição de cargos, a ascensão funcional e qualquer
outra forma de investidura que não seja por meio de aprovação prévia em
concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a
complexidade do cargo ou emprego público.
Segundo o presidente da Associação Nacional dos Delegados de
Polícia Federal, Marcos Leôncio Ribeiro, não há justificativa no interesse
público para o concurso interno, já que ele fere o princípio da impessoalidade
e isonomia.
Segundo Ribeiro, o concurso público externo é a forma mais
democrática para selecionar as pessoas que queiram entrar no serviço público.
Além disso, a transferência de servidores para outros cargos oupara outras
categorias, sem concurso público é inconstitucional, pois implicam o ingresso
do servidor em cargos diversos daqueles nos quais foi ele legitimamente
adminitido.
De acordo com a nota, a carreira já é única. Os cargos é que
não são. "Entretanto, os cargos possuem atribuições distintas, não
obstante se exigir o mesmo nível de escolaridade. Não é possível, portanto, a
existência de um cargo único, conforme mencionado anteriormente, visto que as
atribuições do cargo de perito, por exemplo, não poderiam ser desempenhadas por
delegado de polícia ou agente de polícia."
A Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados afirmou
que “não seria prudente inovação constitucional tendente a alterar o regime de
promoções de determinada categoria isoladamente, em detrimento de todas as
outras”. A consequência imediata da existência de apenas um cargo na Polícia
Federal seria o fim da hierarquia remuneratória. “Essa circunstância provocaria
grande impacto na verba orçamentária destinada ao pagamento de pessoal, com
repercussões em relação aos inativos e pensionistas”, esclarece o documento.
Esse tipo de tentativa de burlar as normas constitucionais
já é conhecido e rechaçado pela jurisprudência. Para os doutrinadores, se a
transformação implicar em alteração da remuneração e das atribuições do cargo,
configura novo provimento, violando o instituto do concurso público. Dessa
forma, segundo a assessoria de imprensa da ADPF, a transformação dos cargos
somente é constitucional quando os postos antigos e os novos possuem idêntico
nível de escolaridade, de atribuições e de remuneração. O Supremo Tribunal
Federal também tem pacificado que a transformação de cargos públicos não pode
gerar aumento de remuneração e pressupõe a identidade legal de atribuições
funcionais entre os componentes da carreira originária a ser transformada (ADI
3.930/RO e ADI 2.867/ES).
Além de tentar burlar a regra constitucional de ingresso por
meio de concurso público, para a Consultoria Legislativa da Câmara dos
Deputados, fica evidente a tentativa de mesclar interesses diversos, colocando
num mesmo pacote o debate da carreira única, a desmilitarização, o plano de
cargos e salários e a progressão vertical e horizontal. “Ora, desmilitarização
só se aplica às carreiras militares, plano de cargos e salários pressupõe mais
de um cargo, além da hierarquia de cargos, assim como o próprio instituto da
progressão”, rechaça o documento.
Clique aqui para ler a nota técnica.
Livia Scocuglia é repórter da revista Consultor Jurídico.