BSPF - 04/04/2014
A recente crise entre o governo e o PMDB tem a ver, era
última análise, com espaço de poder e cobiça por empregos públicos
Não desvalorizo a política partidária, mas creio que a
demanda por melhor tratamento na indicação de ministros reflete o interesse do
PMDB por nomeações para cargos que carreiam votos e financiamento de campanhas.
Na área federal, mais de 20 mil deles são preenchidos por indicação política.
O primeiro serviço público profissional surgiu na China. A
dinastia Qin (221-207 a.C.) selecionava funcionários à base de rigorosos
concursos públicos, que depois serviam também para promoções. A dinastia Song
(960-1279) proibiu altos funcionários de se relacionarem com parentes; membros
da família real não podiam assumir cargos públicos. A dinastia Ming (1368-1644)
estabeleceu a rotatividade de cargos a cada três anos. A ascensão da China
muito deveu a esse profissionalismo, que viria a ser abolido em 1905, na
dinastia Qing, em um dos momentos finais do longo declínio do país.
No Ocidente, as ideias de profissionalização apareceram na
Revolução Francesa (1789), mas o paradigma do serviço público moderno nasceu na
Inglaterra vitoriana. Escândalos de incompetência, fisiologismo e corrupção
deram origem à comissão Northcote-Trevelyan (1853), cujo relatório foi a base
das mudanças. Entre as distorções identificadas estava a presença de
analfabetos em empregos públicos. A comissão recomendou a criação do serviço
público profissional, politicamente neutro e escolhido por mérito.
Outras propostas foram adotadas ao longo do tempo, incluindo o estabelecimento, em 1855, de um órgão independente, ainda existente, para supervisionar a seleção de funcionários. Os servidores ficaram impedidos de concorrer a cargos eletivos. Dirigentes passaram a ser nomeados com o auxílio de consultorias independentes (headhunters). Hoje, pouco mais de 100 cargos dependem de indicação política, incluídos os ministros. A recente designação do novo presidente do Banco da Inglaterra (o banco central) foi precedida da publicação de edital para atrair candidatos. O escolhido foi um canadense.
Outras propostas foram adotadas ao longo do tempo, incluindo o estabelecimento, em 1855, de um órgão independente, ainda existente, para supervisionar a seleção de funcionários. Os servidores ficaram impedidos de concorrer a cargos eletivos. Dirigentes passaram a ser nomeados com o auxílio de consultorias independentes (headhunters). Hoje, pouco mais de 100 cargos dependem de indicação política, incluídos os ministros. A recente designação do novo presidente do Banco da Inglaterra (o banco central) foi precedida da publicação de edital para atrair candidatos. O escolhido foi um canadense.
Nossas origens são outras. Herdamos tradições de Portugal
patrimonialista, cujo serviço público era composto de fidalgos. Como disse
Raymundo Faoro (1925-2003), comerciantes buscavam ser funcionários para se
tornar nobres e obter benefícios pessoais. Aqui não foi diferente, segundo João
Francisco Lisboa (1812-1863), para quem “indivíduos há que abrem mão de suas
profissões, deixam ao amparo suas fazendas, desleixam o seu comércio, e se
plantam na capital anos inteiros à espera de um emprego público”.
Para Joaquim Nabuco (1849-1910), “o funcionalismo será a profissão nobre e a vocação de todos. Tomem-se, ao acaso, vinte ou trinta brasileiros em qualquer lugar onde se reúna a nossa sociedade mais culta: todos eles ou foram ou são. ou hão de ser, empregados públicos; se não eles, seus filhos”.
Para Joaquim Nabuco (1849-1910), “o funcionalismo será a profissão nobre e a vocação de todos. Tomem-se, ao acaso, vinte ou trinta brasileiros em qualquer lugar onde se reúna a nossa sociedade mais culta: todos eles ou foram ou são. ou hão de ser, empregados públicos; se não eles, seus filhos”.
No livro “Caráter e Liderança” (Mameluco, 2013), Luiz Felipe
D’Ávila informa que dom Pedro II (1825-1891) defendia “a institucionalização da
meritocracia no serviço público”, mas o primeiro esforço de modernização
esperou até 1938, quando se criou o Departamento Administrativo do Serviço
Público (Dasp) com a função de melhorar a máquina pública, assessorar o
presidente da República e elaborar a proposta orçamentária. Muito se evoluiu
desde então, mas o vasto número de cargos preenchidos por indicação política só
aumentou.
Já é hora de profissionalizar o serviço público, elegendo o
mérito como critério único da escolha dos funcionários. Dirigentes de órgãos e
entidades públicos, inclusive empresas estatais, deveriam ser nomeados com base
em métodos competitivos. A melhoria da eficiência dos serviços públicos, a
redução do potencial de corrupção e a moralização dos costumes seriam as
conseqüências mais relevantes dessa verdadeira revolução, que eqüivaleria a uma
ampla reforma política.
Tudo isso contribuiria para a eficácia das políticas de
governo, e estas reforçariam a estabilidade e a legitimidade da democracia
brasileira. Espera-se surgir um candidato presidencial que empunhe essa
bandeira.
Mailson Ferreira da Nóbrega
Fonte: Veja