Valor Econômico
- 06/07/2015
A aprovação pelo Senado de projeto de lei que concede
reajuste para os servidores do Judiciário preocupa não apenas pelo impacto
direto que terá sobre as contas públicas ao longo dos próximos anos.
Investidores seguramente vão exigir um prêmio de risco ainda mais alto na
rolagem da dívida pública, diante de um governo fraco para mobilizar a sua base
parlamentar e um Congresso que exibe baixíssimo compromisso com a
responsabilidade fiscal.
Na última quarta-feira, o Senado aprovou o Projeto de Lei
28/2015, que autoriza um reajuste de 59% a 78% nos vencimentos dos servidores
do Judiciário. A proposta original é de iniciativa do presidente do Superior
Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, e foi enviado à Câmara
dos Deputados no ano passado.
A presidente Dilma Rousseff, que na época tinha uma base
política aliada mais sólida, conseguiu impedir que o projeto fosse adiante.
Neste ano, o quadro mudou dramaticamente, e o dispositivo foi aprovado no
Senado por 62 votos a zero, com o apoio até mesmo dos senadores do PT.
Segundo as estimativas do governo, o projeto irá provocar
despesa de R$ 25 bilhões nos próximos quatro anos, dos quais US$ 1,5 bilhão
neste ano, dinheiro que não tem previsão no Orçamento. O gasto saltará para R$
5,3 bilhões em 2016 e, e nos dois anos seguintes, subiria respectivamente para
R$ 8,4 bilhões e R$ 10,4 bilhões.
O impacto direto nas despesas do governo tenderia a ser
ainda maior, já que o Ministério do Planejamento espera um efeito cascata, com
as categorias do Executivo e Legislativo exigindo percentuais semelhantes de
aumento. Para pagar essa despesa adicional, a alternativa provável são novas
rodadas de aumento de impostos, já que as despesas públicas têm rigidez
bastante conhecida.
Os dados apresentados pelo Ministério do Planejamento
mostram que hoje existe uma diferença salarial de 60% entre os servidores do
Executivo e do Judiciário, que seria ampliada para 170%, caso o projeto seja
executado como aprovado.
Entre 2005 e 2008, todas a carreiras do Judiciário tiveram
reajustes perto de 60%, mas seus vencimentos não tiveram ganhos nominais nos
quatro anos seguintes. Entre 2012 e 2015, foi concedido um reajuste de 15,8%,
pago em três parcelas. Os cálculos do STF são de que os servidores têm uma
defasagem salarial acumulada de 49,62%.
Agora, a proposta do governo, que vale para todo o
Judiciário e para os funcionários dos demais poderes, é conceder um reajuste de
5,5% em 2016, de 5% em 2017, de 4,8% em 2018 e de 4,5% em 2019 – ou seja, a
inflação projetada pelos analistas do mercado financeiro para o período. O
objetivo das autoridades da área econômica é estabilizar a despesa em 4,1% do
Produto Interno Bruto (PIB) nesses quatro anos.
O poder de barganha do governo talvez fosse maior se a
inflação estivesse sobre controle. A alta de preços ao consumidor acumulada
desde 2006 é de 73,2% e, com o índice de preços correndo em 9% em 2015, não
será nada fácil convencer os servidores a ignorar a inflação passada e mirar o
futuro.
Mas, na essência, os servidores públicos não estariam
submetidos a dieta muito diferente da imposta pelo Banco Central aos
trabalhadores privados, com uma recessão que procura forçar os reajustes reais
de salários a se alinharem com os ganhos de produtividade da economia.
Felizmente, o reajuste tal como aprovado não deve prosperar
porque fere pelo menos dois preceitos constitucionais. O artigo 169 da
Constituição Federal veda a concessão de qualquer aumento sem prévia dotação
orçamentária e que não tiver autorização específica na Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO). O projeto de lei não atende a nenhuma dessas exigências.
O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, já indicou que o
governo pretende vetar o projeto. Mas esse não será o fim do problema, pois o
governo Dilma terá que negociar uma alternativa com o presidente do STF e com o
mesmo Congresso que aprovou o reajuste. O mínimo que se espera é que, nessa
negociação, quem propuser o aumento, que indique como pagar.