BSPF - 03/12/2016
Agora que o governo e o Congresso estão mexendo em alguns
pontos importantes da legislação seria conveniente e oportuno que destravassem
(ou desengavetassem) propostas que visam à regulamentação de greve no serviço
público. Esse dispositivo da Constituição de 1988 ainda não foi regulamentado,
fato que causa transtornos para a população devido ao excesso de paralisações
em setores essenciais.
Um estudioso do assunto já disse que “parece evidente que
qualquer trabalhador deva ter o direito de reivindicação assegurado pela sociedade
e que, no impasse da negociação, também deva a ele ser garantido o exercício do
direito de greve”. No caso do servidor público esse exercício de paralisação,
como última forma de pressão, por vezes esbarra no interesse coletivo social,
no direito de terceiro, porque não dizer no senso da coletividade que enxerga
naquela função uma atividade essencial à sociedade.
O número exacerbado de movimentos de greve de servidores –
federais, estaduais e municipais – nesse momento de crise que o Brasil
atravessa, merece reflexão mais atenta na busca pela solução desse tipo de
conflito coletivo. Afinal, porque as escolas, o Judiciário, os hospitais,
autarquias federais, o INSS, o serviço de correio e, por vezes, a polícia,
param em protesto por causas diversas.
Ultimamente o STF tem se pronunciado para resolver
controvérsias e solucionar impasses pontuais, mas o correto e que houvesse
regulamentação legal sobre o tema. A última intervenção do Supremo foi para
declarar que o poder público deve descontar os dias parados por greve,
ressalvando que o desconto não poderá ser feito caso o movimento grevista tenha
sido motivado por conduta ilícita de o próprio Poder Público, e também deixou
em aberto a possibilidade de acordo de reposição dos dias parados.
No julgamento no STF o ministro Gilmar Mendes citou as
greves praticamente anuais nas universidades públicas que duram meses a fio sem
que haja desconto. “É razoável a greve subsidiada? Alguém é capaz de dizer que
isso é licito? Há greves no mundo todo e envolvem a suspensão do contrato de
trabalho de imediato, tanto é que são constituídos fundos de greve”, registrou
o ministro em seu voto.
Para ter uma ideia mais clara, não faz muito tempo os
motoristas e cobradores de ônibus de Curitiba (que prestam serviço público, embora
pertencentes à iniciativa privada) fizeram indicativo de greve ‘por suposição’.
Entenderam que as empresas não iriam pagar na data prevista o adiantamento
salarial, chamado de vale, e o sindicato decretou greve, o que seria normal se
houvesse um direito dos trabalhadores ferido, o que não era o caso, era mera
presunção.
No serviço público isso é também comum. Basta recordar o
caso dos professores estaduais do Paraná. Anualmente fazem paralisação para
“celebrar” um evento ocorrido há mais de dez anos, quando o governo usou a
cavalaria para dispersar os piquetes que ameaçavam invadir o Palácio Iguaçu.
Qual o motivo dessa greve anual? Nenhum. A lembrança do acontecido poderia – e
pode – ser marcado com manifestação, não com greve.
Na maioria dos movimentos grevistas os sindicatos apresentam
ampla pauta para no final negociar o mínimo (isso acontece também no âmbito
particular), no final defendem apenas o não desconto dos dias parados. Foi isso
que o STF determinou, decidindo que os dias de greve devem ser descontados dos
salários dos grevistas. A greve no serviço público está banalizada e gera
graves problemas aos cidadãos.
Não se trata de negar ou restringir o direito de greve dos
servidores públicos, constitucionalmente assegurado, mas sim a normatização
para que não mais haja distorções, abusos ou banalização. Penso que o Congresso
deve tratar seriamente dessa questão, sem preocupação em agradar ou desagradar
setores corporativos. Afinal, o direito do cidadão brasileiro está acima de
tudo – direito esse que vem sendo seguidamente desrespeitado.
Luiz Carlos Borges da Silveira é empresário, médico e
professor. Foi Ministro da Saúde e Deputado Federal
Fonte: Gazeta Digital