Jornal Extra
- 07/12/2016
Brasília e São Paulo - A reforma da Previdência altera de
forma significativa o regime de aposentadoria do setor público, que passará a
ter as mesmas regras do setor privado. Serão afetados pelas mudanças os
servidores da União, dos estados e dos municípios. Os governadores terão de
fazer a sua parte, aprovando leis que tratam do tema nas assembleias estaduais.
Mas, de modo geral, a União dará uma contrapartida significativa ao tratar, na
proposta de emenda constitucional (PEC), das aposentadorias especiais: as de
professores, policiais civis, policiais militares e bombeiros. As despesas com
benefícios dessas categorias exercem forte pressão nas contas dos estados e
municípios, que arcam com gastos com educação e segurança.
Em projeto à parte, o governo federal deverá elevar a
alíquota de contribuição dos servidores da União — que serve de piso para
estados e municípios — de 11% para 14%. A medida dará maior respaldo aos
governadores nas tentativas de aprovar leis na assembleias propondo o aumento
da contribuição dos seus servidores para ajudar a equilibrar os regimes
próprios de aposentadorias.
A inclusão dos estados na reforma, tratando de todos os
Poderes, foi uma tentativa do governo de tentar resolver o principal problemas
das finanças dos governadores: o desequilíbrio entre suas receitas e as
despesas com benefícios. Segundo os técnicos da área econômica, existe hoje uma
situação perversa que limita a realização de investimentos e a aplicação de
recursos em áreas importantes, como segurança pública e transportes.
Em vários estados, inclusive no Rio de Janeiro, o Executivo
assumiu o pagamento de inativos e pensionistas de todos os Poderes. Isso reduz
os recursos livres dos governadores. No Rio, por exemplo, as despesas com
inativos e pensionistas de todo os Poderes (Executivo, Legislativo, Judiciário
e Ministério Público) chegou a R$ 13,345 bilhões em 2015. Desse total, R$ 2,24
bilhões (16%) corresponderam aos órgãos autônomos.
FOLHA PESA NOS ESTADOS
O peso da folha de pessoal é um dos principais dos estados.
Muitos deles chegaram a atrasar ou parcelas salários, sobretudo no ano passado.
No Rio de Janeiro, por exemplo, os gastos com pessoal representaram, no segundo
quadrimestre, 57,93% da receita corrente líquida (RCL), acima do limite
prudencial permitido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Só os inativos
representam quase metade desse total.
Na tentativa de resolver o problema, vários governadores
tentaram enxugar a folha com desligamento de comissionados e planos de demissão
voluntária nas estatais estaduais. Para muitos governadores, no entanto, a
medida foi insuficiente. Agora, eles discutem com a União um plano de ajuste
fiscal que inclui um teto para o gasto estadual e o congelamento de novos
concursos e reajustes. Os governadores, no entanto, pressionam para que a
Previdência de inativos seja retirada de um possível teto de gastos. Isso
porque a conta de servidores aposentados cresce de forma desproporcional, e os
estados temem não conseguir cumprir o limite de despesas.
Os militares das Forças Armadas entraram e saíram da PEC
quando o texto estava em elaboração diversas vezes. A inclusão era defendida
pela equipe da Fazenda e pelo próprio presidente Michel Temer, sob o argumento
de que todos são iguais perante à lei. Mas, depois da reação dos comandantes
militares, com apoio do ministro da Defesa, Raul Jungman, o presidente voltou
atrás. A promessa agora é enfrentar o déficit do regime previdenciário das
Forças, em projeto à parte.
— A exceção são as Forças Armadas. Vamos enviar um projeto
de lei, respeitando as suas excentricidades — afirmou o secretário de
Previdência, Marcelo Caetano.
De acordo com fontes envolvidas nas discussões, já é
consenso de que a alíquota paga pelos militares de 7,5% não é suficiente e terá
de subir para se igualar à dos demais servidores. O tempo na ativa para pedir
reserva também deverá aumentar, de 30 para 35 anos. Outra medida seria acabar
com a aposentadoria compulsória para permitir que os militares em idade mais
avançada possam continuar na ativa, recebendo um bônus.
FIM DA PARIDADE NOS REAJUSTES
A equipe econômica, no entanto, tem planos mais audaciosos,
como acabar com a paridade de reajustes concedidos aos ativos, com o provento
integral e com a pensão vitalícia das filhas (para quem optou por manter o
auxílio a partir de 2001). Os militares, por sua vez, alegam que perderam
direitos na ocasião e que são uma categoria diferenciada, pois ficam à
disposição da União, sem receber hora extra e sem direito de greve. Entre
outros argumentos, eles citaram os salários defasados.
A reforma da Previdência foi marcada por idas e vindas no
governo. Foi prometida para agosto, depois adiada para setembro.
Posteriormente, o prazo passou para depois do primeiro turno das eleições
municipais, depois para o segundo turno e, finalmente, para depois da aprovação
da PEC que cria um teto para o gasto público. Agora, enviada em meio à crise
política, a PEC gera dúvidas sobre a capacidade de o governo aprovar as
mudanças nas regras da aposentadoria até o início do segundo semestre de 2017.
Se ficar para depois, a tramitação ficará complicada, porque a avaliação é que
o calendário das eleições de 2018 vai se antecipar para o ano que vem.
O atraso na formatação da proposta da reforma da Previdência
e a divulgação do texto final foram alguns dos motivos que prejudicaram a
negociação ou, pelo menos, uma discussão mais profunda do governo com as
centrais sindicais.
Para a Confederação dos Servidores Públicos do Brasil
(CSPB), o governo queimou etapas ao apresentar o projeto de reforma da
Previdência antes de concluir as discussões com as centrais sindicais. Por
isso, a entidade se opõe ao pacote.
— O que o governo está colocando é simplesmente um absurdo,
apresentar uma proposta sem discussão — afirmou Lineu Mazano, secretário-geral
da CSPB, que é filiada à Nova Central Sindical (NCS). — As centrais sindicais
apresentaram um conjunto de medidas à comissão criada pelo governo para
discutir o tema, e nada foi acatado. Não esperávamos que a proposta fosse
apresentada desse jeito. É claro que vamos nos opor.
A CSPB ainda está analisando os detalhes do projeto da
Fazenda, mas Mazano destacou como inadmissível, por exemplo, a fixação da mesma
idade mínima, de 65 anos, para homens e mulheres.
— É absurdo — afirmou.
(Geralda Doca, João Sorima Neto, Ana Paula Ribeiro - O Globo)