BSPF - 02/02/2017
Em julho de 2016, antes de enviar ao Congresso um projeto
para criar o “bônus de eficiência” para auditores fiscais, o governo pediu
pareceres técnicos dos órgãos de consultoria jurídica do Ministério do
Planejamento. E ouviu que o projeto continha uma ilegalidade que está até hoje
na medida provisória que impôs o pagamento do bônus e pode inviabilizá-lo: o
benefício tem caráter de renúncia fiscal, mas não foi feita a previsão
orçamentária, violando a Lei de Responsabilidade Fiscal.
De acordo com nota técnica da Secretaria de Orçamento
Federal (SOF), um órgão do Planejamento, o governo deveria ter apresentado,
junto ao projeto, uma previsão do que deixaria de arrecadar em decorrência dos
artigos que impõem a renúncia fiscal. Como não apresentou, o projeto viola o
artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que obriga qualquer concessão de
benefício ou renúncia tributária que resulte em renúncia de receita a ser “ser
acompanhada de uma estimativa do impacto orçamentário”.
O bônus entrou em vigor em dezembro de 2016, por meio da
Medida Provisória 765/2016. Ela estabelece que o dinheiro arrecadado com a
aplicação das multas tributárias farão parte de um fundo destinado a pagar o
bônus, devido a cada um de acordo com a produtividade.
Antes disso, em julho, o governo havia enviado o mesmo texto
transformado na MP à Câmara, mas como projeto de lei. Tanto a MP quanto o
projeto contêm a ilegalidade apontada pelos órgãos técnicos do Planejamento. No
projeto, a ilegalidade vem passando batida pelos deputados até agora. Houve
cinco votos sobre o projeto na Comissão de Constituição e Justiça, nenhum deles
fala da renúncia fiscal que veio com o bônus.
O problema está nos artigos 13 e 23 da medida provisória —
um diz respeito ao bônus para auditores fiscais, o outro, para os auditores
fiscais do Trabalho. Eles foram incluídos para explicar que o bônus não fará
parte da remuneração nem servirá de base de cálculo para gratificações,
adicionais e “não constituirá base de cálculo de contribuição previdenciária”.
Portanto, o governo estabeleceu que a Previdência Social não vai arrecadar nada
com o bônus, ao mesmo tempo em que a Fazenda vai abrir mão de 100% do dinheiro
das multas.
A nota da SOF foi assinada no dia 14 de julho de 2016. No
dia seguinte, o parecer da Consultoria Jurídica do Planejamento, feito por um
advogado da União, concordou com a SOF. E justamente por isso recomendou que
fosse ouvido o Ministério da Fazenda, que, desde maio de 2016, acumula as
competências da Previdência.
Só que a Fazenda não foi ouvida, pelo menos não formalmente.
E uma semana depois, o texto do projeto foi enviado à Câmara, conforme o
combinado pelo governo Dilma com os auditores fiscais, sem as correções
sugeridas pelos pareceres técnico e jurídico.
Ao longo da tramitação, os deputados que discutiram o texto
ficaram preocupados com a possibilidade de o projeto criar privilégios para as
carreiras de auditor fiscal, analista tributário e seus equivalentes do
Ministério do Trabalho. Até porque a intenção do projeto é reestruturar as
carreiras e valorizar os quadros.
Mas a saída encontrada pelos parlamentares foi estender os
benefícios do texto aos ocupantes de cargos administrativos lotados na Receita
e no Ministério da Fazenda, os chamados PecFaz, que dizem ter as mesmas
atribuições dos auditores. Isso desagradou os auditores, que entraram em greve
em outubro.
Dois meses depois, o governo Temer editou a MP 765/2016,
encerrando a greve. Desde então, o bônus de eficiência já foi duramente
criticado pela comunidade jurídica e agora ameaça travar os julgados do
Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Fazenda (Carf), já que os
conselheiros auditores também receberão o bônus.
Por Pedro Canário
Fonte: Consultor Jurídico