Consultor Jurídico
- 04/02/2017
O Sindifisco Nacional percebeu em janeiro uma mobilização de
setores do Direito contrários ao bônus de eficiência e produtividade dos
auditores fiscais, regulamentado na Medida Provisória 765/16, publicada em 29
de dezembro passado. Apresentam-no como fator estimulador de prejuízo ao
contribuinte. Uma posição equivocada, assentada em “achologia”, desinformação.
Os críticos se submetem a um exercício de fértil imaginação: fiscalizações
serão desnecessariamente mais rigorosas por embutirem o caráter argentário em
favor do próprio fiscal. Premissa que não resiste a uma análise minimamente
isenta – desde que, claro, queiramos discutir o assunto honesta e claramente.
Não é, lamentavelmente, o que se tem visto. Esses mesmos
setores do Direito têm buscado induzir seus pares e a opinião pública.
Portanto, é necessário restabelecer o equilíbrio usando a verdade como
contraponto.
O Sindifisco Nacional é o primeiro a reconhecer que o
cidadão-eleitor paga muito tributo. Há anos diz que a carga brasileira é
regressiva, que pesa sobre quem ganha menos e alivia as costas dos mais bem
remunerados. No começo de janeiro, divulgou estudo que aponta defasagem de
83,12% na tabela do Imposto de Renda de Pessoa Física, buraco que se aprofunda
desde 1996. E que se nada for feito, tangenciará os 100% em 2020.
Tivessem os auditores interesse em espoliar o contribuinte,
físico ou jurídico, melhor seria ficarem calados. Afinal, por que abrir os
olhos da sociedade se a categoria estaria mais preocupada com o próprio bolso
que na defesa do interesse comum? Só aqui se vê que não faz sentido a acusação
de uma atuação exagerada para o recebimento de um benefício.
Primeiramente, não há qualquer relação direta entre o
lançamento tributário feito pelo auditor e o bônus recebido por ele. O
benefício está vinculado às metas estabelecidas pela Receita Federal (RFB) para
o ano. Qualquer empresa ou organismo que se pretenda eficiente estipula
objetivos a alcançar. De nada adianta o auditor procurar cabelo em ovo: seu
bônus não será maior que o dos demais colegas, pois está condicionado ao
conjunto e não à atuação individual.
É preciso entender que não existe a menor possibilidade de o
auditor realizar, por conta própria, uma fiscalização (e lançar o auto de
infração dela decorrente) sem que a programação tenha sido feita previamente
pela RFB. Caso atue de forma arbitrária, será responsabilizado
administrativamente e ainda pode responder criminalmente por “excesso de
exação” (CP, artigo 316, parágrafos 1 e 2, que resguarda o contribuinte da
cobrança além do efetivamente devido).
Também não basta lançar a multa para receber o bônus. O auto
infracional tem que ser pago pelo contribuinte, algo que quase sempre é
contestado pela via administrativa (nas delegacias de Recursos e Julgamentos e
no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – Carf) ou judicial. Noventa por
cento dos lançamentos percorrem esse trajeto. Representa dizer que a média de
tempo para a liquidação de um contencioso tributário é, atualmente, de mais de
dez anos.
Quem ataca o bônus não sabe – ou não se lembra, ou faz
questão de não se lembrar – que remunerações semelhantes existem em outros
países. “Ah, devem ser republiquetas!”, se anteciparão os críticos. Qual o quê!
Estados Unidos, Austrália, Cingapura, França, Portugal e Chile são alguns
deles. Uma ampla relação consta de estudo que o Sindifisco Nacional
disponibiliza em seu site a todos os interessados.
Ou seja, o bônus não é uma jabuticaba. E nem está restrito
aos auditores. Os advogados da União receberão um “honorário de sucumbência”,
que nada mais é que um “bônus de eficiência”. Aliás, também os procuradores da
Fazenda Nacional, os procuradores federais e os procuradores do Banco Central.
Imaginem se essas categorias extrapolassem seus limites de atuação. Mas, sobre
essa desconfiança, não se leu palavra na imprensa.
Dias atrás, carta aberta do Centro de Estudos das Sociedades
de Advogados (Cesa) manifestou preocupação em relação aos julgamentos no Carf,
cujos resultados poderiam ser ligados à percepção do bônus. Um texto
lamentavelmente desinformado. Contra ele não apenas o Sindifisco Nacional se
manifestou, mas sobretudo o próprio Conselho do Ministério da Fazenda,
rechaçando com veemência tudo sugerido no documento dos advogados.
O Conselho Federal da OAB tem a intenção de recorrer ao
Supremo Tribunal Federal (STF) contestando o bônus, por meio de uma Ação Direta
de Inconstitucionalidade (Adin). Entretanto, tal indignação parece seletiva e
mostramos a razão: no governo Eduardo Campos, em Pernambuco, foi criado o
Tribunal Administrativo de Tributos Estaduais (Tate), que revê as multas
aplicadas pelos auditores da Receita estadual. É privativo de bacharéis de
Direito (Lei 15.683, de 16/12/2015, segundo o Diário Oficial do Estado). Mas
isso não quer dizer que a favor do erário pernambucano. Em relação aos JATTEs,
é importante ressaltar que recebem bônus de produtividade como os auditores
estaduais.
Então: 1) uma instância recursal de multas aplicadas pela
Receita estadual; 2) composta apenas de advogados; 3) recebedores de bônus de
produtividade, como os auditores estaduais... E nem por isso são suspeitos de
agirem deliberadamente, com base na correlação produção favorável ao Estado =
aumento no recebimento de vantagens. Nós, auditores da RFB, estamos certos do
bom propósito dos JATTEs.
Desde o dia 10 passado, o site do Sindifisco Nacional
disponibilizou página na qual tira todas as dúvidas sobre o bônus. De fácil
acesso, liberado e público, é outra contribuição dos auditores fiscais para
esse debate.
Jamais nos furtaremos a discutir o que quer que seja, por mais
incômodo que pareça aos auditores fiscais. Na atual quadra deste País,
precisamos discutir os assuntos com transparência, e não turvando a visão para
se conduzir a uma conclusão equivocada.
A percepção que o Sindifisco Nacional tem hoje é que existem
muitos interessados em trazer tal discussão porque são inimigos figadais da
fiscalização dura, porém justa. Para esses, uma RFB anêmica é o verdadeiro
bônus.
Por Cláudio Damasceno
Cláudio Damasceno é auditor fiscal e presidente do Sindicato
Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional)