Correio Braziliense
- 08/03/2017
Entidades de servidores criticam a proposta de corte de
funções de concursados para a criação de cargos comissionados na Câmara
A possibilidade de multiplicação dos Cargos de Natureza
Especial (CNEs) na Câmara, aqueles de livre indicação por parlamentares, tem
revoltado servidores concursados. A Pública Central do Servidor, o Sindicato
dos Servidores do Poder Legislativo Federal e do Tribunal de Contas da União
(Sindilegis), com o apoio da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal
(OAB-DF) e de mais de 200 entidades públicas e privadas de trabalhadores,
divulgarão um manifesto, até o fim desta semana, para pedir um basta ao excesso
de cargos comissionados.
O assunto veio à tona diante da intenção do presidente da
Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de transformar mais de 100 funções comissionadas
(FCs) — ocupadas por concursados — em, aproximadamente, o dobro de cargos sem
concurso. De acordo com informações de bastidores na Câmara, a ideia vem sendo
debatida entre os líderes desde a campanha do deputado à presidência no início
do ano. O Correio, em 12 de fevereiro, antecipou a estratégia na coluna
Brasília-DF. A mudança, que pode ser feita por um simples ato da Mesa Diretora
ou uma resolução, serviria para acomodar aliados e apadrinhados políticos em
posições estratégicas.
“Será um manifesto de basta e de repúdio ao nepotismo e ao
aparelhamento ideológico do Estado”, contou Nilton Paixão, presidente da
Pública. A intenção, disse, é fazer com que essa manifestação sirva de alerta a
outros políticos nos três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e nas
três esferas (estadual, municipal e federal) de que a sociedade condena esse
comportamento. “No momento em que os brasileiros querem que as instituições
funcionem mais e clamam pela redução do aparelhamento ideológico partidário do
Estado, essa medida da Mesa Diretora da Câmara é imprópria e ofende todos que
foram às ruas desde 2013”, acrescentou.
Paixão admite que é preciso aumentar a produtividade do
servidor público e que ele precisa ser permanentemente qualificado, mas não vê
na ação da Câmara essa intenção. “É clara a intenção de usar os cargos para
fins eleitorais, sem nenhum critério. Uma postura no mínimo impensada e
contraditória. Se essas contratações acontecerem, vamos fazer protesto e entrar
com uma ação popular”, garantiu. Para Alex Canuto, presidente da Associação
Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental
(Anesp), “não existe na Câmara sequer espaço para mais 300 chefes”. “Se temos
carência de servidores, a única saída dentro da lei é fazer concurso público.
Se o próprio governo que ele (Maia) apoia afirma que vai estancar os concursos
por conta do ajuste fiscal, como ele vai expandir gastos com comissionados?”,
questionou.
Na tarde da última segunda-feira, o diretor-geral da Câmara,
Lucio Henrique Xavier Lopes, representantes do Sindilegis e parte dos
funcionários tiveram uma reunião na qual a diretoria explicou que não há planos
de substituição das funções. Segundo um servidor presente ao encontro, foi dito
que um estudo está sendo elaborado para uma reorganização dos cargos. “É uma
desvalorização total da nossa carreira. Uma clara intenção de se criar um
cabide de empregos. Vamos retroceder às velhas práticas de antes de 1988,
quando se usava o poder para colocar protegidos, amantes, filhos ilegítimos”,
comentou.
Readaptação
De acordo com o primeiro-secretário da Câmara, deputado
Fernando Giacobo (PR-PR), não existe a intenção de se criar cargos. Ele explica
que houve um pedido do presidente Rodrigo Maia ao Departamento de Recursos
Humanos e Pessoal da Casa para que fosse feito um levantamento dos concursados
que acumulavam função comissionada e descobriu-se que mais da metade deles
estão nesta situação, o que rende a eles um acréscimo entre R$ 3,5 mil e R$ 9,4
mil nos salários. Giacobo afirma que o estudo será apresentado até o fim desta
semana e serão corrigidas as irregularidades encontradas.
O parlamentar cita alguns exemplos, como diretorias, em que
o servidor é o próprio chefe ou de pessoas ainda em estágio probatório que
acumulam função. Além disso, foram identificados de 40 a 50 cargos de confiança
em áreas administrativas. “Tem coisas que não podemos conceber. A intenção é
exatamente contrária. A reorganização dos trabalhos vai economizar recursos da
Casa. Vamos mudar a estrutura sem criar CNEs. Podemos extinguir FCs? Sim, mas
isso será feito com planejamento e organização”, comentou. Segundo Giacobo, a
Câmara economizará mais de R$ 500 milhões até o fim do ano.
(Vera Batista , Natália Lambert)