Blog do Vicente
- 30/05/2017
O Tribunal de Contas da União (TCU) tem como principal
missão manter a moralidade no serviço público. O que o órgão diz tem tanto peso
que pode derrubar um presidente da República. Isso ficou claro no impeachment
de Dilma Rousseff, acusada de desrespeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal
(LRF) ao maquiar as contas do governo, manobras que ficaram conhecidas como
pedaladas fiscais.
Pois o mesmo TCU está trabalhando pesado para instituir uma
farra de salários que custará caro ao país. O Tribunal preparou um anteprojeto
de lei que transforma técnicos de nível médio em auditores externos. Se esse
projeto for aprovado, a porteira estará aberta para que todos os órgãos
públicos federais façam o mesmo. A conta, como se sabe, cairá no colo dos
contribuintes.
Pelo anteprojeto, que tem como relator o ministro Vital do
Rego, investigado pela Operação Lava-Jato, se igualados aos auditores externos,
cerca de 800 técnicos terão os salários elevados de R$ 17 mil para R$ 28 mil.
Isso, mesmo sem terem feito concurso público para as funções de topo de
carreira no TCU.
Também está previsto que médicos, nutricionistas,
bibliotecários e analistas de sistema que trabalham no Tribunal passem a ser
denominados auditores externos. Nesses casos, não haveria aumento de salários,
já que esses servidores estão na mesma faixa de renda. As propostas, de tão
absurdas, estão provocando fortes reações contrárias dentro da Corte.
Sem moral
“Estamos diante de um absurdo”, diz Lucieni Pereira,
presidente da associação que reúne os auditores de controle externo (AUD-TCU).
Para ela, ao dar aval a um trem da alegria dentro da própria casa, o TCU
“perderá a moral” para exigir moralidade no setor público. “Como o TCU poderá
alegar abusos em determinados órgãos se está dando mau exemplo?”, indaga.
Lucieni ressalta que há vários projetos espalhados pela Esplanada dos
Ministérios prontos para saírem da gaveta tão logo o anteprojeto do TCU seja
aprovado pelo Congresso.
Na avaliação de Luciene, a farra das promoções não se
restringiria ao governo federal. Se estenderia, por exemplo, para os tribunais
de contas estaduais, todos conhecidos por envolvimento em esquemas de
corrupção. “Em Sergipe, já aconteceu: 81 técnicos foram alçados à condição de
auditores. Agora, está se tentando fazer o mesmo no Espírito Santo, em
Pernambuco, na Bahia e na Paraíba. Há casos em que estão propondo a recriação
de cargos extintos para acomodar os beneficiados pela equiparação de salários”,
destaca.
Previdência
Além do aumento substancial de salários, o trem da alegria
impactará, pesadamente, a Previdência do setor público, que deve fechar este
ano com rombo de quase R$ 80 bilhões. Se aprovado o anteprojeto do TCU, os
técnicos alçados à condição de auditores se aposentarão com salarial integral
do topo da carreira sem ter contribuído para isso na maior parcela do tempo.
“Corremos o risco de termos que fazer uma reforma do sistema previdenciário a
cada ano”, diz Lucieni.
Para a presidente da AUD-TCU, quando tais fatos são
expostos, se fortalece a conscientização da população e de todos os servidores
contra práticas sofisticadas de trem da alegria, que comprometem o resultado
previdenciário e o futuro de todo o funcionalismo. “Não é só: esses movimentos
resultam em grave prejuízo às carreiras exclusivas de Estado”, frisa Lucieni,
que assinou o parecer contra as pedaladas fiscais de Dilma.
O que mais preocupa Lucieni é que já há precedentes no TCU
em relação à farra de salários. Em 1995, técnicos de programação foram alçados
a cargos de nível superior. Todos fecharam os olhos para esse trem da alegria
por muito tempo. O primeiro questionamento só ocorreu em 2013, por meio do
Ministério Público. Mas ninguém acredita em reversão das benesses. “Por isso,
criamos uma frente nacional para tentar barrar o anteprojeto que está
tramitando no TCU”, diz. “Não há como compactuar com isso.”