BSPF - 21/06/2017
Mesmo que tenha outra fonte de renda, uma mulher que começou
a receber pensão por morte de servidor do governo federal antes de 1990 tem o
direito de manter o benefício. Isso porque, até então, a lei não condicionava o
recebimento da pensão à comprovação de dependência financeiro. Esse foi o
entendimento do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, ao conceder
liminar no Mandado de Segurança 34.846.
A autora da ação, representada por Rudi Cassel, do Cassel
Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados, questionou decisão do Tribunal de Contas
da União que cancelou a pensão que ela recebe há 26 anos — seu pai foi servidor
do Ministério da Fazenda. Segundo o TCU, a pensão dela não poderia mais ser
paga porque ela tem rendimentos vindos de uma atividade privada (Acórdão
2780/2016-Plenário).
A corte de contas passou a entender nos últimos tempos que
qualquer fonte de renda que garanta a subsistência do beneficiário é suficiente
para justificar o cancelamento da pensão. A pensão foi concedida à autora sob
as regras da Lei 3.373/58. Pela norma, o benefício concedido à filha solteira
por morte de ascendente só poderia ser cancelada caso ela se cassasse ou
passasse a ocupar cargo público permanente.
Para Fachin o corte foi irregular: “O exercício de atividade
na iniciativa privada, pela pensionista solteira maior de 21 anos, não é
condição que obsta a concessão e manutenção da pensão”, disse.
O ministro também explicou que, mesmo que a dependência
econômica estivesse no rol de condições impostas pela legislação para o
pagamento da pensão, a decisão do TCU permaneceria irregular. Isso porque,
continuou, o inciso XIII do parágrafo único do artigo 2º da Lei 9.784/99 proíbe
aplicar nova interpretação retroativamente em processos administrativos.
“Observo que um dos principais fundamentos do Acórdão 2.780/2016
é a ‘evolução interpretativa’ realizada pelo TCU à luz da nova ordem
constitucional, a permitir que se exija a comprovação da dependência econômica
da pensionista em relação ao valor percebido. Veja-se que a nova interpretação
resultou inclusive na revogação de Súmula do TCU que tratava da acumulação da
pensão com cargo público”, complementou.
Fachin ressaltou que, no exame preliminar da causa, há
violação do princípio da legalidade pelo TCU. “Enquanto a titular da pensão
permanece solteira e não ocupa cargo permanente, independentemente da análise
da dependência econômica, porque não é condição essencial prevista em lei, tem
ela incorporado ao seu patrimônio jurídico o direito à manutenção dos
pagamentos da pensão concedida sob a égide de legislação então vigente, não
podendo ser esse direito extirpado por legislação superveniente, que estipulou
causa de extinção outrora não prevista.”
Segundo Cassel, não há como adicionar hipóteses não
previstas para revogar a pensão concedida, pois isso viola a literalidade da
lei de 1958, o direito adquirido e a segurança jurídica. “Se assim fosse
permitido, todas as aposentadorias em vigor poderiam ser canceladas ou
alteradas por mera interpretação administrativa, sem compromisso com a
legalidade", afirma o advogado.
Pente fino
No fim de 2016, o TCU informou que faria uma revisão nas
pensões pagas por conta da morte de servidores depois de encontrar indícios de
que 19,5 mil mulheres recebem irregularmente o benefício por serem filhas
solteiras.
A partir daí que o TCU passou a entender que essas
beneficiárias devem comprovar que não têm outras rendas. As que não conseguirem
provar satisfatoriamente a necessidade de receber o benefício terão valores
cortados, conforme decidiu a corte nesta terça-feira (1/11).
Os ministros da corte estimaram que o pente-fino pode gerar
uma economia de até R$ 6 bilhões aos cofres públicos em quatro anos. Mas, em
abril deste ano, o ministro Fachin suspendeu liminarmente essa revisão ao
entender que foram estabelecidos requisitos não previstos em lei.
Ele entendeu que, por se tratar de verba de natureza
alimentar, a revisão proposta pelo TCU pode acabar com uma das fontes de renda
das pensionistas. A cautelar vale para as pensionistas integrantes da
Associação Nacional dos Servidores da Previdência e da Seguridade Social,
autora da ação.
Outros tempos
A pensão especial paga às filhas maiores de idade e
solteiras de servidores públicos federais é prevista na Lei 3.373/58. Na época
em que foi criada a norma, a maioria das mulheres não trabalhava fora de casa
e, em geral, as famílias eram sustentadas pelos homens. A norma tinha como
objetivo, portanto, não deixar desamparadas as filhas de servidores mortos.
O benefício foi extinto com a entrada em vigor do Estatuto
do Servidores Públicos Federais (Lei 8.112/90), mas as mulheres que já haviam
obtido o direito de receber os valores continuaram fazendo jus às pensões.
Fonte: Consultor Jurídico