Correio Braziliense
- 19/09/2017
Mesmo com os tímidos sinais de melhora nos índices da
atividade, a equipe econômica tem um caminho árduo para tirar as contas
públicas do vermelho. Atualmente, os gastos obrigatórios, como o pagamento de
salários dos servidores e benefícios previdenciários já ultrapassam toda a
receita líquida do governo federal, que é a verba disponível após os repasses
legais para estados, municípios e fundos constitucionais. Nos últimos 12 meses,
essas despesas chegaram a 105% da receita, segundo dados do Tesouro Nacional.
Em pouco tempo, a
situação se tornará insustentável e, além de colocar em xeque a meta fiscal
deste ano, que é a de conter o deficit fiscal a R$ 159 bilhões, deve levar o
Executivo a publicar medida provisória para congelar os salários dos servidores
em 2018. A medida é esperada pelo mercado, uma vez que o Estado tem sido
obrigado, cada vez mais, a financiar a máquina pública contraindo dívidas. Atualmente,
o endividamento federal representa 73% do Produto Interno Bruto (PIB). A
previsão de analistas é de que o indicador aumente para mais de 90% em 2022 ou
2023.
Teto
Em 2010, quando a
economia cresceu 7,5%, as despesas obrigatórias representavam 72,6% da receita
líquida. Os gastos superaram a arrecadação em 2016 e, desde então, o orçamento
público convive com deficits cada vez maiores. No período de 12 meses terminado
em julho, as contas federais acumularam um rombo de R$ 183 bilhões, acima da
meta estabelecida para 2017. Isso significa que, até dezembro, será preciso
reverter o deficit em, pelo menos, R$ 24 bilhões. A avaliação dos técnicos
oficiais e de alguns agentes do mercado é de que a retomada da economia vai
melhorar a arrecadação, mas, por enquanto, o governo vai se afundando em
dívidas. O Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 1% e 0,2% no primeiro e no
segundo trimestres, respectivamente. A perspectiva dos analistas é a de que
registre alta de 0,6% neste ano. Para 2018, o mercado trabalha com uma expansão
de 2,1% na atividade econômica.
Segundo Flávio
Serrano, economista sênior do Banco Haitong, os sinais, porém, são de que a
situação vai ficar insustentável num prazo não muito distante. Segundo ele, o
teto de gastos estabelecido pela emenda constitucional que limitou o
crescimento das despesas à variação da inflação vai estourar se a atividade
econômica não gerar resultados animadores na arrecadação. "A perspectiva é
de que a economia cresça e ganhe intensidade no primeiro semestre do ano que vem,
mas a reação ainda é lenta", disse.
Na visão de Álvaro Bandeira, economista-chefe do Banco
Modal, além do congelamento dos reajustes nos salários dos servidores públicos,
serão necessárias outras medidas para controlar as despesas públicas, como o
plano de demissão voluntária, lançado na semana passada pelo governo federal
com o intuito de reduzir o quadro de pessoal. "Tem que cortar benefícios e
fazer concessões e privatizações de empresas públicas para conseguir controlar
as despesas. Não tem outro jeito. Além disso, a pressão dos estados será
grande, pois muitos estão endividados", observou.
Vazão
O governo disse que está realizando um corte substancial de
despesas, com controle de fluxo, e reduzindo fortemente as despesas de custeio.
Mas, segundo o Ministério da Fazenda, o ajuste fiscal passa, necessariamente,
pela revisão das despesas obrigatórias, que dependem de mudanças na legislação.
"Isso revela a importância e a premência de reformas estruturais, entre
elas a da Previdência", informou.
A Previdência é a
principal fonte de vazão de verbas. Os benefícios representam, hoje, 57% de
todos os gastos federais obrigatórios. Especialistas afirmam que o governo
precisa aprovar, pelo menos, alguns pontos da reforma previdenciária, que
garantam suspiro financeiro a curto prazo. "O governo vai rolar a dívida,
mas, se não houver reformas e a queda de arrecadação e o aumento das despesas
continuarem, com endividamento crescente, a situação se tornará insustentável
em dois anos", avaliou Alex Agostini, analista da Austin Rating.
Bandeira afirmou que, sem medidas duras, o governo só
conseguirá cobrir gastos com previdência, saúde e educação, e terá que cortar
totalmente os investimentos. "É necessário que comecem as reformas neste
governo e o próximo presidente, que será eleito no ano que vem, se comprometa a
reduzir o tamanho do deficit", avaliou.
Novo deficit
A mensagem modificativa do Orçamento da União, que eleva o
deficit nas contas públicas em R$ 30 bilhões (de R$ 129 bilhões para R$ 159
bilhões), chegará ao Congresso até 29 de setembro. Há um acordo de cavalheiros
entre o Ministério do Planejamento e o relator da peça orçamentária, deputado
federal Cacá Leão (PP/BA), para que o envio ocorra nos sete dias seguintes à
divulgação do relatório bimestral de receitas e despesas, que deverá acontecer
até sexta-feira (22). "Estive com o ministro Dyogo Oliveira na semana
passada para pedir celeridade. Mas ainda havia dúvidas sobre a forma, se por
projeto de lei ou medida provisória, de apresentar os instrumentos e estratégias
para se chegar à nova meta", destacou Leão. Até 30 de setembro, Dyogo
Oliveira participará de audiência pública na Comissão Especial que trata do
Orçamento e, em seguida, o relator abrirá prazo para a apresentação de emendas.
Hamilton Ferrari, Marlla Sabino - Especial para o Correio