BSPF - 11/12/2017
Apesar dos argumentos de que mudanças pretendidas pelo
governo Temer tornariam mais equânimes as aposentadorias, algumas categorias
continuarão com privilégios
Brasília – Apesar dos argumentos que têm sido propagados por
integrantes do governo Michel Temer de que a proposta de reforma da Previdência
vai ajudar a acabar com grandes aposentadorias, equiparar cálculos e benefícios
de forma mais equânime e corrigir distorções nos valores pagos aos brasileiros
que trabalharam durante o mesmo período e executaram funções semelhantes, não é
isso o que apontam estudos feitos por várias entidades.
Especialistas em contas públicas afirmam que, da forma como
está disposto, o texto em tramitação afetará de forma muito pequena os
privilégios hoje observados. Isto porque, em muitos casos, as altas
aposentadorias correspondem a direitos adquiridos (como no Legislativo) por
servidores que recebem o teto de suas categorias ou porque determinados setores
não serão atingidos pelas regras previdenciárias, como os militares.
Para se ter ideia, conforme dados do IBGE de 2016, enquanto
o benefício médio pago pelo INSS é de R$ 1.862, um aposentado do Congresso
ganha, em média R$ 28.527, e do Judiciário, R$ 25.832. Entre os três poderes, a
menor aposentadoria média é a dos funcionários do Executivo, que está em R$
7.500 em média – valor, este, aproximado ao dos militares.
No caso dos militares ficou acertado que Ministério da
Defesa e Forças Armadas vão preparar, posteriormente, uma proposta de
previdência específica para eles. Mas a situação é considerada preocupante por
conta das diferenças de gasto da União com estas aposentadorias.
Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) de junho
passado afirma que o gasto da União com as aposentadorias dos militares é 17
vezes maior que o gasto com um aposentado comum. O tribunal destacou, após
avaliação das contas da Previdência, que enquanto a despesa com cada
beneficiário do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) custou em 2016, R$
5.130,66 na média, com cada militar inativo ou pensionista de militar o gasto
ficou em R$ 89.925,30.
A explicação é simples. No RGPS, a Previdência recebe
contribuições de empregados e de empregadores. Mas no caso dos militares, é o
próprio Tesouro o responsável por todas as despesas.
O levantamento do TCU também mostra que o Tesouro gastou em
2016, R$ 56.893,32, em média, com cada beneficiário do RPPS que atende
especificamente aos servidores públicos federais – valor 11 vezes maior ao
gasto com quem recebe pelo RPPS.
Encargos e pensões
No Judiciário, a última edição do estudo intitulado Justiça
em Números, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que faz uma espécie de
recorte de todos os tribunais, destacou que o gasto médio com cada julgador
(incluindo nessa conta juízes, magistrados e ministros) no Brasil é de R$ 47,7
mil por mês.
Neste valor estão incluídos, além do salário, benefícios
como férias e 13º salário e despesas indenizatórias – caso de diárias,
passagens e verbas de auxílio moradia. Também estão incluídas nesta conta
aposentadorias, encargos de INSS e pensões a familiares.
Os responsáveis pelo estudo destacaram que o valor não
significa dizer que os juízes estão recebendo acima do teto constitucional (de
R$ 33 mil), mas que o gasto calculado do Judiciário levou em conta todos os
pagamentos feitos aos magistrados e não apenas os salários. O valor representa
um crescimento de 3,3% dos gastos do Judiciário na média mensal calculada em
2015 – percentual que se refletiu para
as despesas com aposentadorias.
Também no Congresso Nacional, o principal gargalo nas
aposentadorias não poderá ser resolvido com a reforma, porque os servidores que
mais recebem altos salários têm direito adquirido. De acordo com análise feita
pelo jornalista Lúcio Vaz para o site Congresso em Foco (divulgado em fevereiro
passado), o Congresso tem 5 mil servidores de carreira na ativa e 10 mil
aposentados e pensionistas.
A conta da Previdência é deficitária no caso do Legislativo,
sobretudo, porque enquanto a proporção entre contribuintes e beneficiários no
INSS é de dois por um, na Câmara dos Deputados e no Senado essa proporção se
inverte: dois aposentados para cada servidor na ativa. Além disso, o acúmulo de
vantagens pessoais e gratificações e a maior concentração de servidores
aposentados no topo da carreira acentuam ainda mais o desequilíbrio.
Segundo o trabalho realizado pelo Congresso em Foco, no total,
Câmara e Senado arrecadam R$ 718 milhões de seus contribuintes por ano. Mas
precisam pagar, anualmente, R$ 3,1 bilhões em benefícios para tentar fechar
essa conta. Ou seja: o déficit é de R$ 2,4 bilhões ao ano. E a situação não vai
mudar por enquanto, já que os servidores que estão na ativa e possuem os altos
salários, não serão afetados pela reforma (têm direito adquirido).
Salários no teto
Dados das mesas diretoras das duas Casas legislativas
mostram que, somente na Câmara, são 11.036 analistas legislativos em atividade
que recebem o nível salarial máximo. No Senado, são 987 os analistas
legislativos na ativa que recebem o maior salário, na faixa de R$ 28,8 mil.
O Congresso também tem salários, gratificações e vantagens
pessoais de um total de 4.637 servidores ativos e inativos da Câmara e do
Senado – que ou atingem ou ultrapassam o teto remuneratório do serviço público.
Fazem parte desta lista, muitos deputados e senadores. Os que ultrapassam o
limite sofrem cortes em suas remunerações, mas o número de aposentados que
percebem valores privilegiados continua sendo alto.
"Sabemos que é importante uma reforma na Previdência,
mas de forma que torne mais razoáveis estas aposentadorias de forma bem
comparada para o tempo de serviço e tipo de trabalho desenvolvido por cada um.
Reforma que deixa de fora determinadas categorias não vai ajudar a suprir as
dificuldades econômicas observadas no país", afirmou o cientista político
Ricardo Campos. Campos está acompanhando as discussões sobre o tema e tem
posição crítica, principalmente, em relação ao fato de os militares ficarem de
fora.
"A questão não é destacar a existência ou não de um
déficit da Previdência ou falar em reduzir privilégios, apenas. Nós também não
queremos estes privilégios. O que reclamamos é o fato de não serem debatidas
outras opções com a sociedade para resolver as contas da Previdência, que não
prejudicariam direitos dos trabalhadores, como a cobrança de impostos sobre
grandes fortunas, por exemplo, ou intensificação de cobrança de multas de
empresas", afirmou o senador Paulo Paim (PT-RS).
Paim lembrou que estudos levantados por deputados e
senadores durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Previdência, no
Senado, mostrou que o valor devido por grandes empresas à União por casos de
sonegação previdenciária chega perto de RR 1 trilhão. Um montante que, se
cobrado, poderia ajudar a esquentar os
cofres públicos.
Mas o tema ainda é objeto de muitos debates. Que o diga a
confusão em torno de ser realizada ou não, ainda este ano, a votação da
proposta da reforma na Câmara.
Por Hylda Cavalcanti
Fonte: Rede Brasil Atual