Cristiane Bonfanti
Correio Braziliense
- 03/09/2011
CONJUNTURA » Dilma alerta o Congresso que correção de
salários do Poder Judiciário pode levar a cortes em áreas como saúde e educação
Depois de duas greves desde 2010, os funcionários ameaçam
com nova paralisação em defesa dos reajustes.
A presidente Dilma Rousseff disse que a concessão de
reajustes salariais aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) — o que
elevaria o teto das remunerações no funcionalismo para R$ 32,1 mil — e aos
demais servidores do Judiciário e do Ministério Público da União (MPU)
significará cortes em áreas importantes, como educação e saúde, e colocará em
risco a saúde das contas públicas. Na tentativa de reverter o mal-estar causado
pela não inclusão desses aumentos na proposta orçamentária de 2012, Dilma jogou
o problema no colo do Congresso Nacional.
Em mensagem encaminhada ontem ao Legislativo, ela reafirmou
que o governo havia recebido os pedidos de aumento, com impacto total de R$ 7,7
bilhões no próximo ano, mas ressaltou que eles não puderam ser contemplados na
peça orçamentária. Agora, cabe à Comissão Mista de Orçamento encontrar uma
solução, já que as receitas de 2012 estão comprometidas e não consideram essas
elevações salariais.
“O governo apenas reiterou a existência desses projetos e disse
que caberia ao Congresso aprovar ou não os pedidos. Mas, com os dados
disponíveis hoje, não há recursos para atendê-los”, adiantou o relator do
Orçamento, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP). As reivindicações são de uma
elevação de 56% para os servidores do Judiciário e do MPU, cujos projetos estão
parados na Câmara desde 2009. No caso dos ministros do STF, o pedido
protocolado no ano passado é de um aumento de 14,79%, de R$ 26,7 mil para R$
30,6 mil. Na última quarta-feira, o STF encaminhou outro projeto de lei, de nº
2197/11, pedindo mais 4,8% para os seus ministros. A ideia é recompor a perda
inflacionária estimada para o ano de 2011, que não teria sido considerada na
primeira proposta. Com isso, o subsídio iria para R$ 32,1 mil, fixando um novo
teto para a remuneração do funcionalismo.
Os servidores públicos estão tão dispostos a pressionar o
governo que, desde o ano passado, já realizaram duas greves. Em 2010, eles
cruzaram os braços por 44 dias, entre maio e julho, mas suspenderam o movimento
confiantes na promessa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de analisar o
caso após as eleições. Neste ano, eles também fizeram paralisações em todo o
país. E, agora, ameaçam intensificar as manifestações. Desde o início das
discussões, porém, o Ministério do Planejamento parece irredutível. A ministra
Miriam Belchior tem deixado claro não concordar com as melhorias, o que causou
irritação no presidente do STF, o ministro Cezar Peluso.
Efeito cascata
A preocupação do governo federal não é apenas com as elevações
em específico. Como o subsídio dos magistrados do Supremo representa o teto do
funcionalismo, o reajuste pode causar um efeito cascata. Na carta, Dilma
observou que as propostas foram desconsideradas devido à incerteza econômica
mundial e à necessidade de o Brasil se preparar para lidar com os reflexos da
crise. “Há possibilidade de agravamento na situação econômica internacional em
2012, com risco de recessão em economias avançadas e forte volatilidade nos
preços dos ativos financeiros. Várias economias enfrentam problemas justamente
por sua situação fiscal, com alto endividamento e deficit públicos”, ressaltou
a presidente.
Dilma observou ainda que um aumento excessivo na despesa do
governo traria insegurança sobre a evolução da economia. E dividiu a
responsabilidade com o Legislativo e o Judiciário. Apesar da posição
notadamente contrária aos reajustes, ela disse que submeteu os pedidos à
apreciação do Congresso “em respeito ao princípio republicano da separação dos
Poderes e cumprindo o dever constitucional”.
O deputado Chinaglia explicou que a Comissão terá de lidar
com uma série de reivindicações, mas que não há garantia de atendê-las. “Com
certeza, todos que têm demandas vão encaminhar emendas. Mas não há hipótese de
atender a todos. Isso é irreal”, afirmou. “O que eu me disponho a fazer é
negociar, ouvir, mas não posso criar ilusão. O governo não colocou um centavo a
mais na proposta”, disse. No próximo dia 14, a ministra Miriam Belchior vai ao
Congresso para esclarecer dúvidas sobre a peça orçamentária.
Reação imediata
O impasse na relação entre o Executivo e o Judiciário em
torno da concessão de reajustes causou reação imediata das entidades
representativas dos servidores. No próximo dia 21, eles vão realizar, em
Brasília, o Dia de Mobilização pela Valorização da Magistratura e do Ministério
Público. O protestos vão ocorrer no Congresso, no Supremo Tribunal Federal e na
Praça dos Três Poderes. A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe)
considerou que a postura do governo federal, ao não incluir as previsões de
aumento no Orçamento, violou “o princípio da independência dos Poderes e a
autonomia financeira do Judiciário”.