Antônio Augusto de Queiroz
DIAP - 17/11/2011
O Direito Sindical, para que seja pleno, segundo a
Organização Internacional do Trabalho (OIT), pressupõe a liberdade de
organização e filiação, a garantia de mecanismos de solução de conflitos,
incluindo a negociação coletiva, e o direito de greve. Estes princípios são
universais e valem para todos os trabalhadores, inclusive os do setor público.
A OIT, para dar efetividade ao tripé da organização sindical
(liberdade de organização, direito de greve e negociação coletiva), editou
várias convenções internacionais, tendo o Brasil ratificado, entre outras, a
Convenção 154 sobre negociação coletiva, em 1992, e a Convenção 151, que
assegura a promoção e a defesa dos interesses dos trabalhadores da função
pública, nos três níveis de governo (municipal, estadual e federal), em 2010.
A Constituição brasileira reconhece, em sua plenitude, esses
direitos aos trabalhadores do setor privado (artigos 7º, inciso XXVI, 8º e 9º
da Constituição Federal), mas restringe sua aplicação para os servidores
públicos. O artigo 37 da Constituição (incisos VI e VII) garante aos
servidores: 1) sem restrições, o direito de associação sindical, e 2) nos
termos e limites de lei específica, o direito de greve. É omisso quanto à
negociação coletiva.
Nesse sentido, a vigência da convenção 151 da OIT é
fundamental porque ela poderá suprir essa lacuna em relação à negociação no
serviço público, obrigando o Estado brasileiro a aplicar os princípios da
convenção em sua legislação e em suas práticas nacionais, e, com isto, garantir
a "instauração de processos que permitam a negociação das condições de
trabalho entre as autoridades públicas interessadas e as organizações de
trabalhadores da função pública".
Entretanto, passado um ano e cinco meses do deposito do
registro da ratificação da convenção perante a OIT, ocorrido em junho de 2010,
o governo brasileiro ainda não adequou a sua legislação aos princípios da
Convenção, entre outras razões, por disputa entre dois ministérios: o do
Trabalho, e do Planejamento. O governo, que deixou de promover a adequação de
sua legislação ao texto da convenção no prazo de um ano, já está sujeito a
denúncias que poderão resultar em censura ou punição ao País por descumprimento
de tratados internacionais.
A regulamentação da Convenção, para que tenha vigência no Brasil,
exige a propositura de lei ou leis com regras gerais sobre: 1) os processos de
solução de conflitos nas relações de trabalho do setor público, devendo prever
a negociação, a conciliação, a mediação ou a arbitragem, além da definição dos
critérios para participação das entidades; 2) as garantias dos dirigentes
sindicais, inclusive a liberação para efeito de participar do processo de
negociação; e 3) o direito de greve, em caso de frustração da negociação.
O impasse está posto. De um lado, a Secretaria de Recursos
Humanos do Ministério do Planejamento, reivindica o direito de propor os
projetos lei, já que lhe cabe promover a negociação em nível de governo
federal. De outro, a Secretaria de Relações de Trabalho do Ministério do
Trabalho, que tem a competência de tratar sobre relações de trabalho no País,
não abre mão de propor a regulamentação.
A divergência não se limita apenas à competência ou à
prerrogativa de propor a legislação, mas alcança também, e principalmente, o
formato e o conteúdo da regulamentação. O Ministério do Trabalho entende que,
em face de ausência de regras claras sobre o enquadramento sindical dos
servidores públicos, a lei deve disciplinar este aspecto, submetendo as
entidades sindicais dos servidores ao sistema confederativo, ao princípio da
unicidade sindical e ao sistema de custeio previsto na Constituição, visão
rechaçada pelo Ministério do Planejamento.
O Ministério do Planejamento, por sua vez, elaborou três
minutas de anteprojeto de lei sobre o tema, em cumprimento a termo de
compromisso assinado com algumas entidades sindicais de âmbito nacional. Uma
minuta de caráter geral, valendo para os três níveis de governo (união, estados
e municípios) e duas específicas para a União. Destas, uma dispõe sobre
afastamento de dirigentes sindicais e outras disciplina o funcionamento do
Sistema Nacional de Negociação Permanente no âmbito do Poder Executivo Federal,
no qual admite apenas entidades de representação geral e de abrangência
nacional.
Na minuta de caráter geral, com princípios válidos para os
três níveis de governo, o anteprojeto do Ministério do Planejamento dispõe
sobre o tratamento de conflitos e estabelece as diretrizes básicas da
negociação coletiva, inclusive o direito de greve, e reconhece como preceito
constitucional indissociável da democratização das relações de trabalho a
liberdade de associação sindical, a negociação coletiva e o direito de greve,
mas nato trata da estrutura sindical.
Já a minuta de anteprojeto, formulada em grupo de trabalho
no âmbito do Ministério do Trabalho, além de tratar da solução de conflitos, do
direito de greve e da liberação de dirigentes sindicais, determinando sua
aplicação aos três níveis de governo, também submete a organização dos
servidores públicos ao sistema confederativo, ao principio da unicidade e à
forma de custeio das entidades sindicais do setor privado, que inclui a
contribuição sindical e a negocial ou assistencial, além da mensalidade
descontada diretamente dos sócios.
Enquanto o impasse não é superado, perdem todos. Perdem os
servidores, porque não terão instrumentos para forçar a negociação. Perde o
País, porque fica sujeito a censura ou punição internacional. E perde o
Governo, que ficará com a imagem negativa perante a OIT e aos demais órgãos das
Nações Unidas. Os servidores, além de denunciar o não cumprimento da convenção,
devem pressionar o governo e o Congresso para a imediata regulamentação, sob
pena de ficarem mais um ano sem negociação salarial e de condições de trabalho.
Antônio Augusto de Queiroz
Jornalista, analista
político, diretor de Documentação do Diap