BSPF - 10/04/2013
A servidora do Senado Federal que insultou cidadão após ter
sua remuneração consultada deverá doar 10% do salário para uma entidade de
caridade. O processo foi movido pelo servidor do Tribunal Superior Eleitoral
(TSE), Weslei Machado, que conforme reportagem do Contas Abertas em outubro do
ano passado, foi chamado de “fofoqueiro” e “bisbilhoteiro” pela taquígrafa da
Casa.
Após ter sido insultado por e-mail, Weslei Machado, entrou
com duas ações contra a servidora, conforme reportagem do Correio Braziliense.
Uma ação cível de caráter indenizatório, por danos morais, e uma criminal por
injúria, que previa pena de 1 a 6 meses de detenção. Na segunda audiência de
conciliação, a funcionária do Senado aceitou o acordo e os dois processos foram
arquivados.
A taquígrafa do Senado terá de desembolsar, em no máximo 60
dias, pouco mais de R$ 1,5 mil para comprar bens de natureza diversa ao Serviço
de Estudos e Atenção a Usuários de Álcool e outras Drogas do Hospital
Universitário de Brasília (HUB). A servidora terá de entrar em contato
previamente com a instituição para verificar quais os itens que deverão ser
doados.
A expectativa do funcionário do TSE é que a medida cause
efeito prático devido ao caráter educativo que a ação pode provocar.
"Creio que serve como prevenção geral, com poder educativo a todos. Há
ainda uma questão pedagógica para aqueles que conhecerem a história pensarem
duas vezes antes de ofender alguém. Temos de respeitar alguns valores que o
país tem", acredita.
O servidor do TSE afirmou ainda que não queria o dinheiro.
“Mesmo que ela fosse condenada a pagar, eu o doaria. Na época, queria olhar a
remuneração de um analista e o nome dela chamou a minha atenção. Fiquei
perplexo com a conduta dela depois do último e-mail que encaminhei, porque houve
restrição ao direito de liberdade de expressão e porque ela integra o Senado,
que aprovou a lei (de Acesso à Informação)", conta. Machado acha que ela
reconheceu o erro ao aceitar o acordo.
Troca de e-mails
Após realizar, por acaso, a consulta à remuneração da
servidora, Weslei recebeu a primeira mensagem às 15h21 do dia 4 de outubro de
2012: "O seu interesse pelo meu salário é mesmo público? Por questões de
segurança, posso saber, por exemplo, quem, onde e quando alguém acessou meus
dados, mas não o porquê. Se alguém que
conheço acessa meus dados, então é bisbilhotice. Só por isso pergunto”.
Weslei respondeu, às 15h53, que, nos termos da Lei de Acesso
à Informação, não precisaria motivar o acesso ao contracheque. “Trata-se de um
direito da cidadania. Como cidadão, estou fiscalizando os valores gastos pela
Casa da Fiscalização (Senado) com o seu pagamento", escreveu.
Como réplica, às 16h45, a servidora disparou: "Venia
permissa. Se eu o conhecesse, chamá-lo-ia simplesmente de fofoqueiro. Ratione
legis, você é um fiscal. Ratione personae, apenas um bisbilhoteiro". As
três expressões em latim usadas pela servidora significam, respectivamente:
"Com sua permissão para discordar"; "Em razão da lei"; e
"Em razão da pessoa".
Weslei considerou o e-mail "afrontoso", já que
estava exercendo um direito. “Fiquei decepcionado. Mais uma vez, confirmamos
que o Senado é uma Casa que não cumpre com o princípio republicano e que seus
servidores não respeitam a população".
O servidor afirmou ao Contas Abertas que o sistema de acesso
às remunerações adotado pelo Senado desencoraja a população a fazer consultas.
"Para mim, trata-se de uma forma de desestimular o cidadão a exercer seu
poder fiscalizatório. Creio que o acesso deveria ser facilitado. É uma vergonha
sermos expostos e afrontados quando exercemos o direito inerente à
cidadania", critica.
Às 17h03, Weslei ainda enviou uma última mensagem, que ficou
sem resposta. Nela, exigiu respeito no tratamento, reforçou seu direito à
consulta e ressaltou que toda a informação relativa à remuneração dos
servidores é pública. "Com o meu suor e do resto da sociedade brasileira,
bancamos a manutenção de seu status remuneratório. Por essa razão, tenho
direito de fiscalizar e acompanhar mensalmente a correição dos recursos públicos
destinados a V. Sra.", escreveu. Ao final, assinou a mensagem como
"Weslei Machado, cidadão brasileiro".
Modelo de transparência
O que gerou o embate entre o cidadão e a servidora foi o
modelo adotado pelo Poder Legislativo na divulgação dos salários dos
funcionários. O site de transparência do órgão exige o preenchimento de um
cadastro por parte do interessado. Assim, na intranet da instituição, o
funcionário consegue visualizar o nome, o CPF, o e-mail e o endereço do cidadão
que fez a consulta, obtendo mais informações que o próprio pesquisador. O mesmo
sistema foi implementado na Câmara dos Deputados. O Legislativo é o único Poder
da administração pública federal que exige informações pessoais dos cidadãos
que consultam a remuneração nominal dos servidores.
Caso similar
Repórter do Contas Abertas viveu situação semelhante à de
Weslei. Uma servidora da Casa telefonou para a redação, em horário de trabalho,
e questionou se o repórter havia efetuado consulta a sua remuneração. Ele
confirmou que fizera uma pesquisa no início da semana. A servidora então
perguntou se ele havia ficado satisfeito por conhecer sua remuneração. Depois,
garantiu que irá investigar todas as pessoas que fizerem o mesmo. Ela é
contrária à divulgação nominal dos salários, mas aprova o modelo adotado pelo
Senado.