Renata Mariz
Correio Braziliense
- 24/02/2014
A Polícia Federal gasta R$ 5,4 milhões em um ano com as
remoções de servidores por ofício...
A Polícia Federal gasta R$ 5,4 milhões em um ano com as
remoções de servidores por ofício, que só dependem da canetada da
direção-geral. Ajudas de custo individuais, para bancar passagens e transporte
de móveis, chegam a R$ 69 mil
O vaivém de servidores da Polícia Federal, removidos de
ofício, por canetada da direção da instituição, consumiu mais de R$ 5 milhões
em apenas um ano em pagamento de ajudas de custo. Dados obtidos pelo Correio
mostram que, dos 200 profissionais transferidos internamente no Brasil, de
agosto de 2012 a julho de 2013, 20% embolsaram individualmente mais de R$ 50
mil. Dois delegados chegaram a levar R$ 69 mil ao serem deslocados. Os recursos
- que custeiam a passagem aérea do servidor e de seus dependentes, além dos
gastos com mobiliário - somam 10% de tudo que a PF pretende investir, neste
ano, no Centro Integrado de Inteligência Policial e Análise Estratégia
(Cintepol).
Entre os 200 beneficiários das remoções realizadas pela PF
naquele ano, sob a justificativa legal de interesse da administração, mais de
60% (ou 130) eram delegados. Detentores de outros cargos dentro da carreira
policial da instituição também foram transferidos de ofício com ônus para o
Estado: 30 peritos, 28 agentes, 11 escrivães e um papiloscopista. Juntos, esses
profissionais receberam R$ 1,5 milhão a título de ajuda de custo. No caso dos
delegados, o montante desembolsado pela administração pública chegou a R$ 3,9
milhões. O total gasto é de R$ 5,4 milhões.
Chama a atenção o caso de dois profissionais cujas ajudas de
custo, por poucos reais, não atingiram R$ 70 mil. Um deles é um delegado que,
em maio do ano passado, foi removido da superintendência da PF na Paraíba, em
João Pessoa, para a mesma unidade no Recife. A distância entre as duas cidades
é de aproximadamente 120km. O valor para custear três passagens aéreas e um
mobiliário ficou em R$ 69,8 mil. A outra transferência pesada para o
contribuinte foi a de um delegado que saiu da superintendência da instituição
em Palmas para a localizada em Cuiabá, em junho de 2013. No caso, também foram
pagos três bilhetes aéreos e o transporte de móveis.
Estão na faixa desses dois delegados - de R$ 60 mil a R$ 70
mil por ajuda de custo - outros 14 policiais federais. Dezenove profissionais
receberam, no período analisado, entre R$ 50 mil e R$ 59,9 mil. Para 13, o
valor embolsado variou de R$ 40 mil a R$ 49,9 mil. Outros 19 ficaram com somas
entre R$ 30 mil e R$ 39,9 mil. De R$ 20 mil a R$ 29,9 mil, foram 38
beneficiários. A faixa mais volumosa, porém, fica entre R$ 10 mil e R$ 19,9
mil, com 71 policiais. Somente 14, dos 200 removidos entre o segundo semestre
de 2012 e o primeiro de 2013, embolsaram menos de R$ 10 mil.
Normas
As remoções na Polícia Federal são reguladas pela Instrução
Normativa nº 64/2012, que estabelece requisitos para as transferências de
ofício, definidas em última instância pela direção-geral da instituição. Por
meio da assessoria de imprensa, o órgão ressalta que "esse tipo de remoção
ocorre para ocupação de função gratificadas, incluindo chefias de Direção e
Assessoramento Superior (DAS), além de outras consideradas estratégicas, tais como:
adidâncias e oficialatos de ligação no exterior". A PF destaca, ainda, que
"o servidor exonerado da função deve retornar de ofício para a sua unidade
de origem". O regramento para as remoções segue dispositivo do Decreto nº
4.004/01 da Presidência da República, acrescentou a nota.
A PF informou ainda que "as remoções realizadas de
ofício, nos últimos anos, somam apenas 18% do total de remoções realizadas pelo
órgão", sem especificar o período compreendido na expressão "últimos
anos". Ao classificar como "baixo" o percentual, a instituição
destacou que ele "tende a diminuir ainda mais neste ano diante do concurso
de remoção que ocorrerá em 2014". Segundo o órgão, tal movimentação será
possível porque novos servidores aprovados no último concurso estarão tomando
posse em breve. São esperados novos 150 delegados, 350 escrivães, 100 peritos e
550 servidores do quadro administrativo da PF.
Destinos preferidos
Três em cada quatro remoções de ofício feitas pela Polícia
Federal no período de um ano, entre 2012 e 2013, garantiram destinos iguais ou
melhores aos profissionais transferidos com ajuda de custo bancada pelos cofres
públicos. A classificação das cidades é oficial, feita pela própria PF, em uma
escala que varia de 1 (capitais consideradas boas, como Brasília, Fortaleza,
Belo Horizonte e Aracaju) a 4 (locais distantes dos centros urbanos, com baixa
qualidade de vida). Nada menos que 76% das movimentações foram para cidades com
pontuação maior que a de origem ou ao menos semelhante.
O ranking dos destinos mais acessados pelos removidos foram
Brasília, Natal, São Paulo, Curitiba e Florianópolis. Todas elas são cidades
com pontuação 1 na classificação da PF. Mas a capital federal se destaca, mesmo
diante das praias paradisíacas catarinenses ou da funcionalidade da capital
paranaense. Para cá, vieram 43 dos 200 policiais federais transferidos de
ofício no período analisado. Porém, deixaram a capital 27 profissionais. Esse
saldo de 16 profissionais a menos, entre os que saíram e os que chegaram, é particularidade
de Brasília. Nos demais locais, costuma ser bem menor ou mesmo zerado.
"Uma dança das cadeiras", alegam os críticos ao
modo como as remoções de ofício vêm sendo feitas. Eles apontam o protocolo como
uma forma de garantir ajudas de custo polpudas a determinados profissionais, e
não como transferências para lugares em que realmente há necessidade de
efetivo. Pouco mais de 7% de todo o efetivo de delegados da PF foram removidos
de ofício de agosto de 2012 a julho de 2013. Esse índice é de 2,7% entre os
peritos. No caso de escrivães, papiloscopistas e agentes, o percentual não
passa de 0,6%.
Aposentadoria rápida
Entre as duas centenas de policiais federais removidos de
ofício pelo órgão, entre agosto de 2012 e julho de 2013, dois deles se
aposentaram logo depois da transferência pela qual receberam ajudas de custo de
cerca de R$ 20 mil, cada um. Eles saíram de Brasília - um terminou a carreira
em Belo Horizonte e o outro, em Governador Valadares (MG). O órgão destacou, em
nota, que não há proibição legal de pagamento da indenização pelas despesas
acarretadas por remoção a servidor com condições de se aposentar.
"Pelo contrário, o decreto estabelece que o servidor
pode retornar a sua unidade de origem após exoneração de função gratificada e
faz jus a ajuda de custo, não prevendo a possibilidade de aposentadoria",
diz a resposta encaminhada pela PF por ofício. A justificativa é que o policial
federal que foi para Belo Horizonte havia sido trazido para Brasília para
chefiar uma seção. O outro tinha sido lotado na capital federal para suprir
falta de efetivo. Ambos, de acordo com a instituição, têm direito de retornar
para as unidades de origem recebendo as ajudas de custo de quase R$ 20 mil
antes de se aposentar.
Embora as transferências e os pagamentos estejam amparados
por lei, o que se comenta nos bastidores da PF é que as remoções de ofício são
verdadeiros prêmios a quem tem bom trânsito com as chefias. Há exemplo de um
delegado transferido três vezes no período de quatro anos. As justificativas,
alegam os críticos dessa modalidade de remoção, são nebulosas, além de causar
mal-estar entre profissionais que deveriam, por mérito, serem alçados aos
cargos de chefia na própria cidade onde trabalham - em vez de os postos serem
ocupados com os transferidos.