Julia Chaib, Naira Trindade, Amanda Almeida e Eduardo
Militão
Correio Braziliense
- 22/11/2014
A três meses de deixar a Casa, Henrique Eduardo Alves
autoriza pagamentos acima do teto, de R$ 29,4 mil, contrariando decisão do STF
A Câmara dos Deputados voltou a pagar salários acima do teto
constitucional para servidores. Embora o Supremo Tribunal Federal (STF) tenha
determinado o corte imediato da remuneração de todos os funcionários públicos
que recebam acima de R$ 29,4 mil por mês, o presidente da Casa, Henrique
Eduardo Alves (PMDB-RN), liberou o pagamento dos chamados supersalários no
contracheque de novembro, com direito até ao retroativo pelo que esses
funcionários deixaram de receber no mês anterior.
O movimento do peemedebista ocorre a três meses de deixar a
Presidência da Câmara e pouco tempo depois de ser derrotado nas eleições ao
governo do Rio Grande do Norte. Apesar de ter obedecido a decisão do STF em
outubro — em meio ao segundo turno da disputa eleitoral —, Alves agora mudou de
ideia e argumenta que o acórdão com o entendimento da Corte precisa ser
publicado para que a Câmara corte os supersalários. O STF tem 60 dias, a partir
do julgamento, para publicar o acórdão. Esse prazo expira em dezembro. Caso
seja provocada até lá, a Corte pode avaliar se Alves age ilegalmente ao não
suspender os pagamentos.
A decisão do presidente da Câmara foi publicada no Boletim
Administrativo interno na última segunda-feira. O peemedebista alega que acatou
o recurso da Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento da Câmara
(Aslegis) à Casa. “De fato, verifico que a Suprema Corte não publicou o acórdão
referido na decisão combatida, de modo a se ter, com exatidão, compreensão
sobre seu alcance. Observo ainda que pende de resposta do ministro Marco
Aurélio (Mello), indagação anteriormente formulada sobre a questão do foro
administrativo competente para a apreciação das defesas apresentadas pelos
interessados”, diz o texto assinado pelo peemedebista.
Controvérsia
A polêmica em torno dos salários no Congresso se arrasta
desde 2013. Em outubro do ano passado, um acórdão do Tribunal de Contas da
União (TCU) determinou que nenhum funcionário público deve receber acima do
teto constitucional. Um processo administrativo foi instaurado e a Mesa
Diretora concluiu pelo cumprimento imediato da determinação e o corte dos
supersalários até fevereiro deste ano, quando o ministro do Supremo Marco
Aurélio Mello atendeu ao recurso do sindicato da categoria e decidiu pela
suspensão do corte até que funcionários da Casa enviassem explicação sobre a
remuneração à direção. Marco Aurélio não foi encontrado para comentar o
assunto.
Os pagamentos acima do teto, então, foram retomados entre
março e setembro. E novamente suspensos no mês passado, por causa da decisão do
STF. Parte dos funcionários da Câmara voltou a receber acima do teto na semana
passada, depois da decisão de Alves. Levantamento no qual o TCU se baseou para
determinar o corte identificou que 1.341 servidores recebiam valores acima do
teto constitucional. A folha da Câmara consumia R$ 2,5 bilhões anuais, dos
quais 18,75% (R$ 517 milhões) correspondiam a pagamentos irregulares. Henrique
Eduardo Alves não foi localizado para comentar a reportagem.
A decisão do STF se deu em julgamento de recurso apresentado
pelo governo de Goiás contra decisão do Tribunal de Justiça do estado, que
manteve salários superiores ao teto para um grupo de servidores aposentados. O
recurso teve repercussão geral reconhecida, o que significa que todos os juízes
do país terão de seguir o entendimento.