Ana Paula Lisboa
Correio Braziliense
- 26/04/2015
Servidores lutam contra o estereótipo da inércia sem-fim e
buscam capacitação. Tempo de casa não é o único diferencial para crescer:
dedicação e liderança são levadas em conta na hora de assumir cargos mais altos
Para o senso comum, o serviço público é sinônimo de
burocracia e estagnação. No entanto, servidores que amam aquilo que fazem
buscam capacitação e se esforçam pelo melhor desempenho provam que essa não é a
regra geral. O esforço é reconhecido com evolução na carreira e em cargos de
confiança. Subsecretária de Gestão de Pessoas do Governo do Distrito Federal
(GDF), Ledamar Rezende, 47 anos, é exemplo de dedicação e trilhou um caminho de
crescimento ao longo de 18 anos. "Comecei numa função de nível médio e fui
galgando posições melhores por mérito. Substituí minha primeira chefe, depois
me tornei assistente, assessora, gerente, diretora, coordenadora e, por fim, subsecretária",
conta.
A dedicação da servidora não se limita à repartição e chega às salas de
aula: depois de aprovada no concurso, fez faculdade de administração e duas
pós-graduações, em administração pública e em gestão de pessoas, e é professora
voluntária na Escola de Governo do Distrito Federal. "Sou feliz no que
faço, adoro a área de gestão de pessoas. Meu papel é dar o melhor para a
sociedade." Sobre a estagnação, ela diz que é uma generalização, mas
aponta que depende da vontade de cada um: "Em qualquer lugar, mesmo na
iniciativa privada, alguns carregam o piano mais que outros".
"Há estereótipos sobre o servidor público. Há muitas
funções realizadas de forma competente e, em qualquer contexto, encontramos
pessoas motivadas e desmotivadas", defende o presidente da Escola Nacional
de Administração Pública (Enap), Gleisson Cardoso Rubin. Apesar dos problemas,
ele observa mudanças positivas na administração pública nos últimos tempos.
"De uns 15 anos para cá, as organizações têm absorvido a ideia de perseguição
de metas e eficiência, o que se reflete em todos os aspectos", conta. Um
dos grandes incentivos para a busca por melhores resultados é a chance de
promoções. "No serviço público, há dois tipos de crescimento. O primeiro é
por tempo de permanência e cumprindo os requisitos. Existe também uma carreira
paralela, que funciona de modo semelhante à iniciativa privada: são
oportunidades em cargos de chefia e direção, conquistadas com bom desempenho,
demonstrando liderança, trabalho em equipe e inteligência emocional."
Busca por inovação
Servidor público há 25 anos, o economista e doutor em
administração Ciro Campos Christo Fernandes, 44 anos, trabalhou em diversos
órgãos, como os ministérios da Previdência, do Trabalho e do Planejamento,
sempre buscando a inovação. "Há muitos casos de servidor mal aproveitado e
de falta de perspectiva de carreira, mas a ideia da estagnação, de que estamos
ali acomodados e carimbando papel, é falsa", garante ele, que, hoje, é
assessor da presidência da Enap. Para fugir da mesmice, Ciro investe na troca
de experiências por meio de eventos como o Congresso de Gestão Pública do
Conselho Nacional de Secretários de Estado de Administração Pública (Consad).
"Participei de todas as sete edições e, na oitava, vou apresentar um trabalho.
É um espaço para ver o que está sendo feito por aí, conhecer outros servidores,
parar e refletir sobre o próprio trabalho e melhorar."
Alice Viana, presidente do Consad, avalia que faltam
profissionalização e orientação no serviço público. "As práticas
administrativas precisam ser aprimoradas para trazer mais eficiência na
prestação de serviços", avalia. Além de mudanças no topo, a base precisa
correr atrás do prejuízo. "Vejo servidores com vontade de fazer diferente,
mas falta profissionalização. É por isso que a capacitação e o intercâmbio em
congressos como o do Consad, por exemplo, são fundamentais", defende a
secretária de Administração do Pará e servidora do Poder Judiciário. Segundo
Alice, a revolução do serviço público só virá com uma mudança na visão sobre o
governo. "Falta respeito por aquilo que é público. É preciso parar de
enxergar o Estado apenas como empregador e passar a vê-lo como um prestador de
serviço coletivo do qual fazemos parte", explica.
Capacitação
"Eu trabalhava como psicóloga organizacional na
iniciativa privada e sofri um choque de realidade. Os processos são lentos, e
você tem que desviar da burocracia", conta Elke Fernanda do Nascimento, 37
anos, que é técnica-administrativa no Departamento Nacional de Infraestrutura
de Transportes (Dnit) há um ano e meio. Para se adaptar, ela fez quatro cursos
presenciais em gestão de pessoas na Enap. "Procurei capacitação e vi
efeitos positivos. Muita gente faz pensando na promoção vertical. Não é meu
caso: busco eficiência. Mostrar resultados sempre foi importante para mim, até
porque, na iniciativa privada, quem não trabalha bem vai para a rua, não é
instituição de caridade." Gleisson Cardoso Rubin, presidente da Enap,
explica que muitas capacitações ofertadas pela
escola são feitas de acordo com a demanda dos órgãos. " Temos
retorno positivo, e os funcionários apresentam melhores resultados."
Expandindo horizontes
Ficar parada não faz parte do dia a dia de Marcela Carvalho,
33 anos, analista de comércio exterior no Ministério do Desenvolvimento
Indústria e Comércio Exterior (Mdic) desde 2003. "A ideia de que servidor
público trabalha pouco é enganosa: nunca saio daqui antes das 18h." Ela
ainda estava na faculdade de relações internacionais em Recife, quando foi
incentivada por um professor a prestar o concurso. "Fiz sem estudar e,
como a nomeação demorou, consegui me formar a tempo. Quando cheguei, nem
conhecia a carreira direito e me surpreendi positivamente: é muito melhor do
que eu pensava", diz.
Até 2010, ela atuou na assessoria internacional do
ministro, época em que fazia cerca de quatro viagens internacionais por mês e
chegou a chefiar a área. "Conheci todos os países do Mercosul, vários da
Europa e da África, mas esse não é o principal atrativo do trabalho. É uma
carreira dinâmica sem correspondência na iniciativa privada. Representar o país
lá fora em negociações é uma grande responsabilidade. Você tem que dominar
várias áreas, e o conhecimento de idiomas se faz necessário", conta
Marcela, que fala inglês e espanhol e também estudou russo. A analista
coordenou o setor de comércio exterior do Ministério do Planejamento e, desde
2014, atua como assessora especial na Câmara de Comércio Exterior (Camex).
A carreira de especialista em políticas públicas e gestão
governamental permite passagens por diversos órgãos. Na função desde 2004, Alex
Canuto, 39 anos, atuou nos ministérios da Justiça e do Planejamento. Sempre em
busca de melhorar, usou uma licença para fazer mestrado em administração
pública na Hertie School of Governance em Berlim. "Aprendi a visão de
políticas públicas de um outro ponto de vista e adquiri conhecimentos úteis ao
trabalho." Ele gosta da função, mas admite que há dificuldades. "Por
interesses políticos, podem te jogar em qualquer geladeira. Você não pode se
acomodar e achar que as coisas vão cair no seu colo, servidor público precisa
ter inicaitiva para crescer", revela.
Capacite-se
Congresso
No mês que vem, Brasília sedia o maior congresso de gestão
pública do país. O 8º Congresso de Gestão Pública do Consad será no Centro de
Convenções Ulysses Guimarães em 26, 27 e 28 de maio. As inscrições vão até 25
de maio pelo site www.consad.org.br. Para servidores e outros interessados, a
taxa é de R$ 200. Estudantes pagam R$ 100. Também é possível se inscrever na
hora do credenciamento (R$ 300).
Presencial e a distância
Em 2014, a Escola Nacional de Administração Pública (Enap)
capacitou 32 mil participantes on-line e 9,2 mil presencialmente. Para conferir
cursos gratuitos para Servidores Públicos, acesse www.enap.gov.br. A
instituição está selecionando instrutores para os cursos de desenvolvimento de
equipes, gestão de materiais e elaboração de planos de capacitação. Qualquer
servidor público pode concorrer às vagas que podem ser conferidas no site.