O Dia - 30/07/2017
Ex-servidores que viveram experiência de aderir ao programa
no governo FHC, em 1996, e especialistas alertam para problemas que
funcionalismo pode enfrentar ao aceitar condições para deixar serviço público
Rio - É como um filme repetido. O lançamento do Programa de
Desligamento Voluntário (PDV) para servidores do Executivo Federal pela União,
na semana passada, voltou a ser mecanismo usado pelo governo para tentar reduzir
gastos com a máquina pública. A exemplo do que fez o ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso, em 1996, o atual, Michel Temer, decidiu apresentar a proposta
na busca de uma economia anual de R$ 1 bilhão a partir de 2018. A meta é de
adesão de cinco mil pessoas.
A medida provisória que trata do PDV prevê indenização de um
salário e quarto do valor (125%) por ano trabalhado como incentivo. Propõe
redução de jornada de 8 horas diárias e 40 horas semanais e 6 horas ou 4 horas
diárias e 30 horas ou 20 horas semanais, respectivamente, com pagamento
proporcional salário, calculado sobre o total da remuneração. Além disso,
oferece licença sem remuneração de três anos (prorrogáveis por igual período),
recebendo valor correspondente a três vezes seu salário.
Mas diante das experiências anteriores e também da recessão
no país, especialistas e pedevistas do período FHC acreditam que a nova medida
terá baixa adesão. Ao contrário do que foi oferecido em 1996 — e, segundo
muitos, não cumprido —, no PDV de Temer não há “atrativo”. E para o
especialista em Direito Administrativo e Constitucional, Manoel Peixinho, a
proposta de Temer é “draconiana” (rigorosa).
“O PDV de 96 foi a venda de uma ilusão. Prometeram programas
de reinserção no mercado e de capacitação, o que não ocorreu. Violaram a
própria lei. Por isso, muitos foram à Justiça pedir reintegração, e outros para
o mercado informal”, disse ele, que complementou: “O de agora é draconiano,
pois não promete nada. Apenas ônus para quem aderir e muito poucos bônus. Os com
menor remuneração podem cair numa armadilha”.
Os pedevistas de FHC, Jorge Godoy, 70 anos; Cláudio Melo,
60; Emerson Figueiró, 59; e Paulo Mello, 63, alertaram para o “sonho” da
indenização, que classificaram como “ilusão”, tanto pela dificuldade de
encontrar emprego na iniciativa privada, quanto pelo fato de o dinheiro não ser
“suficiente”. Eles citaram ainda que a promessa de linha de crédito especial
aos ex-servidores não se concretizou na época.
“A indenização é uma antecipação do salário futuro”, opinou
Cláudio Melo, que era restaurador do IPHAN. Ele aderiu ao PDV devido ao
desestímulo no setor público, principalmente pela falta de investimentos na sua
área. “Foi um equívoco. Nunca mais trabalhei com isso”, contou ele. “Criam
ambiente de desmotivação, o que leva à saída de servidores. O governo Temer
está indo na contramão da necessidade da população”, finalizou.
Jorge Godoy era agente administrativo do INSS e disse que
saiu do órgão depois de ser “seduzido pelo canto da sereia”. “O PDV seria
voluntário se o servidor buscasse isso de vontade própria. Mas nós e muitos
aderimos pelas promessas que jamais se cumpriram”, afirmou ele, que, hoje, luta
junto com outros colegas e Sindsprev pela reintegração no serviço público.
Emerson era técnico do IBGE e só não enfrentou muitas
dificuldades porque conseguiu trabalhar na corretora do irmão: “É ilusão. O
dinheiro só compensará por um tempo. Espero que as pessoas não entrem nesse PDV
de agora do Temer”. De todos, Paulo, que era do INca, foi quem mais passou por
dificuldades para buscar a indenização. Além disso, trabalhou no mercado
informal de trabalho. “Me arrependo muito. Até hoje, trabalho sem carteira
assinada e estou sem contribuir para a Previdência”, lamentou.
PLs seguem na Câmara
Há mais de cinco projetos de lei tramitando na Câmara
Federal que preveem a reintegração de pedevistas de vários governos. O
principal deles é de autoria de Leonardo Picciani (PMDB-RJ), hoje, ministro do
Esporte do governo Temer.
O PL 4.293/2008 está na Comissão de Constituição e Justiça
(CCJ) e prevê anistia aos ex-servidores da administração pública federal (como
ministérios e secretarias), de autarquias (INSS, Pedro II) e fundações (IBGE e
algumas universidades, por exemplo) que aderiam ao programa de demissão
proposto em 1996 por FHC.
Há mais três propostas que estão apensadas a este projeto.
No entanto, as outras tratam de ex-funcionários também de empresas de economia
mista.
O mais recente é o PL 3.959/2015. O texto prevê a
reintegração e a concessão de anistia aos ex-servidores da administração
pública direta, indireta, autárquica, fundacional e empresas de economia mista.
O que pode ser vantagem ou não para quem aderir ao PDV
O jurista Manoel Peixinho pontuou o que ocorrerá se o
servidor aderir ao PDV, à redução de jornada ou à licença sem remuneração.
As vantagens
Em relação ao PDV, pode ser vantajosa a adesão para
servidores que não dependem da remuneração mensal daquele cargo e aqueles que
tenham outra(s) renda(s). “Para este pode ser positivo, pois receberá uma
indenização, que poderá agregar algum tipo de valor”.
Quanto à redução de jornada de trabalho, quem quiser
empreender, ou seja, abrir o próprio negócio, ou administrar empresa terá essa
permissão. “Hoje, é proibido exercer gerência de empresa pela Lei 8.112/90),
mas neste PDV abre-se exceção”.
A jornada reduzida autoriza o servidor a exercer outra
atividade pública ou privada desde que não haja conflito de interesse.
Terão preferência para a redução de jornada aqueles
servidores federais com filhos de até seis anos de idade, ou responsáveis pela
assistência e cuidados de pessoa idosa, doente ou com alguma deficiência.
Desvantagens
O servidor federal que iniciou a carreira no setor público
antes de 2013 e aderir ao PDV proposto pelo governo Temer perderá o direito a
se aposentar pela integralidade. Isso porque o benefício integral é garantido
ao funcionalismo apenas até esta data. Mas se o servidor se desligar pelo
programa, ele terá de se aposentar pelo INSS e o cálculo de sua aposentadoria
será pela proporcionalidade.
Quem aderir ao PDV e, posteriormente, fizer outro concurso e
ingressar novamente em cargo público federal não poderá contar o tempo anterior
para efeitos de aposentadoria no serviço público. A MP não estipula prazo para
o retorno em outro cargo.
Vale ressaltar que o estatutário que estiver na fila de
espera pela convocação para outra vaga federal (mediante aprovação em concurso)
não poderá aderir ao PDV do governo Temer.
Aqueles com menor tempo no serviço público terão preferência
para se desligarem, e o valor da indenização será menor (já que é calculado
sobre o ano trabalhado). E a indenização será paga em parcela ou cota única —
isso ainda não foi definido pelo Ministério do Planejamento, “o que causa
insegurança jurídica”.
Na licença sem remuneração, a pessoa não terá como se
programar, já que o órgão federal poderá interromper a medida
discricionariamente (por decisão unilateral do órgão).
Quem aderir à jornada reduzida ou à licença sem remuneração
somente receberá o vencimento-básico, acrescido das vantagens permanentes
estabelecidas em lei, excluídos adicionais pela prestação de serviço
extraordinário; noturno; de insalubridade; de periculosidade ou pelo exercício
de atividades penosas; de férias; e a gratificação natalina.
(Paloma Savedra)