Correio Braziliense
- 13/08/2017
Além de baixar os salários de início de carreira e adiar
reajustes, o governo quer reduzir ou extinguir vantagens concedidas a
funcionários, como auxílio-moradia e ajuda de custo para mudança, e agilizar
projeto que limita remunerações no serviço público
O governo prepara uma série de medidas que afetarão a vida de
concurseiros e de servidores da ativa. Além de adiar de 2018 para 2019
reajustes salariais para diversas categorias e definir os salários iniciais
para as carreiras de nível médio e superior, vários benefícios serão revisados
para gerar economia aos cofres públicos.
As propostas, que serão anunciadas amanhã, se limitarão ao
Poder Executivo. Entretanto, a ideia é de que o Legislativo, o Judiciário, o
Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União adotem normas
semelhantes, já que 80% dos orçamentos se destinam à folha de pessoal.
O assunto foi discutido ontem em reunião do presidente
Michel Temer com ministros, no Palácio do Planalto. Técnicos ainda estudam se
as propostas serão encaminhadas ao Congresso por meio de projetos de lei ou por
medida provisória, que teria eficácia imediata. O adiamento dos reajustes no
próximo ano resultará em economia de R$ 9,7 bilhões. As demais medidas têm
potencial para reduzir os gastos públicos em R$ 70 bilhões.
A primeira delas é fixar remuneração de entrada no serviço
público de R$ 2,8 mil para cargos de nível médio e de R$ 5 mil para postos que
exigem ensino superior. A ideia do Executivo é de que as carreiras passem a ter
30 níveis e revisões salariais anuais. Com isso, o servidor chegaria ao topo ao
longo de 30 anos. “A regra valerá para os novos concursos em 2018. Os editais
publicados não serão afetados”, disse um auxiliar de Temer.
Discrepâncias
Estudos da equipe econômica indicam que o nível de
remuneração das carreiras federais está acima dos valores de mercado. Em média,
um servidor de nível fundamental ganha 3,5 vezes mais do que um trabalhador do
setor privado com a mesma escolaridade. Os de nível médio têm salário 2,8 vezes
maior e os de nível superior, 2,1 vezes. Em alguns casos, as discrepâncias são
ainda mais gritantes.
Um advogado recém-formado recebe, em média, R$ 4,4 mil no
setor privado. Já um advogado da União inicia a carreira com salário de R$ 19,2
mil, 4,3 vezes superior. As diferenças também são semelhantes nas carreiras que
compõem o ciclo de gestão. Os economistas, que no setor privado ganham R$ 6,4
mil, os administradores, que têm salário
de R$ 4,6 mil, e os contadores, de R$ 4,2 mil, garantem, no setor
público, contracheque de R$ 16,9 mil. “Os mais jovens não têm motivação para
progredir, não querem assumir cargos e se comprometer”, explica um técnico do
Executivo.
Outro problema é a baixa amplitude para a progressão
funcional. Muitos servidores chegam aos níveis mais altos da carreira em até 15
anos de trabalho. No caso da Advocacia-Geral da União (AGU), a progressão se dá
em até seis anos de serviço e o salário chega a R$ 24,9 mil. Técnicos da equipe
econômica argumentam que, mesmo com a fixação de um salário inicial de R$ 5
mil, trabalhadores com essa faixa de renda se enquadram entre os 10% mais ricos
da população, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE).
As mudanças não param por aí. O auxílio-moradia, que chega a
engordar os contracheques em até R$ 4,3 mil, será pago por, no máximo, quatro
anos, e o valor, reduzido anualmente em 25%, até zerar. Outra regalia que será
revisada é a ajuda de custo para mudança. Quando é transferido para outra
cidade, o servidor recebe até três salários cheios, sem incidência de Imposto
de Renda, tanto na ida quanto na volta. Pela proposta do Executivo, somente um
salário será pago quando o servidor se mudar e outro, quando voltar para a
cidade em que tem domicílio próprio.
Além dessas medidas, o governo quer desbloquear a
tramitação, na Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei nº 6.726, de 2016, que
regulamenta o teto constitucional para todos os Poderes. A proposta, já
aprovada pelo Senado, está engavetada na Comissão de Trabalho, Administração e
Serviço Público e aguarda designação de relator. Pelo texto, os rendimentos não
poderão exceder o subsídio mensal dos ministros do Supremo Tribunal
Federal, de R$ 33,7 mil.
Efeitos
O limite será aplicado ao somatório das verbas recebidas
pelo servidor, ainda que tenham origem em mais de um cargo, aposentadoria ou
pensão, inclusive quando originados de fontes pagadoras distintas. O projeto de
lei determina que integram o teto os vencimentos, salários e soldos ou
subsídios, verbas de representação, parcelas de equivalência ou isonomia,
abonos, prêmios e adicionais, entre outros. No extrateto estão as parcelas de
indenização, previstas em lei, não sujeitas aos limites de rendimento e que não
se incorporam à remuneração. É o caso da ajuda de custo na mudança de sede e
das diárias em viagens.
O especialista em finanças públicas da Tendências
Consultoria, Fábio Klein, avalia que parte das medidas é positiva, mas avisa
que os efeitos só virão a médio e longo prazos. Para ele, o ideal é que, além
de reduzir salários iniciais, nem todas as vagas abertas sejam repostas. “Estão
propondo um tratamento mais próximo ao do setor privado. Mas, adiar o reajuste
dos servidores é empurrar uma despesa permanente. Não entendo como querem
postergar as revisões e elevar a previsão de deficit. Isso precisa ser melhor
detalhado”, destacou.
Temer define ajuste fiscal
A pressão dos partidos do centrão sobre o presidente
Michel Temer após bancarem o
arquivamento da denúncia contra ele no mês passado, na Câmara dos Deputados,
resultará em uma série de trocas de cargos no segundo escalão do governo a
partir de amanhã. O Diário Oficial da União deve anunciar demissões como forma
de retaliação aos partidos infiéis, como o PSDB, que se dividiu na votação. Os demitidos
serão substituídos por integrantes do Centrão, como PP, PR e PSD, que exigem
mais espaço no governo após a demonstração de fidelidade.
O assunto foi discutido ontem no Palácio do Planalto, onde,
durante a tarde, Temer se encontrou com a equipe econômica para afinar o
discurso de revisão da meta fiscal, que também pode ser anunciada nesta
segunda-feira. O presidente passou a tarde com os ministros da Fazenda,
Henrique Meirelles; do Planejamento, Dyogo Oliveira; e da Secretaria de
Governo, Antônio Imbassahy, responsável pela articulação política do governo.
Mais cedo, o chefe do Executivo esteve com os ministros da Defesa, Raul
Jungmann, e do Gabinete de Segurança Institucional, Sérgio Etchegoyen.
A expectativa de rombo para este ano deve aumentar em R$ 20
bilhões, dos R$ 139 bilhões previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO)
para R$ 159 bilhões, como propõe a Fazenda. A meta para 2018, de R$ 129
bilhões, também deve ser atualizada. A possibilidade de flexibilização tem sido
criticada por parte da base política do governo, que se reuniu na semana
passada com a equipe econômica. Outra medida discutida é a postergação, para
2019, do reajuste dos salários dos servidores federais.
Por Antonio Temóteo , Alessandra Azevedo , Vera Batista