BSPF - 01/04/2020
O judiciário nacional depara-se com problemáticas emergentes
e não usuais com a iminência do novo coronavírus, doença classificada como uma
pandemia e que já vitimiza mais de 18 mil pessoas em todo o mundo, segundo a
Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, o Governo Federal declarou
estado de calamidade pública para atenuar os efeitos negativos do surto e a
situação para os três poderes é enfrentar tentativas para debater medidas
efetivas diante da crise.
Esta semana, o projeto de lei (PL) decretado pelo deputado
federal Carlos Sampaio do PSDB de São Paulo provocou debates no legislativo ao
permitir a redução de salários de servidores públicos federais de todos os
poderes visando o equilíbrio orçamentário das contas públicas. O texto inclui o
vocábulo servidor público no sentido mais amplo, incluindo assim cargos
políticos e servidores não estáveis, bem como empregados públicos permanentes.
A grande questão é se a medida é legítima dentro do regulamento da Constituição
brasileira e o que os contornos desta pergunta nos revelam sobre o atual
contexto trabalhista.
A proposta é constituída para o recebimento de 10% a menos
do salário, caso os valores procedentes sejam entre R$ 5 mil a R$ 10 mil, e de
20% a 50% para os servidores que ganham mais de R$ 10 mil reais, com margem de
discricionaridade para cada poder, ou seja, o Legislativo, Judiciário e
Executivo estabelecerão o percentual a ser utilizado. Os servidores das áreas
de saúde e segurança pública ficam excetuados da regra acima.
Para Martinho Vasconcelos, advogado publicista, a proposta
apresenta dispositivos inconstitucionais à medida que a Constituição Federal
julga que “os subsídios e os vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos
públicos são irredutíveis”. Segundo o advogado: “apenas se permite a redução de
carga horária e redução proporcional de proventos do servidor público, segundo
os julgados reiterados (jurisprudência), quando de comum acordo entre servidor
e administração, com a devida justificativa. De uma forma geral, a
flexibilização da jornada de trabalho é uma possibilidade no âmbito privado,
mas tem seus efeitos mitigado se levarmos para a percepção para o funcionalismo
público”.
O advogado reitera que o projeto é operante somente como uma
emenda à Constituição, a ser revisto e estudado em modo de “cláusula pétrea”,
ou seja, artigos que não podem ser alterados na presente conformação jurídica
do Estado. A opinião compartilhada pelo advogado é de que a medida “é uma
tentativa de fragilização da estabilidade do servidor público como uma
alternativa em prol de uma narrativa. Ignorando o instituto da estabilidade que
assegura o servidor contra abusos políticos que ofendem os princípios
constitucionais da administração, máxime o da moralidade”. Sobre a situação de
calamidade pública, Martinho Vasconcelos diz que a cena permite excepcionalidades
bastantes diversas dos pretendidos pelo legislador, mas, visto que, os órgãos
estão dispensados de atingir resultados fiscais, no momento, não há nenhum
estado excepcional deflagrado que permita a redução salarial.
Além da discussão específica sobre os preceitos da
Constituição das Leis do Trabalho (CLT), a perspectiva humana é outro ponto
delicado para o debate, visto que, os subsídios e vencimentos são verbas de
natureza alimentar, ou seja, são provenientes do sustento de quem os recebe e
classificam-se como necessários para a manutenção da vida do cidadão e,
portanto, segurados pelo regime constitucional.
Fonte: cidadeverde.com