O Globo - 01/03/2012
Aprevidência social foi, sem dúvida, um dos grandes avanços
civilizatórios introduzidos a partir do século XIX. Dentro do princípio pelo
qual os que trabalham se solidarizam com aqueles que perdem a capacidade
laboral, o sistema se disseminou pelo mundo desde que o então chanceler alemão
Otto von Bismarck decidiu institucionalizá-lo.
Em pleno século XXI, muitos habitantes do planeta ainda não
são amparados pela previdência. Somente há poucos anos é que o sistema foi
instituído na China, cujo processo de urbanização se acelerou a partir da
década de 1980 (quase sempre a previdência se universaliza primeiro entre
trabalhadores urbanos; na área rural, a questão é mais complexa).
Na Europa, desde o fim da Segunda Guerra Mundial o sistema é
universal. O continente tem hoje uma população envelhecida, e as regras antigas
da previdência são geradoras de enormes déficits. Por isso, vários países
europeus têm sido obrigados a reformar seus sistemas previdenciários,
aumentando o tempo de contribuição ou a idade mínima para aposentadoria.
No Brasil, as regras da previdência também se
desatualizaram, permitindo a aposentadoria precoce e o pagamento de pensões em
condições absurdas, além de privilégios para os servidores públicos. O
resultado é um déficit já elevado — R$ 66 bilhões este ano, para um milhão de
inativos, enquanto os 23 milhões do INSS geram um rombo inferior a R$ 40
bilhões —, e que tende a se agravar com o passar do tempo. Algumas reformas
reduziram o ritmo de expansão do déficit, mas não garantiram a solvência
financeira do sistema no longo prazo.
Outras mudanças serão necessárias, e felizmente a Câmara de
Deputados acaba de aprovar o projeto que institui fundos de previdência
complementar para os servidores públicos federais.
Cabe agora aos senadores referendá-lo, o mais breve
possível, para que a União possa contratar servidores nas novas bases.
Instituídos os fundos de previdência complementar, a
aposentadoria dos novos servidores terá o mesmo teto do Regime Geral (INSS),
hoje R$ 3,9 mil. Antigos servidores manterão o privilégio de passar para a
inatividade tendo como referência seus últimos vencimentos. No entanto, como
haverá uma grande renovação do quadro funcional da União nos próximos anos
(pois 40% dos atuais servidores terão mais de 60 anos a partir de 2014 e
poderão se aposentar), abriu-se uma oportunidade para desarmar a bomba relógio
em que se transformou o regime próprio de previdência do funcionalismo federal.
Pelas novas regras, futuros servidores poderão até mesmo se
tornar inativos com rendimentos acima do que receberiam pelas regras antigas. A
diferença é que terão de contribuir efetivamente para isso. A União arcará com
uma contrapartida obrigatória às contribuições, multiplicando a geração de
poupança individual.
No curto prazo, esta contrapartida até significará mais
gastos federais com a previdência, porém os resultados a médio e longo prazos
serão enormes, não só para servidores em particular, mas para todo o país. É um
modelo que merece ser copiado por estados e grandes municípios que mantêm
regimes próprios de previdência. O Estado de São Paulo saiu à frente. Não se
trata de uma reforma de interesse partidário, e sim da nação.