Autor(es): Carlos Higino
Correio Braziliense - 08/09/2011
Secretário de Transparência e Controle do GDF
A questão dos altos salários de alguns servidores públicos é
tema que sempre interessa à sociedade. Não por acaso foi, há duas décadas, uma
das principais bandeiras que ajudou a eleger Fernando Collor presidente da
República. No entanto, depois de mais de uma emenda ao artigo da Constituição
que trata do assunto, muito se avançou.
O estabelecimento de um teto para a remuneração dos
servidores públicos foi, ao lado da vedação ao nepotismo, uma das medidas que
mais contribuiu para a moralização da administração pública. A existência de
gratificações e vantagens que multiplicam os salários dos servidores deve ter
limite, já estabelecido constitucionalmente e que deve ser cumprido.
Todavia, embora a casa esteja construída e a altura do teto
definida (o subsídio do ministro do Supremo Tribunal Federal), não há consenso
jurídico sobre o que fica fora ou dentro dela. Nos últimos dias, ações do
Ministério Público contra a Câmara dos Deputados e o Senado Federal ganharam
grande repercussão na mídia. O problema, no entanto, está longe de se
restringir ao Poder Legislativo.
No Poder Executivo, vários ministros e secretários estaduais
e municipais recebem pagamentos pela participação em conselhos de administração
e fiscal de empresas estatais, que também não são considerados para cálculo do
teto.
O próprio Ministério Público e o Poder Judiciário possuem
vários membros com remunerações acima do teto. Os conselhos nacionais do
Ministério Público (CNMP) e da Justiça (CNJ) baixaram resoluções que permitem
que os pagamentos referentes à atuação de seus membros na Justiça Eleitoral
extrapolem o teto. Além disso, caso os promotores ou juízes lecionem em
instituições públicas, as respectivas remunerações ficam fora do teto.
Há um grande debate sobre a aplicação do teto aos servidores
que podem ocupar cumulativamente dois cargos públicos, tais como professores e
profissionais de saúde. Nesse contexto, a divergência é se teriam direito ao
teto dobrado, ou caso trabalhem em entes distintos, União e um estado, por
exemplo, qual dos dois tetos aplicar.
O próprio Tribunal de Contas da União possui entendimento de
que a aplicação do teto no caso de servidores de entes federados distintos
(União, Distrito Federal, estados e municípios) é uma norma de eficácia
limitada, ou seja, depende da aprovação de lei federal específica para
regulamentar quem será responsável por aplicar o teto e como fazê-lo. Nesse
caso, dependemos da atuação conjunta do Poder Executivo Federal, a quem cabe
apresentar o projeto, e do Congresso Nacional, que o analisará e votará.
Vários outros pontos controversos, todavia, podem ser
resolvidos pelo Poder Judiciário. As ações propostas pelo Ministério Público
contra a Câmara e o Senado têm a vantagem de suscitar essa discussão. Porém,
como tiveram que ser iniciadas na primeira instância, talvez levem muito tempo
para gerar uma solução pacificadora.
Dessa forma, tendo em vista que a maior parte dessas
controvérsias já chegou aos tribunais superiores, entendo que o Supremo
Tribunal Federal deveria priorizar o tema. O ministro Marco Aurélio Mello já
concedeu repercussão geral a um recurso extraordinário sobre o tema (RE nº
612.975), ora discutido naquela Corte. Uma vez que as ações no Supremo
comportam discussão mais ampla, seria interessante que o STF tentasse responder
à maior parte dos questionamentos relevantes e imprimisse caráter erga omnes
(isto é, seus efeitos atingem a todos) à sua decisão, ou mesmo editasse súmula
vinculante a respeito.
No campo do combate aos supersalários, a sociedade
brasileira já percorreu a maior parte do caminho, mas a moralidade pública não
comporta meias soluções. É chegada a hora de a instância máxima do Poder
Judiciário se posicionar definitivamente sobre o teto remuneratório.