CRISTIANE BONFANTI
CORREIO BRAZILIENSE
- 03/12/2011
AGU acerta o ressarcimento a servidores inativos
de benefícios por desempenho pagos ao pessoal da ativa
O advogado-geral da União, Luís Adams, admitiu direito a
inativos
O governo federal terá uma despesa extra de pelo menos R$
600 milhões para ressarcir servidores e aposentados e pensionistas que cobram
na Justiça a gratificação dadas a funcionários da ativa. Segundo a
Advocacia-Geral da União (AGU), essa fatura envolve 200 mil processos em que o
pagamento é considerado líquido e certo.
A conta, já sacramentada por meio da conciliação conduzida
pela AGU, preocupa a equipe econômica, que vem alardeando para os riscos do
aumento das despesas públicas em meio à crise que assola a Europa e ameaça a estabilidade
do mundo, inclusive a do Brasil. No Ministério do Planejamento, estima-se que a
fatura total cobrada pelos inativos referentes às gratificações de desempenho —
criadas para aumentar os salários e premiar quem produz — pode chegar a R$ 5
bilhões.
“Uma vez que o advogado-geral da União, Luís Inácio Lucena
Adams, reconheceu o direito dos inativos em normativos internos, já é certo que
o governo abrirá os cofres para atender a esses 200 mil processo, ainda sem
data para serem concluídos”, disse um técnico do Planejamento.
José Roberto da Cunha Peixoto, diretor do Departamento de
Estudos Jurídicos e Contencioso Eleitoral da PGU, afirmou que, do total de
ações, 120 mil dizem respeito à gratificação de desempenho de atividade
técnico-administrativa. “São processos tanto individuais quanto coletivos. Em
alguns casos, por exemplo, há 2 mil servidores envolvidos. Não é fácil mensurar
o total de pessoas beneficiadas”, afirmou o advogado. A demanda é tamanha que,
ao longo desta semana, o análise dos pedidos chegou a integrar a Semana
Nacional de Conciliação, organizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
A corrida à Justiça deve-se à lentidão do Ministério do
Planejamento e do Palácio do Planalto, que deixaram esse tipo de benefício sem
regulamentação por até 12 anos. A brecha criou uma série de problemas e inundou
o Judiciário de processos. Ao todo, entre 1998 e 2008, foram criadas 64
gratificações no Executivo, todas dando direito ao recebimento da eventual
diferença. Os trabalhadores que podem receber a parcela estão espalhados por 92
órgãos da administração direta, de fundações e autarquias — são 570 mil ativos
e 565 mil aposentados e pensionistas.
Enxurrada
Conforme as leis que instituíram a remuneração variável por
produtividade, os aposentados e pensionistas tinham direito a receber entre 30%
e 50% do valor da gratificação, enquanto os ativos faziam jus a 80%, pelo menos
até a regulamentação. Sem uma decisão, os inativos buscam essa diferença na
Justiça. “O erro da União foi não ter feito uma regulamentação mais precisa
para que, de fato, apenas quem produzisse mais fosse beneficiado”, criticou o
economista Raul Velloso, especialista em contas públicas. Procurado, o
Ministério do Planejamento informou que o responsável pelo tema estava em
viagem ao exterior.
A enxurrada de demandas começou porque o governo demorou
para definir o modelo de avaliação dos funcionários. Somente em março do ano
passado, o Executivo publicou decreto com as regras para a avaliação individual
dos servidores de 48 gratificações. Antes disso, nove delas tiveram as normas
definidas entre 2007 e 2009. Outras oito estão na fila. Os valores variam de R$
80 a R$ 400 por mês, de acordo com o nível e o padrão do servidor. Todos que se
aposentaram nas mesmas funções que hoje têm o diferencial podem recorrer à
Justiça. Contudo, só é possível obter as parcelas não repassadas nos cinco anos
anteriores ao ajuizamento da ação.
Na avaliação de Marlos Lima, professor da Fundação Getulio
Vargas (FGV) e diretor da Cenários Prospectivos Consultoria, a concessão dos
benefícios aumentará o deficit da previdência do setor público, que já acumula
rombos da ordem de R$ 52 bilhões por ano, e causará impacto no resultado fiscal
do país. “O governo precisará captar mais recursos, o que pressionará a taxa
básica de juros (Selic) para cima. Juros mais altos, menos investimento, menos
consumo, menos emprego. Em uma época em que lutamos para escapar dos efeitos da
crise internacional, esse não é um cenário promissor”, analisou. (Colaborou Ana
d’Angelo)
Ponto pacífico
O direito dos aposentados e pensionistas está pacificado em
todas as instâncias. Tanto o Superior Tribunal de Justiça quanto o Supremo
Tribunal Federal já reconheceram que eles têm o direito ao valor recebido pelo
pessoal da ativa até que, efetivamente, haja a avaliação por desempenho. Em
abril de 2010, a Advocacia-Geral da União emitiu súmula no mesmo sentido e
orientou sua equipe a não recorrer das sentenças.
Dinheiro à vista
Governo quer encerrar logo processos que pedem diferenças de
gratificações por desempenho
Quem está na lista da AGU?
Servidores públicos aposentados ou pensionistas que moveram
ações individuais ou coletivas exigindo o recebimento dos valores pagos aos
servidores ativos da mesma carreira, a título de gratificação por desempenho,
já com ganho de causa pelo menos na primeira instância.
Qual o motivo das demandas?
Desde 1998, o governo federal vem criando gratificação por
desempenho que atingem 90% dos servidores ativos. Aos inativos, as medidas
provisórias e leis que criaram a remuneração variável estabeleceram o repasse
de um índice entre 30% e 50% do pago aos ativos. Os aposentados e pensionistas
foram então à Justiça pleitear a totalidade paga aos que estão na atividade.
O que o Judiciário decidiu?
Por falta de regulamentação da avaliação individual dos
funcionários que trabalham, o Judiciário estendeu a gratificação integral para
os inativos, alegando ser de caráter genérico, portanto, extensível também aos
inativos na mesma proporção. Somente em 2009, o governo começou a regulamentar
a avaliação dos servidores ativos.