Denise Rothenburg
Correio Braziliense - 20/12/2011
Nas Entrelinhas
Antes do envio do Orçamento, os chefes dos Três Poderes
costumavam se sentar à mesa para discutir o que seria possível conceder em
termos de planos de carreira e de reposições salariais. Mas, desta vez, não
ocorreu. Falharam todos e agora ninguém quer ceder
Nos últimos anos, tem sido cada vez maior a participação do
Poder Judiciário em questões antes restritas ao Poder Legislativo. Neste fim de
2011, chegou ao extremo de até o Orçamento da União entrar nessa roda. Começa a
ocorrer o que o primeiro-secretário da Câmara, Eduardo Gomes, classificava
ontem como "Judicialização do Orçamento". Primeiro, o Supremo
Tribunal Federal (STF) mandou avisar que a sua proposta orçamentária de R$ 614
milhões deveria ser incluída na íntegra do projeto da Lei Orçamentária do ano
que vem. Ontem, houve o mandado de segurança preparado pelo Sindicato dos
Trabalhadores do Poder Judiciário e do Ministério Público da União no Distrito
Federal (Sindjus) pedindo a inclusão do reajuste de 14,79% no Orçamento de
2012.
Se o STF der razão ao Sindjus, estará criado um impasse, uma
vez que o relator do Orçamento, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), preferiu
ficar com a posição da presidente Dilma Rousseff e não ceder às pressões de
reservar recursos para aumentos salariais num ano que promete ser de segurar o
gasto público. E, como a pressa em votar o Orçamento é mais dos parlamentares
do que do governo, é bem provável que os congressistas terminem seguindo o que
pede a presidente Dilma, evitando, assim, atrasos na liberação das emendas individuais.
O que mais interessa aos deputados e senadores no Orçamento
é atender as prefeituras antes de junho, quando é aberta oficialmente a
temporada de campanhas municipais e ficam proibidas as assinaturas de convênios
ou novos empenhos de recursos dentro das "transferências voluntárias"
— no popular, aquelas que o Poder Executivo costuma fazer porque o deputado
pediu. O Poder Executivo, por sua vez, não quer gastar. Portanto, o que se diz
no governo é que, se houver um grande estremecimento, o Orçamento fica mesmo
para ser aprovado em 2012, sem estresse da parte da presidente Dilma Rousseff,
que aproveitará o início do ano para conter despesas.
Qualquer rusga nessa seara nos próximos dias será uma boa
desculpa para não votar o Orçamento. E Dilma ainda sai como aquela que está
protegendo o dinheiro público do aumento de salários, muitos dos quais já
altos. Basta ver o que disse a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, na
semana passada, quando esteve no Congresso. Ela avisou que a prioridade do governo
eram os programas destinados à redução das desigualdades sociais. O recado foi
claro: O caixa da União é o mesmo para os Três Poderes, ou seja, os impostos do
contribuinte. E, entre atender os mais pobres e dar aumento a quem já tem um
bom salário, o governo ficará com a primeira opção.
Isso já havia sido dito na mensagem que Dilma enviou ao
Congresso em agosto com a proposta orçamentária. Naquela época, os cálculos do
governo indicaram que o reajuste custaria ao país R$ 7,7 bilhões. Ali, abriu-se
as discussões que agora ganham maiores proporções e levaram à judicialização do
Orçamento, com perspectivas de se criar um impasse sem muita chance de solução
a curto prazo, uma vez que, da parte do Poder Executivo, diz-se que a bola está
com o Congresso e o relator já manifestou a sua posição.
Por falar em perspectiva...
Geralmente, antes do envio do Orçamento, os chefes dos Três
Poderes costumavam se sentar à mesa para discutir o que seria possível conceder
em termos de planos de carreira e de reposições salariais. Mas, desta vez, não
ocorreu. Falharam todos e agora ninguém quer ceder. Nos bastidores não só do
Parlamento como do Poder Judiciário, diz-se que, no Executivo, não falta
dinheiro para a criação de ministérios, preenchimento de cargos de confiança, o
Programa de Aceleração do Crescimento e as obras da Copa. Mas há uma escassez
para os outros Poderes.
Não será com essas reclamações de coxia que os chefes dos
Três Poderes chegarão a um consenso para que cada um exerça o seu papel sem
ferir os brios do outro. Por isso, espera-se que, em 2013, em nome da tal
"harmonia e independência" entre os Poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário, os principais protagonistas dessa história não a deixem chegar a
esse ponto.