Valor Econômico - 14/05/2012
O procedimento da presidente Dilma Rousseff de não
incorporar as propostas do Judiciário e do Ministério Público da União ao
projeto de lei do Orçamento de 2012, encaminhado ao Congresso Nacional em
agosto, está sendo questionado no Supremo Tribunal Federal. A Associação
Nacional dos Agentes de Segurança do Poder Judiciário ingressou com ação direta
de inconstitucionalidade por omissão da presidente Dilma, com pedido para que o
STF determine correção de rumos à presidente e que o Congresso aprecie o
projeto de lei orçamentária considerando a proposta encaminhada pelo
Judiciário.
Dilma enviou, em separado, as propostas de elevação de
salários dos servidores do Judiciário e do MPU. Em mensagem ao Congresso, ela
explicou não ter incluído as propostas na peça orçamentária de 2012 por causa
do quadro de incerteza da economia mundial. "Um aumento excessivo na
despesa primária do governo central traria insegurança e incerteza sobre a
evolução da economia brasileira em um contexto internacional já adverso",
diz a mensagem. Os aumentos salariais representariam acréscimo de R$ 7,7
bilhões este ano na despesa da União com pessoal.
A ação da Agepoljus está sendo relatada no STF pelo ministro
Joaquim Barbosa. Na semana passada, o Valor informou que Barbosa recebeu um
parecer do procurador geral da República, Roberto Gurgel, considerando o
procedimento de Dilma inconstitucional. Seu argumento central é que a
Constituição, em seu artigo 99, garante a autonomia administrativa e financeira
do Judiciário. Segundo o texto, os tribunais têm a prerrogativa de elaborar
suas propostas orçamentárias dentro dos limites estipulados conjuntamente com
os demais Poderes na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
Gurgel observa que tal prerrogativa só poderá ser limitada
em duas hipóteses. Se os presidentes do STF e dos Tribunais Superiores não
encaminharem as propostas dentro do prazo estabelecido pela LDO ou se as
propostas estiverem em desacordo com os limites estipulados também na LDO. Na
mensagem ao Congresso, Dilma não diz ter ocorrido uma das duas hipóteses, nota
o procurador. "Parece fora de dúvida que o procedimento adotado (por
Dilma) está em desconformidade com o tratamento que a Constituição confere ao
tema."
Ele pondera, porém, que a pronúncia de nulidade da lei
orçamentária deste ano imobilizaria completamente o Estado, já que toda e
qualquer atividade está sujeita à alocação de recursos previamente autorizados
no Orçamento. A solução que o procurador geral propõe ao Supremo é exortar a
presidente da República a incorporar, no projeto de lei orçamentária de 2013,
as propostas do Judiciário e do MPU.
É preciso observar, no entanto, que a Constituição diz que
os tribunais elaborarão suas propostas orçamentárias dentro dos limites
"estipulados conjuntamente com os demais Poderes na LDO". O problema
é que a LDO válida para 2012 não estabeleceu os limites específicos para
aumento de remuneração dos Poderes, transferindo a atribuição à lei
orçamentária. Por isso, no que se refere a pessoal e encargos, as propostas dos
três Poderes estão condicionadas apenas à determinação da LDO de que só serão
incluídos no Anexo V do Orçamento os projetos de reestruturação de cargos e
aumento de remuneração que estiverem tramitando no Congresso até 31 de agosto.
Sendo assim, o que cabia ao Executivo era simplesmente incorporar na peça
orçamentária as propostas do Judiciário e do MPU.
Especialistas da área de finanças públicas garantem que
nenhuma outra LDO de anos anteriores estabeleceu esses limites específicos,
como manda a Constituição. Há, portanto, uma lacuna no processo orçamentário
brasileiro que está na origem do atual conflito entre o Judiciário e o
Executivo. A pergunta que precisa ser feita é com base em quais limites o
Judiciário e o MPU estão elaborando as suas propostas de aumento de
remuneração. A mesma pergunta se aplica ao Legislativo e ao Executivo.
Em seu parecer, Gurgel observa que, para gastos com pessoal
e encargos sociais, "o limite da LDO é o mesmo da lei de responsabilidade
fiscal, ou seja, 50% da receita corrente líquida prevista para 2012".
Como
os gastos com pessoal da União estão bem abaixo desse limite, Gurgel conclui
que as propostas salariais do Judiciário e do MPU não infringem os preceitos
constitucionais. É importante observar, no entanto, que os limites fixados na
LRF são tetos máximos para as despesas com pessoal e não diretriz a ser seguida
na elaboração do orçamento de um determinado exercício. É urgente, portanto,
que os três Poderes definam conjuntamente na LDO os limites para as suas
propostas salariais. Só assim esse conflito entre Poderes será resolvido e
evitado no futuro.