Leandro Kleber
Correio Braziliense - 03/07/2012
Parte das empresas com capital público aproveita brecha na
legislação para não divulgar os salários dos servidores. Desculpa é de que a
medida atrapalharia a competitividade
As estatais consideradas estratégicas pelo governo e que
competem nos mercados financeiro e de energia decidiram não publicar os
salários de seus diretores e funcionários na internet. Como a regulamentação da
Lei de Acesso à Informação obriga apenas as empresas públicas que não atuam sob
concorrência a divulgarem as remunerações de servidores, Banco do Brasil, Caixa
Econômica Federal, Petrobras e Eletrobras adotaram a brecha e optaram por não
publicar os dados. Nada referente a salários, auxílios, ajudas de custo e
jetons será divulgado na internet, ao contrário do que já faz o Executivo com
os contracheques individuais de 569 mil pessoas no Portal da Transparência.
Um universo de mais de R$ 34 bilhões e, pelo menos, 260 mil
funcionários não estarão dentro das regras de transparência adotadas pela maior
parte do funcionalismo. Economistas criticam o que chamam de
"caixa-preta" do orçamento público, mas há também quem defenda a não
publicação dos contracheques. As empresas com participação de 100% das ações nas
mãos da União — ou perto disso —, como os Correios e a Infraero, prometem
divulgar a relação dos seus trabalhadores com os respectivos salários até o fim
deste mês.
Inicialmente, a Lei de Acesso à Informação, de novembro de
2011, determinava que as empresas públicas teriam de garantir o acesso a
informações de interesse particular ou coletivo. Porém, o decreto de
regulamentação da exigência, publicado em maio deste ano, trouxe a novidade de
que a divulgação de informações dessas empresas, em regime de concorrência,
estará submetida às normas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), "a
fim de assegurar sua competitividade, governança corporativa e, quando houver,
os interesses de acionistas minoritários". Além disso, as estatais ainda
ganharam outro reforço técnico. Portaria publicada pelo Ministério do
Planejamento garantiu que as empresas públicas que atuam em regime de
concorrência, de fato, não são obrigadas a disponibilizar as informações.
Para o economista Gil Castello Branco, secretário-geral da ONG
Contas Abertas, as estatais são um capítulo à parte na Lei de Acesso à
Informação. "É uma batalha. Elas não estão acostumadas com transparência.
Sempre foram no Brasil essa enorme caixa-preta e estão resistindo à lei e
saindo de fininho", afirma. O economista diz que o fato de atuarem no
mercado competitivo não pode ser usado como justificativa, pois as informações,
segundo ele, não têm nada a ver com caráter competitivo. "O governo tem a
maior parte do capital dessas empresas. As informações são banais. As estatais
se escondem atrás dessa bandeira da competitividade", acredita.
Recursos públicos
A opinião é compartilhada pelo economista Roberto
Piscitelli, professor da Universidade de Brasília. Segundo ele, os valores
pagos pelas empresas a seus funcionários "passam pelos cofres
públicos". "A maioria do capital não é do Estado, do conjunto dos
cidadãos? Então por que BNDES e Petrobras, por exemplo, que se mantêm à custa
de recursos públicos, não podem divulgar? Se é para valer, todo mundo tem que
colocar sua cara a tapa", afirma.
Mas há quem defenda a não publicação dos salários na
internet. O ex-superintendente da área de relações com empresas da CVM Fábio
Fonseca garante que a divulgação do salário de uma empresa de capital aberto
não muda a decisão de um investidor na hora de aplicar o seu dinheiro.
"Isso não agrega nada ao mercado. A informação de mercado de companhia
aberta é a que leva o investidor a investir, a vender ou a fazer nenhum dos
dois. As empresas privadas também não fazem isso. O dado de que um engenheiro
da Petrobras ganha R$ 25 mil trabalhando numa refinaria não agrega nada",
diz. Ele lembra que os gastos dos conselhos das estatais são publicados
anualmente e que, com eles, é possível saber quanto cada conselheiro ganha.
Quantidade de empregados:
Prometem divulgar:
Correios — 121 mil
Infraero — 14 mil
Não vão divulgar:
Banco do Brasil — 119 mil
Caixa Econômica Federal — 88 mil
Petrobras — 59 mil
Eletrobras — 1,4 mil