Simone Kafruni
Correio Braziliense
- 16/09/2013
A aprovação em concurso público não é garantia de nomeação
para o cargo escolhido. Um dos casos mais escandalosos é o do Procon/DF, que
nomeou 117 inscritos no último processo seletivo, mas apenas 76 foram
efetivados, enquanto mantém 162 comissionados. A falta de regulamentação
nacional dos certames impede que os aprovados tenham seu direito assegurado.
Candidatos com boa colocação nos certames deixam de ser
chamados para as vagas previstas, que permanecem ocupadas por apadrinhados
políticos. A farra dos concursos tem levado até as últimas
consequências, diretamente às portas da Justiça, o sonho de muitos
brasileiros de ter estabilidade no emprego e receber salários acima da média
do mercado. O problema é que os órgãos públicos abrem vagas, criam
expectativas nos concurseiros, que investem tempo e dinheiro para serem
aprovados e depois não conseguem ser nomeados.
Apesar dos gastos exorbitantes com as bancas examinadoras,
que desde 2011 somam R$ 400 milhões apenas no âmbito do governo federal, os
concursos não oferecem a mínima segurança de contratação aos aprovados: o
preenchimento das vagas esbarra no interesse de que correligionários ou
apadrinhados políticos ocupemos cargos — que deveriam ser dos concursados —
como terceirizados ou comissionados.
O caso do Instituto de Defesa do Consumidor do Distrito
Federal (Procon-DF) se tornou emblemático. A entidade nomeou 117 inscritos no
último processo seletivo, realizado em 2011, para o qual foram abertas 200
vagas. Mas apenas 76 aprovados foram efetivados. "Infelizmente, isso
acontece, e não é de agora. Muitos só são empossados ao fim do prazo de
validade da seleção. Isso quando conseguem assumir"", disse o
presidente do Gran Cursos, José Wilson Granjeiro.
Na opinião de Granjeiro, um dos problemas que emperram as
posses é o contingente excessivo de cargos comissionados. Só no Procon-DF são
162. "O número é três vezes mais que o de funcionários efetivos. Isso é
uma afronta a todos os concursados e àqueles que querem servir. O percentual de
comissionados em cada órgão deveria ser de, no máximo, 10% do quadro de
servidores", avaliou. No Poder Executivo Federal, existem 22 mil
comissionados, de acordo com o Ministério do Planejamento. Há 650 mil funcionários
públicos civis na ativa.
Três anos de espera
O caso do Procon-DF não é isolado. Em fevereiro deste ano,
aprovados no concurso das Secretarias de Saúde e Administração de Águas Lindas
(GO) protestaram no caminho entre a Câmara dos Vereadores e a prefeitura da
cidade por conta de vencimento do prazo sem nomeações. Em agosto, um grupo de
mulheres do Rio de Janeiro reivindicou, em protesto, a nomeação para a Polícia
Militar do estado. Elas ficaram três anos na fila de espera. No Amazonas, mais
de 400 candidatos aguardavam, desde 2009, a nomeação para o Corpo de Bombeiros
do estado. Apenas neste ano, a corporação sinalizou para que as contratações
sejam feitas.
Para o presidente do Grupo Vestcon, Ernani Pimentel, há
interesses de políticos para a não nomeação de aprovados. "Muitos
terceirizados e comissionados são usados como cabos eleitorais", afirmou.
Ele conta que, no interior, a situação é ainda pior. "Tem concursos que
são abertos por bancas inexistentes para favorecer uma minoria. É uma
tradição velha e viciada de apadrinhamento daqueles que querem se manter no
poder", comentou.
Na avaliação do subprocurador geral da República Francisco
Rodrigues dos Santos Sobrinho, membro da Câmara de Coordenação e Revisão do
Ministério Público Federal (MPF), que trata de concursos públicos, os
aprovados em cadastro reserva não têm direito à nomeação. "Mesmo surgindo
vaga, o gestor pode entender que falta dotação orçamentária para criação do
cargo. Agora, se há vagas, é obrigatório nomear", avaliou.
Jurisprudência
O tema gera polêmica entre os concursandos, que, cada vez
mais, recorrem ao Judiciário para tentar garantir a contratação. Na falta de
uma regulamentação nacional para os concursos públicos, os conflitos são
decididos pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Para o
consultor jurídico Max Kolbe, membro da comissão de fiscalização de concursos
públicos da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal (OAB/DF), os
primeiros colocados nos certames têm o direito de serem nomeados. "Quando
um edital estipula um número de vagas, os aprovados têm que ser nomeados
durante o período de vigência do concurso, que é de dois anos, prorrogáveis por
mais dois", afirmou.
No caso de cadastros de reserva, Kolbe exemplificou, como
não existe lei sobre o assunto, que a Justiça tem entendido que o aprovado em
primeiro lugar tem direito de ser nomeado dentro do prazo se surgirem vagas na
eventualidade de invalidez, aposentadoria ou morte de servidores. "Outro
caso em que a Justiça dá ganho de causa ao concursando em cadastro reserva é
quando ele consegue provar que um terceirizado ou comissionado está exercendo
a função para a qual ele foi aprovado", explicou o consultor.
No caso específico do Procon- DF, alertou Kolbe, o Tribunal
de Contas do Distrito Federal (TCDF) exigiu a nomeação dos aprovados em
substituição aos funcionários comissionados. O Procon ganhou um prazo de 60
dias para se manifestar ou acatar a determinação, caso contrário o tribunal
poderá aplicar multas. O diretor geral do Procon-DF, Todi Moreno, chegou a
afirmar que o instituto tem o interesse de empossar os aprovados. "Somos
a favor da decisão do TCDF, mas não cabe a nós, do Procon, realizar essas
nomeações, porque esse papel é da Secretaria de Administração Pública",
justificou, lembrando que enviou quatro ofícios para a SEAR reiterando o
pedido.
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