BSPF - 05/01/2014
O Supremo Tribunal Federal (STF) volta a julgar em breve o
polêmico, controverso e recorrente tema que pode onerar a folha de pagamento de
União, de Estados e municípios: o aproveitamento de servidores de nível médio
em carreiras de nível superior. O assunto, segundo técnicos, se não for
juridicamente bem fundamentado, resultará em retrocesso de proporções
imprevisíveis, abrindo espaço para novo trem da alegria - promoção e
consequente aumento de salário de servidores, sem concurso público.
O caso atual se refere a um Recurso Extraordinário (RE) do
Tribunal de Justiça de Roraima (TJ-RR), envolvendo ocupantes do cargo de
oficial de justiça de nível médio ao novo cargo de oficial de justiça, que
exige formação superior. O relator do RE, ministro Marco Aurélio, a princípio,
tendo em vista o impacto do caso, reconheceu a repercussão geral da matéria -
traduz o entendimento da Corte de que o tema é mais abrangente que a situação
específica de Roraima e que carece de decisão única que sirva de base a outros
julgamentos semelhantes.
Segundo informações do TJ-RR, o órgão, atualmente, tem 52
oficiais de nível médio (cargo em extinção, com remuneração de R$ 2.789,37) e
há previsão legal de 13 vagas para nível superior, com o dobro do salário (R$
5.578,66). Para o TJ, permitir que o pessoal de nível médio receba salários de
nível superior equivale a uma ascensão funcional que ofende a Constituição,
porque propicia o ingresso em cargo diferente daquele que foi anteriormente
investido.
A Assembleia Legislativa de Roraima defende o enquadramento
dos profissionais, uma vez que a carreira para qual fizeram concurso,
independente de suas interferências, passou a ser privativa de nível superior.
Portanto, não existe irregularidade e nem transposição de cargos, pois não foi
criada nova carreira, “haja vista serem iguais as atividades desempenhadas
pelos oficiais de justiça com escolaridade média e superior”, justifica a
Assembléia.
O advogado Jean Paulo Ruzzarin, que representa o Sindicato
dos Oficiais de Justiça do Estado de Roraima (Sindojerr), explicou que, até
2011, a exigência de ingresso era nível médio. “A Assembléia Legislativa
reconheceu a isonomia salarial, mas o TJ negou. Imagine o desestímulo que vai
gerar o fato de duas pessoas fazerem o mesmo serviço, uma ganhando o dobro da
outra”, ressaltou.
O professor Washington Barbosa, coordenador dos cursos
jurídicos do Gran Cursos, ressaltou que, “a transposição de cargos é uma excrescência”
e que, depois da Constituição de 1988, não há outra forma de ingresso para
administração pública que não seja por concurso. “Porém, se, no passado, o
cargo fazia uma exigência para habilitação e agora faz outra, isso não é
transposição. Essas pessoas fizeram seu concurso especificamente para oficial
de justiça. Não foi uma seleção genérica”, destacou.
O STF, lembrou Barbosa, já condenou situações nas quais
havia desvio de função e intenção clara de dar estabilidade a apadrinhados,
independente de processo seletivo. “Há cerca de cinco ano, entretanto, em um
julgamento com viés político, o STF admitiu, no INSS e na Receita Federal, uma
transposição de nível médio para superior. Logo depois, negou o mesmo direito
aos assistentes jurídicos dos tribunais, que desempenhavam no dia a dia a
função de procuradores. Enfim, como, nesse período, a composição do STF mudou,
é bem-vindo o reconhecimento da repercussão geral da matéria”, disse.
Há centenas de processos sobre o assunto. Todos ficam
parados, aguardando análise - semelhante ao que está ocorrendo no TJ-RR - sobre
se é possível, em função da extinção de cargo de nível médio, o aproveitamento
dos servidores em cargo de nível superior, sem o correspondente concurso
público
Ainda não é possível avaliar o impacto financeiro, no caso
de o Tribunal decidir em favor dos servidores, porque cada órgão em que exista
essa demanda terá que divulgar o número de envolvidos e apontar as diferenças
remuneratórias. “É preciso uma limpeza na administração pública, que muitas
vezes provoca esses desequilíbrios, ao preferir contratar um técnico mais
barato e desviá-lo de função, mesmo tendo um aprovado de nível superior à
espera de contratação”, denunciou Barbosa.