Agência Brasil
- 22/09/2014
Preocupados com a possibilidade de a presidenta Dilma
Rousseff vetar projeto de lei complementar que reconhece os papiloscopistas
como peritos oficiais – o PLC 78/2014, aprovado no último dia 3 pelo Congresso
Nacional –, aproximadamente 120 papiloscopistas da Polícia Federal e de
polícias civis de vários estados estão em Brasília, onde têm se reunido com
autoridades, em busca de apoio. O reconhecimento deles como peritos oficiais,
no entanto, tem sido questionado por entidades representativas dos peritos.
“Nós estamos bastante otimistas de que o projeto seja
sancionado. Fomos muito bem recebidos em todos os órgãos ligados à questão. Nas
conversas, pudemos esclarecer que a preocupação maior do governo, que é o
impacto de um aumento salarial nas contas do governo, não procede”, disse hoje
(22) à Agência Brasil o presidente da Federação Nacional dos Profissionais em
Papiloscopia e Identificação (Fenappi), Antônio Maciel.
Apesar de o projeto não prever aumentos salariais para a
categoria, Maciel confirmou que a estratégia dos papiloscopistas é, em um
segundo momento, pedir equiparação salarial com os peritos. “A luta da
categoria é por aprimorar a legislação. E, já que se faz a mesma coisa
[laudos], equiparar os salários onde for possível. Claro que respeitando a
legislação de cada estado”, ressaltou ele, referindo-se à dificuldade que
alguns estados poderão ter para cumprir com essa equiparação.
Segundo ele, em Brasília um papiloscopista ganha,
inicialmente, cerca de R$ 7,5 mil, enquanto um perito criminal recebe R$ 11
mil”. No caso da Polícia Federal, o salário praticamente dobraria, passando de
cerca de R$ 8 mil para R$ 16 mil, informou o presidente da Associação Nacional
dos Peritos Criminais Federais (APCF), Carlos Antônio Almeida de Oliveira.
Os papiloscopistas são profissionais responsáveis por
identificações civil (para carteiras de identidade e passaportes, por exemplo)
e criminal. Por meio de seu trabalho, identificam criminosos a partir da
análise dos desenhos papilares, como os encontrados nas digitais da mão. Outras
partes do corpo também contém digitais que podem servir como prova material da
presença de um suspeito em um local de crime, ou como prova de que ele tenha
manuseado armas ou objetos para praticar um crime.
Dilma Rousseff tem até o dia 24 (prazo de 15 dias úteis,
contados a partir da aprovação da proposta pelo Legislativo) para sancionar ou
vetar o projeto, que inclui na lista de peritos oficiais definidos pela Lei
12.030/09 a papiloscopia – a exemplo do que já ocorre com as perícias feitas
por médicos legistas, odonto legistas e peritos criminais.
“De hoje até quarta-feira (24), estamos mobilizados. Na
quinta-feira (25), faremos assembleia para decidir o que fazer. Nossa confiança
é grande, porque não temos encontrado resistência do governo”, disse o
representante dos papiloscopistas. Conforme Maciel, o veto ao projeto
resultaria em insegurança jurídica para o país, uma vez que abriria brechas
para invalidar laudos papiloscópicos. “A lei, como está, já possibilitou
questionamentos e suspensão de laudos”, argumentou.
A inclusão da atividade papiloscópica entre as perícias
consideradas oficiais foi vetada anteriormente, em um outro projeto de lei, sob
a justificativa de que entraria em conflito com a lei que regulamenta a perícia
oficial brasileira.“O argumento apresentado na época pelo governo [para vetar o
então PLS 244/08, que tentava classificar papiloscopistas como peritos] era de
que havia um vício de origem. Mas, ao alterarmos a lei original, sanamos a
questão. Portanto, não há mais qualquer desculpa para um veto”, disse Maciel,
momentos antes de participar de reuniões com na Secretaria de Assuntos
Legislativos do Ministério da Justiça e
na Secretaria Geral da Presidência da República.
A mudança na legislação tem encontrado resistência da APCF,
entidade que representa os peritos da Polícia Federal, e da Associação
Brasileira de Criminalística (ABC), entidade nacional de classe dos peritos
criminais oficiais.“A APCF é a favor do veto, porque esse projeto tem o mesmo
teor do anterior [PLS 244/08]. O que ele propõe é uma transposição de cargo. Só
que a Constituição prevê que a perícia oficial só pode ser exercida por quem
passou em concurso público. E cabe ao Executivo fazer isso. Não ao
Legislativo”, disse o presidente da APCF, Carlos Antônio.
Segundo ele, a proposta apresentada pelo Congresso Nacional
cria um outro tipo de perito, “que causará celeuma” na cena de crime, ambiente
que, conforme explicou, contém “centenas, senão milhares” de vestígios
diferentes, além de digitais. “Isso dividiria a gestão de local de crime entre
dois tipos de profissionais. Inclusive aumenta o risco de violar o local, até
porque o [mau] uso de pó químico e pincel para coleta de digitais pode
inviabilizar, por exemplo, o exame de DNA”, ressaltou.
Em nota, a ABC informa que “se opõe a qualquer forma de
burlar o concurso público e de ascensão funcional sem o devido respeito à
legislação vigente e à Carta Maior”. Segundo o presidente da entidade, Bruno
Telles, a diferença entre peritos e papiloscopistas “se faz na complexidade das
atribuições dos cargos, em que os papiloscopistas desempenham atividades de
nível médio, enquanto os peritos oficiais exercem atividades de nível
superior”.
Na avaliação da ABC, a mudança na legislação apresenta
“inconstitucionalidades, como a transposição funcional e o desrespeito ao pacto
federativo, além do impacto orçamentário", observou Telles, que classifica
o caso como uma “manobra para se conseguir ganhos salariais, como já foi
tentado no DF e no Piauí”.