Correio Braziliense
- 16/06/2015
Hoje, 101 mil servidores que poderiam estar em casa
continuam trabalhando. Economia anual com a permanência é de R$ 11,9 bilhões.
Especialistas criticam
O número de servidores públicos do Executivo Federal que
recebem abono permanência é recorde. Atualmente, mais de 101 mil pessoas têm
direito ao benefício, concedido aos funcionários ativos em condições de se
aposentar, mas continuam trabalhando. Diante do desafio de equilibrar as contas
públicas e manter mão de obra qualificada e experiente para gerir a máquina, a
medida é também uma estratégia do governo para economizar e garantir o ajuste
fiscal.
Entre janeiro a maio deste ano, o governo federal gastou, em
média, R$ 94,4 milhões por mês com o abono de permanência. Isso leva à
estimativa de que, em 2015, o desembolso — incluindo o 13º salário — seja de R$
1,2 bilhão, caso a quantidade de servidores beneficiados mantenha-se inalterada.
Para Roberto Piscitelli, professor de economia da Universidade de Brasília
(UnB), a tática é financeiramente vantajosa para a administração pública.
Troca vantajosa
Apesar de o governo perder em receita, uma vez que o
benefício é um reembolso da contribuição previdenciária, o gasto do erário é
inferior ao que seria desembolsado com novas contratações. “Sai muito mais
barato para o Estado pagar o abono. Quando um servidor se aposenta, ele passa a
receber os recursos do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS). Se optasse
por recompor o quadro, o governo teria despesas com a aposentadoria de uma
pessoa e com o pagamento das remunerações do novo funcionário”, explica.
Segundo cálculos do governo de julho de 2014, o custo médio
anual com cada servidor do Executivo Federal era de R$ 129.467 mil. Caso a
pasta comandada pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, cogitasse para
este ano a total substituição dos 101.804 funcionários públicos que recebem o
abono, o governo teria um gasto de R$ 13,1 bilhões apenas com a reposição do
quadro de pessoal. Ao considerar o R$ 1,2 bilhão que devem ser gastos em 2015,
a economia líquida seria de R$ 11,9 bilhões, o equivalente a 21,5% da meta
estipulada para o superavit primário.
A curto prazo, manter o contingente de servidores em abono
permanência pode ser benéfico para o equilíbrio das contas do governo. No
entanto, a medida deve prejudicar a oxigenação da máquina pública. De acordo
com Piscitelli, as despesas com pessoal estão em torno de 30% da receita corrente
líquida, valores abaixo do percentual máximo de 50%, previsto pela Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF).“Com o avanço demográfico da população, que vive
mais anos, diria que, hoje, há uma tendência clara que essa proporção se
acentue à medida que os governos ficam represando a realização de concursos e
nomeação de concursados. Teremos uma máquina pública envelhecida, com buracos
nas carreiras”, critica o economista.
Em um contexto de inflação alta e crédito caro, é natural
que os servidores protelem a permanência na administração pública para manter o
padrão de vida, analisa José Matias-Pereira, professor da UnB. No entanto, para
ele, não são apenas os servidores que ganham com isso. “Para a gestão da
máquina, isso é ótimo. É uma forma de o Estado receber um pouco mais da
colaboração desses trabalhadores, que têm muitos anos de experiência e são
altamente qualificados”, disse.
No entanto, para o especialista, não há um processo de
renovação ordenada. “Muitos concursos saem por decisões pouco consistentes e
muito mais por pressão eventual de dirigentes de determinadas áreas. Muitas
vezes, quando a administração já está entrando em um processo de semiparalisia.
O que temos é um governo postergando decisões e estimulando as pessoas a
permanecerem em atividade por mais tempo”, reclamou Matias.
A falta de uma posição mais estratégica do governo no
equilíbrio do número de trabalhadores qualificados com o ingresso de novos servidores
vai agravar a situação do mercado de trabalho, prevê Carlos Alberto Ramos,
também professor de economia da UnB. “O setor público foi responsável por
empregar grande parcela da atual juventude, que estava saindo das universidades
com ensino superior. Com o mercado de trabalho privado também em crise, não vai
ter setor algum puxando essa gente”, analisou.
Cargo mantido
O número de servidores em condições de se aposentar, mas que
continuam no trabalho, aumentou quase 5 pontos percentuais em seis anos
Período
|
Total de pessoal
|
Total com abono de permanência
|
Proporção (em %)
|
Quanto custa
(em R$ milhões)
|
2009
|
569.343
|
67.020
|
11,7
|
578,0
|
2010
|
587.523
|
76.677
|
13,0
|
725,6
|
2011
|
591.994
|
86.164
|
14,5
|
871,4
|
2012
|
597.915
|
94.367
|
15,7
|
948,2
|
2013
|
609.607
|
99.108
|
16,2
|
1.071,2
|
2014
|
618.578
|
98.311
|
15,9
|
1.170,5
|
2015
|
634.923
|
101.804
|
16,0
|
1.228,0
|
O que é o abono de permanência
Benefício concedido ao servidor que já está em idade de se
aposentar, mas é mantido na função por ser considerado estratégico, já que
detém muito conhecimento da máquina pública
Quem tem direito
Todos os servidores ativos que contribuem para o regime
público de previdência social (RPPS) e que reúnam, no mínimo, uma das condições
constitucionais de aposentadoria voluntária
Mulher
» 48 anos de idade + 30 anos de contribuição + 5 anos no
cargo, além de período adicional de contribuição equivalente a 20% do tempo
que, em 16 de dezembro de 1998, faltaria para atingir os 30 anos de
contribuição
» 55 anos de idade + 30 anos de contribuição + 10 anos de
serviço público + 5 anos no cargo
» 60 anos de idade + 25 anos de contribuição + 10 anos de
serviço público + 5 anos no cargo
Homem
» 53 anos de idade + 35 anos de contribuição + 5 anos no
cargo, além de período adicional de contribuição equivalente a 20% do tempo que
em 16 de dezembro de 1998 faltaria para atingir os 35 anos de contribuição
» 60 anos de idade + 35 anos de contribuição + 10 anos de
serviço público + 5 anos no cargo
» 65 anos de idade + 30 anos de contribuição + 10 anos de
serviço público + 5 anos no cargo
Como ter direito?
Os interessados devem optar, via requerimento, por
permanecer em atividade
Por quanto tempo podem receber?
Pelo tempo que quiserem até aos 70 anos, quando serão
aposentados compulsoriamente
Qual é o valor?
Equivale, exatamente, ao valor da contribuição
previdenciária de 11% sobre o salário, descontada do servidor, mensalmente.
Esse percentual é reembolsado
Fonte: Ministério do Planejamento