Vera Batista
Correio Braziliense
- 08/01/2016
Acréscimo nas despesas, até 2019, será provocado pela
incorporação de gratificações no cálculo do valor dos benefícios da
inatividade. Medida foi um dos pontos aceitos pelo governo na negociação
salarial com os servidores em 2015
Depois que o governo fechou acordo salarial com os servidores
federais, no fim de 2015, e permitiu a incorporação das gratificações (que
representam cerca de 55% da remuneração total) no cálculo das aposentadorias,
em três parcelas até 2019, analistas de mercado, já aflitos com o
descompromisso da equipe econômica com o ajuste fiscal, ficaram ainda mais
apreensivos. Eles garantem que a medida vai agravar o deficit do Regime Próprio
de Previdência (RPPS) do funcionalismo, que atingiu R$ 67,4 bilhões em 2015,
computados os dados até novembro.
O governo nega. Diz que a nova regra terá impacto
praticamente nulo, já que o reajuste dos funcionários, pelo menos nos próximos
dois anos, ficará abaixo da inflação projetada para o período - o que acabará
reduzindo o gasto com aposentados. Afirma também que o novo modelo de
aposentadoria, com a criação da Fundação de Previdência Complementar do
Servidor Público Federal (Funpresp), será capaz de manter o equilíbrio no
futuro.
Nas contas do secretário de Gestão de Pessoas e Relações de
Trabalho do Ministério do Planejamento, Sérgio Mendonça, o governo terá que
desembolsar quase R$ 2,1 bilhões, até 2019, para bancar a incorporação da
gratificação de desempenho para 203 mil servidores. São 69 mil funcionários que
já vestiram o pijama (R$ 1,37 bilhão) e 134 mil que vão se aposentar (R$ 700
milhões). Segundo Sandro Alex de Oliveira Cezar, presidente da Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS), os aposentados, com a
nova regra, vão receber, até 2019, três parcelas a mais de 16,6% nos
contracheques.
Os cálculos são complicados, de acordo com Mendonça, porque
a incorporação não é válida para todos os servidores. Apenas os que entraram no
serviço público depois de 2001, momento em que foi criada a gratificação de
desempenho, e passaram por cinco anos de avaliação, carregam o benefício para a
aposentadoria. Posteriormente, uma mudança legal incluiu servidores que
ingressaram até fevereiro de 2004.
O secretário fez questão de frisar que o dinheiro que irá
para as 134 mil pessoas que ainda não se aposentaram não pode ser considerado
gasto, do ponto de vista técnico. "Não é gasto, indiscutivelmente. Não
haverá expansão de despesa, porque eles já recebem aquele valor na ativa",
disse Mendonça. Mas ele reconhece que a conta das aposentadorias ficará maior.
"O governo pouparia dinheiro (se não houvesse a incorporação). Em nossas
estimativas, até 2019, pouparíamos R$ 700 milhões, nesse grupo de 134 mil",
assinalou.
De acordo com Renato Follador, consultor em previdência e
finanças, é óbvio que a incorporação aumentará as despesas a curto e a médio
prazos - e poderá prolongar seus efeitos por 25 a 30 anos. "O deficit será
tão mais elevado quanto maior for o percentual de incorporação e a quantidade
de pessoas beneficiadas", destacou. Para ele, não poderia haver pior
momento para abrir os cofres, por mais justa que seja a medida.
"Como se pode fazer isso em uma hora em que o Brasil
perdeu o selo de bom pagador e está diante de uma crise sem precedentes? O
governo propõe a reforma das regras do INSS, que vai reduzir benefícios para a
sociedade, e faz o contrário com seus servidores. Isso repercute muito mal
entre a população, e também nos organismos financeiros internacionais e
agências de risco", afirmou Follador.
O advogado Nazário Nicolau Maria Gonçalves, diretor do
Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), disse que a incorporação
elimina uma injustiça. "Muitas vezes, o governo dava aumento na
gratificação, e não no vencimento básico, para burlar a aposentadoria. Fez bem
em corrigir isso. Mas não agora", disse. Para Gonçalves, a medida
interferirá no ajuste fiscal. "O ajuste não pode ser feito em cima de
direitos, mas em gastos desnecessários. O problema do país não são os
servidores. É a má gestão", afirmou.