BSPF - 07/05/2016
O princípio da irredutibilidade do salário se projeta nas
mais variadas direções, todas elas volvidas à proteção do ser humano e o
respeito à sua dignidade. Foi deste modo que o sistema se armou contra as
mudanças salariais prejudiciais ao servidor, a ponto de vedar a redução
salarial. Também se ergueu barreira contra práticas que possam prejudicar o
servidor, proibindo descontos por parte da Administração Pública diretamente no
salário do servidor, tudo com fito a evitar redução direta ou indireta na base
salarial.
Em verdade, é antigo o ensinamento do Supremo Tribunal
Federal de que as verbas remuneratórias, a exemplo dos salários, vencimentos e
proventos, têm natureza alimentar e, portanto, não são passíveis de
restituição.
Isso abre a discussão acerca da (im)possibilidade de
restituição de verbas recebidas de boa-fé pelo servidor público em decorrência
de erro exclusivo da Administração Pública.
Para os servidores federais, dispõe o Art. 46 da Lei
8.112/1990 que “As reposições e indenizações ao erário, atualizadas até 30 de
junho de 1994, serão previamente comunicadas ao servidor ativo, aposentado ou
ao pensionista, para pagamento, no prazo máximo de trinta dias, podendo ser
parceladas, a pedido do interessado.”
Contudo, as referidas restituições apenas podem ser impostas
com a observância concomitante do Art. 45 do mesmo texto legal, vez que, sob a
guarida do princípio da intangibilidade do salário, o legislador optou por
restringir a restituição por meio de desconto em folha apenas quando houver
autorização expressa pelo servidor ou por imposição de decisão judicial.
Vejamos: “Salvo por imposição legal, ou mandado judicial, nenhum desconto
incidirá sobre a remuneração ou provento”.
Sabe-se que os atos administrativos são de legalidade
presumida, isto é, no momento que o servidor recebe determinado valor da
administração pública tal pagamento é visto como legítimo. Em virtude desta
presunção de legalidade e porque a boa-fé também é presumida, mesmo na hipótese
de desfazimento de atos administrativos, os servidores por eles até então
beneficiados não podem ser compelidos a devolver os valores excedentes das
remunerações que receberam, tanto mais que se trata de parcelas alimentares já consumidas.
O requisito estabelecido pela recente jurisprudência sobre o
tema é o seguinte: para que não ocorra a repetição dos valores recebidos
indevidamente por servidor, não é necessário demonstrar o erro da
administração, mas, sim, ao recebimento de boa-fé.
Por conseguinte, o entendimento jurisprudencial dominante
dispõe que para se ter a restituição de valores percebidos a maior, faz-se
necessária a comprovação de que o servidor deu causa, ou concorreu, para a
efetivação dos pagamentos equivocadamente efetuados. Isto é, a jurisprudência
entende que não cabe restituição de verbas percebidas e consumidas por servidor
quando esta não tiver concorrido para que o equivocado pagamento se
materializasse, tendo em vista a necessidade de dolo (má-fé) para que se possa
falar em restituição de verbas de natureza alimentar.
Desse modo, inexistindo imposição legal ou mandado judicial,
entende-se por vedada a possibilidade de a administração pública compelir o
servidor a repor o erário mesmo que em decorrência de Processo Administrativo.
Vale dizer, excepcionalmente, a possibilidade de condenação
de servidor à restituição de valores à Administração Pública está condicionada
a comprovação de dolo (má-fé) daquele para a consolidação do pagamento
indevido, sendo ilegal qualquer tipo de restituição pleiteada fora dessa
hipótese.
Por Marcos Joel dos Santos e Felipe Dias, Cassel Ruzzarin
Santos Rodrigues Advogados
Fonte: Servidor Legal