UOL Notícias
- 23/05/2016
A extinção da Controladoria-Geral da União, cujas
competências são agora do novo Ministério da Transparência, Fiscalização e
Controle, por si só não representa um enfraquecimento ou fortalecimento do
maior órgão fiscalizador do governo, segundo especialistas ouvidos pelo UOL.
Aspectos como a verba destinada à pasta e as diretrizes definidas pelo governo
federal devem ter mais peso na atuação do novo ministério, como já ocorria com
a CGU.
Cortada pelo presidente interino Michel Temer (PMDB), a CGU
teve suas atribuições repassadas à nova pasta, chefiada pelo ministro Fabiano
Silveira, ex-ouvidor-geral do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). A
transformação do órgão em ministério gerou protestos de servidores, preocupados
que o trabalho de fiscalização em outras pastas, que estariam no mesmo patamar
hierárquico, seja dificultado.
O novo ministro divulgou nota afirmando que não haveria
mudança nas atribuições da CGU e defendeu a alteração dizendo que o órgão terá
fortalecidos seus projetos, ações e potencialidades, "numa dinâmica com
poder de transcender o próprio Poder Executivo Federal no que se refere à
condução de políticas anticorrupção".
O orçamento, no entanto, continua a ser o fator
determinante. "O indicador que vai mostrar se a CGU pode ser enfraquecida
é uma possível restrição orçamentária, que ela já sofria no governo Dilma e
poderia estar vinculada à meta do atual governo em reduzir os gastos", diz
Manoel Galdino, diretor executivo da ONG Transparência Brasil.
"Só saberemos se o ministério será mais eficiente ou
eficaz no combate à corrupção e na defesa do patrimônio público quando houver a
destinação dos recursos, para que esse novo ministério possa exercer as funções
da CGU com autonomia e independência, e a atuação do ministro, aliada às
diretrizes do governo", acrescenta Roberto Dias, professor de direito constitucional
da PUC-SP.
Luís Boudens, presidente da Fenapef (Federação Nacional dos
Policiais Federais), classe de profissionais que atua ao lado de servidores da
CGU, também considera a prevenção de cortes o maior desafio do novo ministério.
"Se conseguir evitar isso, o trabalho pode continuar a ser efetuado",
diz Boudens. "Mas é uma análise difícil de se fazer agora."
Galdino e Dias concordam que a mudança, no geral, tem
significado mais simbólico. "De um lado se extingue a CGU, que é um nome
consolidado do combate à corrupção, mas, do lado oposto, efetivá-la como
ministério talvez seja uma maneira de dar proeminência a essa questão ",
afirma Dias.
Vinculação à Presidência
Para Galdino, é difícil haver um retrocesso significativo no
trabalho feito pelo órgão. "A instituição se fortaleceu ao longo do tempo,
com parcerias com outros órgãos de controle, a formação de um corpo técnico
qualificado e o sucesso no combate à corrupção, com afastamento de servidores e
dinheiro recuperado", cita o diretor da Transparência Brasil.
Ele ressalta, no entanto, que um dos artigos que definiam as
atribuições da antiga CGU dizia que a corregedoria do órgão poderia propor ao
controlador "representar ao presidente da República" em caso de
omissão das autoridades responsáveis das outras pastas. Um dos parágrafos que
determinam o trabalho do novo ministério utiliza o termo "representar à
autoridade competente", não citando nominalmente o presidente.
"Na forma que estava organizada, a CGU determinava o
envolvimento do presidente da República, que não podia, de forma nenhuma, se
omitir sob o risco de prevaricar. É preciso ficar atento, mas, se na prática
vai acontecer alguma mudança nesse sentido, não é possível saber", diz
Galdino.
R$ 16,6 bilhões de potencial retorno aos cofres públicos
A CGU foi criada em 2001 no governo Fernando Henrique
Cardoso, ainda com o nome de Corregedoria-Geral da União, mas já dando status
de ministro a seu chefe. O órgão se tornou Controladoria em 2003, no primeiro
ano do governo Lula, e aos poucos aprimorou suas funções. Uma das medidas na
área da transparência foi a publicação de um site de acesso público aos dados
do Siafi, sistema que acompanha os gastos federais, em 2006.
Recentemente, o órgão divulgou que, desde 2002, a Secretaria
Federal de Controle Interno da CGU fez 25.462 auditorias em contas e encontrou
irregularidades em 80% delas (20.702). As auditorias permitem um retorno
potencial aos cofres públicos de R$ 16,6 bilhões de verba utilizada de maneira
irregular. Os problemas mais comuns encontrados foram falhas na aplicação dos
recursos públicos (6.310), omissão na prestação de contas (5.743) e não
cumprimento do objeto conveniado (3.446).
Há pouco mais de um mês, a Controladoria declarou a
construtora Mendes Júnior inidônea, proibindo que a empresa, investigada na
Operação Lava Jato, fechasse contratos com a administração pública por pelo
menos dois anos. Foi a primeira punição aplicada a empresas envolvidas na Lava
Jato.
No entanto, já em 2014 o órgão sofreu com reduções de verba,
quando recebeu o menor orçamento em quatro anos, segundo matéria da "Folha
de S.Paulo". Por causa disso, a Controladoria precisou economizar com
deslocamento dos funcionários, diminuindo suas ações de combate ao desvio de
recursos públicos, em especial no interior do país.